Ensino remoto emergencial e didáctica à distância, entre oportunidades e barreiras

OPINIÃO

Por: Luca Bussotti

Uma das formas que escolas e, sobretudo, universidades em todo o mundo descobriram como metodologia didáctica aceitável em tempo de pandemia é o ensino remoto de carácter emergencial. Tal tipo de ensino tem muito pouco a ver com a didáctica à distância (DAD) que, por seu turno, engloba vários modelos de ensino. Entretanto, não restam dúvidas de que a pandemia da Covid-19 facilitou a modalidade mais simples, acessível e imediata de usar as novas tecnologias para ministrar aulas que já não podiam ser presenciais: arranjar uma boa ligação à Internet, e ouvir o docente a falar em videoconferência, em plataformas tais como Google Meet, Teams, Zoom e muitas outras. Uma maneira razoável para contornar uma situação inesperada e constrangedora, apesar das muitas resistências por parte de docentes, discentes e dos próprios gestores das instituições de ensino.

Entretanto, esta modalidade de ensino tem algumas grandes desvantagens: acima de tudo, ela não foi planificada, mas serviu como remédio emergencial para não parar completamente com as aulas. Isso significou que quer do lado dos docentes, quer dos estudantes não houve um processo de formação adequado para explorar todos os recursos que tais plataformas disponibilizam. Em segundo lugar, muitas vezes a Internet moçambicana tem dificuldades em suportar este tipo de ensino, ainda mais se feito com câmeras abertas; finalmente, este modelo didáctico é online por ser não presencial, mas à distância, entretanto ele simplesmente reproduz o ensino presencial, com a única diferença que o contacto entre docente e discentes ocorre de forma virtual. Mas os princípios didácticos continuam os mesmos que o ensino presencial.

Diferente é a questão se se passa a considerar a DAD. Historicamente, ela é a evolução do estudo por correspondência, que se fazia desde os séculos XVIII-XIX. Ele consistia no envio de livros por parte de uma certa universidade para os alunos que não podiam frequentar as aulas, mas que desejavam ter o título académico. Depois os alunos enviavam seus trabalhos manuscritos para os docentes, que assim os podiam avaliar. O princípio do ensino por correspondência era o mesmo da DAD. Trata-se de metodologias didácticas assíncronas, ou seja, baseadas no contacto indirecto entre docente e discente, com a vantagem de que o aluno pode estudar quando ele quiser, com a única condição de respeitar os prazos de entrega dos trabalhos e das actividades.

Na verdade, hoje, a DAD complexificou-se em relação ao ensino por correspondência. Com efeito, ela utiliza plataformas específicas, tais como a Moodle, em que o docente reproduz, em ambiente virtual, tudo aquilo que deveria ocorrer dentro de uma sala de aulas. Isso significa que não é suficiente ler o material e fazer o trabalho pedido pelo docente, mas sim participar em fóruns de discussão, em grupos de trabalho, chatar directamente com o docente ou com algum colega, e por aí fora. O docente deve usar material e linguagem específicos para preparar suas aulas, cujos conteúdos devem constar todos na plataforma, incluindo material audiovisual, podcast, fotografias e desenhos, etc.

É este tipo de DAD, não emergencial, mas sim planificado e baseado no método participativo e assíncrono que em Moçambique ainda não está a ser devidamente implementado. São poucas as universidades e institutos superiores que abraçaram este tipo de DAD, quer devido à falta de profissionais capazes de montar um curso desta natureza, seja ele de licenciatura, mestrado ou doutoramento, quer por causa dos procedimentos burocráticos que estão a tornar este projecto praticamente inviável. Com efeito, além do crivo do CNAQ para a pré-acreditação do curso que se pretende abrir, no caso da DAD é necessária a intervenção também do INED (Instituto Nacional de Ensino à Distância). É em razão do cruzamento de competências institucionais e de um modelo de avaliação completamente copiado de Portugal que abrir um curso de nível superior feito em DAD pode levar um ano ou mais (e muito dinheiro!), se for necessário corrigir alguma coisa no dossier apresentado. Uma perspectiva pouco atractiva para uma instituição que pretenda virar os seus esforços para a DAD.

A pandemia, porém, não espera: ela corre veloz e nesses dias estamos a assistir a um novo encerramento de muitas actividades, inclusive escolas e universidades. Se, diante dessa situação, o governo continuar não só a não incentivar as instituições de ensino superior a abrir cada vez mais cursos em DAD, mas sim a colocar diante deles mais burocracia, é muito provável que o ensino, com destaque especial para o superior, possa parar a qualquer altura por falta de condições objectivas. A aposta na DAD implica uma mudança cultural e de sistema por parte de todas as instituições moçambicanas que lidam com o ensino: ela nunca poderá substituir o sistema presencial, mas estará em condições de enfrentar devidamente os anos da pandemia que ainda teremos de viver, dando inclusive a possibilidade de estudar aos cidadãos que vivem em zonas recônditas, onde o ensino superior está bem longe de chegar. Vantagens, essas, que devem ser atentamente ponderadas por parte de quem tem a tarefa de tomar as decisões e de avaliar novos cursos concebidos em DAD.

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