- Missão de observação defende a revisão do sistema de gestão dos resultados
“Depois do burro morto”, ao cabo de mais de três meses a assistir à crise em Moçambique sem emitir o seu parecer, a Missão de Observação Eleitoral da União Europeia (MOE EU) decidiu abrir a caixa de pandora e revelar aquelas que foram as suas principais constatações no processo eleitoral de Outubro passado. Sem grandes surpresas, malgrado apenas o facto de esta opinião independente chegar quando já não é possível fazer nada. Diz aquela missão de observação que as eleições foram marcadas por várias irregularidades e discrepâncias que afectaram a integridade do processo e, sobretudo, dos resultados eleitorais. Por outro lado, para além de referir que os órgãos de administração eleitoral não implementaram as recomendações feitas nos processos eleitorais anteriores, sugeriu a necessidade de profissionalização destes.
Duarte Sitoe
As Eleições Gerais, Legislativas e das Assembleias Provinciais não conseguiram contornar o histórico de violência que tem marcado quase todos os pleitos eleitorais em Moçambique.
Representada no país desde o período eleitoral, passando pela eleição e apuramento dos resultados, a Missão de Observação da União Europeia começa por descrever que de forma geral, o dia das eleições decorreu de forma pacífica, mas a contagem e o apuramento dos resultados foram marcados por anomalias e erros graves, uma extrema falta de transparência que afectou negativamente a confiança pública nos resultados do processo.
“Muitas destas deficiências já tinham sido identificadas pelas MOE da UE que participaram nas eleições anteriores, mas não tinham sido corrigidas. Embora os resultados provisórios inicialmente anunciados pela Comissão Nacional de Eleições tenham sido significativamente alterados pelo Conselho Constitucional, os resultados finais deram uma vitória esmagadora ao partido no poder, a FRELIMO, nas eleições presidenciais, legislativas e provinciais. Contudo, estes resultados foram amplamente contestados pelos principais partidos da oposição e, especialmente, pelo candidato Venâncio Mondlane”, refere o relatório
O documento conclui que o partido no poder foi, mais uma vez, favorecido, referindo que na campanha eleitoral foram usados meios estatais
“A disputa foi pluralista e geralmente calma durante a campanha eleitoral, com um número limitado de incidentes relacionados com as eleições. Os observadores e interlocutores da UE referiram uma evidente inclinação das condições de concorrência a favor do partido no poder e uma delimitação pouco nítida entre o partido e os recursos estatais. A FRELIMO beneficiou-se das vantagens da incumbência através da utilização indevida dos recursos estatais e foi capaz de fazer uma forte campanha em todas as províncias. As forças de segurança não ultrapassaram as suas funções e não foi registado nenhum caso grave de linguagem inflamatória”.
O relatório da Missão de Observação Eleitoral da União Europeia inclui, por outro lado, 18 recomendações destinadas a reforçar e melhorar os futuros processos eleitorais, em conformidade com os compromissos internacionais de Moçambique em matéria de eleições democráticas.
União Europeia defende a revisão do sistema de gestão dos resultados eleitorais
No rol das 18 recomendações que constam do documento tornado público pela União Europeia, destacam-se oito que são consideradas prioridades. As primeiras duas incidem sobre a composição dos órgãos de administração eleitoral e o sistema de gestão dos resultados.
“Rever a estrutura, a composição e o processo de selecção da administração eleitoral a todos os níveis com vista a reforçar o profissionalismo, a integridade, a responsabilização e a imparcialidade em todas as fases do processo eleitoral. Rever o sistema de gestão de resultados eleitorais de modo a assegurar um processo eficiente, uniforme, consistente e transparente, e a incluir: um sistema rápido para anunciar os resultados provisórios de forma progressiva, discriminados por mesa de voto; e também procedimentos inequívocos para rectificar erros e discrepâncias nos editais, com critérios claros para a recontagem dos votos”.
Para a União Europeia a CNE deve assumir responsabilidade plena pela integridade do processo eleitoral, adoptando medidas para fazer face às consequências de infracções eleitorais e de más práticas durante a votação, contagem e apuramento dos resultados, com o intuito de diminuir o seu impacto nos resultados eleitorais.
“As autoridades do Estado devem proteger as liberdades fundamentais, nomeadamente o direito à liberdade de reunião, de acesso à informação e de realização de manifestações pacíficas, bem como de actividades de campanha num ambiente seguro, livre de intimidações e de actos violentos contra membros de partidos, apoiantes e jornalistas”, recomenda.
Relativamente às recomendações, a chefe da Missão da União Europeia, Laura Ballarín, deixa uma garantia: “Numa altura em que existe um consenso generalizado sobre a necessidade de reformas eleitorais, as recomendações da MOE UE podem contribuir para o diálogo político em curso entre o governo, os partidos políticos e a sociedade civil”, tendo ainda concluído que “a União Europeia mantém-se empenhada em acompanhar Moçambique nesta via, em conformidade com a cooperação existente”.

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