- A crise pós-eleitoral trás à tona possibilidades que criaram crispação dentro da Frelimo
- Medo do que lhes espera depois do fim do mandato, obriga Nyusi a uma ultima tentativa
- Ossufo Momade, Renamo e MDM entre os apoiantes de um plano que
Escasseiam as soluções para a crise pós-eleitoral num contexto em que várias correntes da sociedade, entre singulares e organizações, compram a ideia de anulação dos resultados eleitorais de 9 de Outubro passado, como uma das soluções para ultrapassar o impasse político que evoluiu para estagnação social e política. No entanto, dos sectores mais conservadores, é possível apurar que, afinal, a proposta de anulação dos resultados eleitorais abre as velhas feridas que se supunha que estavam ultrapassadas e curadas, ou seja, uma provável anulação dos resultados seria desculpa perfeita para Filipe Nyusi e companhia, darem azo a velha pretensão de manter-se no poder. Do Conselho Constitucional, o Evidências apurou que esta é uma possibilidade não equacionada, mas dentro da Frelimo, já ganha interpretações de que esteja a ser levantada para, a semelhança do que se viu no passado quando foi lançada, de forma tímida, a ideia de terceiro mandato, medir a receptividade do público, numa operação que colocaria o Chefe de Estado e Presidente da Frelimo, com pendências que não se concretizam devido a imunidade que lhe assiste, a perpetuar o poder sob argumento de estar a criar ambiente para novas eleições.
Nesta segunda-feira (03), o candidato presidencial do PODEMOS, anunciou a quarta fase da quarta etapa das manifestações que alastram a crise pós-eleitoral que é própria dos períodos pós-eleitorais em Moçambique, apesar de ter conhecido uma nova configuração no actual contexto.
Enquanto se alastra a crise, alguns sectores da sociedade, entre os quais a Renamo, o Movimento Democrático de Moçambique (MDM), a Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM) e os académicos Domingos do Rosário e Egídeo Guambe, Professores de Ciência Política e Administração Pública e especialistas em questões eleitorais, respectivamente, propuseram a anulação das eleições gerais de 09 de Outubro do ano corrente, como uma das saídas para ultrapassar a crise político-eleitoral vigente.
Sistematicamente, os defensores desta corrente apresentam argumentos como a fraude eleitoral que se reflectiu no enchimento de urnas e falsificação de editais; falta de dados que possam levar a uma decisão que traga justiça eleitoral; manipulação política dos órgãos eleitorais, resultando no desvirtuamento da vontade popular e; experiência prática de 30 anos de gestão de eleições, a nível nacional e continental, que permite duvidar da integridade e transparência das eleições de 09 de Outubro.
Risco de instalação de um regime ditatorial
Se é verdade que as eleições gerais de 09 de Outubro foram problemáticas em toda a sua cadeia e exigem uma deliberação sapiente e incisiva do Conselho Constitucional, capaz de resolver a crise política, é possível apurar que de outras correntes que é também verdade que a anulação de eleições pode conduzir o país a uma crise política maior e sem precedentes no sistema de governação, com riscos de instalação de um regime ditatorial. Alias, os últimos dez anos ilustram essa tendência do fechamento dos órgãos do Estado e, a nível do governo, aproximação do Executivo a regimes ditatoriais.
A questão de fundo é: quem exerce as funções de Presidente da República no intervalo entre a anulação das eleições e a tomada de posse do novo incumbente? Tem havido discussões no campo jurídico, apontando-se para a transferência de poderes para o Presidente da Assembleia da República, mas, perante as dúvidas legais, associadas ao facto do Presidente da República não reconhecer as graves falhas no processo eleitoral e poder tirar largas vantagens da extensão do seu mandato, é remonta a hipótese da saída pelos próprios pés.
Lembre-se que o Presidente da República dirigiu uma reunião virtual, no dia 28 de Outubro passado, com embaixadores moçambicanos na diáspora, onde leu os resultados das eleições, disse não entender as razões da contestação e apelou a que se espere pelo anúncio da deliberação do Conselho Constitucional.
Questões legais à parte, não faltam exemplos em África de subversão ou tentativa de subversão da ordem legal, para permanência no poder, desde a Guiné-Bissau ao Senegal.
Há ainda a recordar que, entre 2022 e 2023, houve ensaios de um terceiro mandato presidencial, ventilados por indivíduos próximos ao Presidente da República e que custaram a ostracização de Castigo Langa, membro do Comité Central da Frelimo e antigo ministro dos Recursos Minerais e Energia, após apresentar uma carta de protesto ao movimento.
Medo de processos contra si e sua família
São excessivamente conhecidas as razões que criam o apetite para o prolongamento na gestão do Estado. As principais são os processos judiciais (em curso e potenciais) contra o actual Presidente da República e sua família, perseguição política no seio da Frelimo e a impopularidade e hostilização. Na cultura da Frelimo, Filipe Nyusi cometeu um pecado mortal pela forma como geriu as dívidas ocultas e isolou quadros, estando os grupos afectados à espreita, atrás da porta, à espera de vingança.
O académico Severino Ngoenha alertou publicamente, em 2023, que se não fossem criadas garantias constitucionais, uma espécie de saída limpa e segura para Filipe Nyusi, ele tenderia a procurar formas de se perpetuar no poder.
A anulação das eleições pode, assim, implicar o alargamento do mandato do Presidente da República em exercício, significando que a tomada de posse do Presidente Eleito deixa de ser a 15 de Janeiro, assim como também fica sem data a investidura dos deputados da Assembleia da República, governadores provinciais e os membros das Assembleias Provinciais.
Eventualmente, interessa a Renamo e o MDM a anulação das eleições, pois a estrutura de poder na Assembleia da República e noutros órgãos manter-se-ia como está hoje, em vantagem em relação aos resultados das eleições de 09 de Outubro.
Porém, os riscos de inocentemente esses sectores, incluindo a pressão exercida por Venâncio Mondlane, estarem a favorecer uma agenda esquecida, depois do fracasso do terceiro mandato, é factor a não ser menosprezado.
Venâncio Mondlane diz “NÃO” ao plano do terceiro mandato
Refira-se que ciente destes movimentos visando viabilizar o terceiro mandato, Venâncio Mondlane denunciou, esta segunda-feira, movimentação de um grupo que está a distribuir dinheiro no distrito de Erati, em Nampula, supostamente com o intuito de semear o terrorismo naquele ponto do país.
Mondlane associou essas movimentações a estratégia de um certo grupo, próximo de Filipe Nyusi, tendo em vista a declaração de um estado de emergência. Aliás, Mondlane referiu que nem isso, nem a pretenção de anulação das eleições, que viabilizariam a continuidade de Filipe Nyusi no poder, não será aceite pelos manifestantes.
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