“Deixem o camarada Chapo trabalhar… conheço pessoas que gostam de amarrar os outros … tenho a lista”

DESTAQUE POLÍTICA
  • Nyusi vende inimigos a Daniel Chapo
  • Camaradas queriam forçar a realização de um Congresso extraordinário, mas não tiveram força
  • Há quem perguntou a Nyusi sobre o contrato com o Ruanda e não houve resposta

 A IV sessão ordinária do Comité Central da Frelimo, cujo pano caiu na noite do último sábado, foi marcada por calorosos debates durante os três dias de reuniões a portas fechadas. Combate à corrupção, futuro do partido, entre outros aspectos marcaram as discussões, que, como sempre, nalgum momento roçaram a alguma animosidade, sobretudo quando Filipe Nyusi interveio e vendeu, literalmente, uma lista de inimigos para Daniel Chapo. Trata-se de pessoas que, segundo ele, gostam de cooptar o Presidente da República, tendo inclusive se prontificado a entregar os nomes, o que, por alguns instantes, gelou a sala. Mas ele próprio foi encostado à parede por alguns camaradas que o exigiram que explicasse os contornos do seu acordo secreto com Paul Kagamé para a vinda das tropas ruandesas em Cabo Delgado. De resto, é uma sessão que frustrou as expectativas de uma parte significativa dos camaradas que entraram na reunião tendo como ponto de agenda a eleição de um novo secretariado e saíram apenas com imposição de criação de mais duas novas áreas e preenchimento de duas vacaturas. Em relação à Comissão Política, nada foi dito, apesar de este órgão estar a funcionar incompleto após as mortes, no ano passado de Manuel Tomé e Fernando Faustino. Uma das facções até tentou levantar debate sobre uma possível realização de um Congresso extraordinário antes de 2027, mas a ideia não teve réplica suficiente.

 Evidências

 A sessão da última semana era esperada com muita expectativa, depois de em Fevereiro o partido ter decidido adiar aquele que era o seu terceiro ponto de agenda, neste caso a eleição de um novo secretariado do Comité Central e muitos camaradas se prontificaram preencher as vacaturas. Como de costume, já havia até nomes e as sempre presentes teorias de conspiração entre alas.

 Sucede que, contrariando esta corrente, a liderança, sob orientação da Comissão Política, decidiu manter todo secretariado, à excepção de dois secretários que foram nomeados para cargos públicos, um como secretário de Estado, e outro como diplomata na China.

No lugar de eleger um novo secretariado, apesar de fortes contestações apresentadas, sobretudo contra a secretária para a área das Finanças, Sónia Mucavele por falta de prestação de contas e auditoria, foram eleitos quatro novos membros, sendo dois para preencherem as vacaturas deixadas pela nomeação acima referida, e outros dois para igual número de áreas recém-criadas, nomeadamente, a de Projectos e Económica.

Trata-se de Nelson Muianga, empresário ligado a Celso Correia (que sai reforçado), com passagens como gestor da CETA e outras empresas do antigo superministro, que se supõe que  vai ser secretário para a recém-criada “área económica”; Pedro Guiliche, académico; Celmira da Silva, antiga ministra e governadora; e Gonçalves Gemusse, actual primeiro secretário de Tete, que só não está na cadeia devido à intervenção da Frelimo, para abafar um escândalo de corrupção em que esteve envolvido.

Mas antes, durante o calor intenso de debates, os camaradas tiveram espaço para se expressarem sobre a vida política do País, do partido e também para as incorrigíveis intrigas entre as diversas alas, com algumas das intervenções a roçarem a esfera da fofoca.

O momento mais intrigante foi quando Filipe Nyusi, depois de levantar vários aspectos sobre a vida do País e do partido, desabafou apontando para a existência de camaradas que “gostam de amarrar os outros”.

“Deixem o camarada Presidente Chapo trabalhar”, disse Nyusi, para depois se prontificar a facultar ao presidente do partido a lista de nomes desses supostos camaradas que gostam de amrarar os Presidentes. Seguiram-se depois murmúrios na sala.

Mas Filipe Nyusi não saiu imaculado da sala, pois camaradas quiseram saber dele os contornos do nebuloso e secreto contrato que estabeleceu com Paul Kagamé, para a vinda das tropas ruandesas por tempo indeterminado, num negócio que pode culminar com aquele país a exigir um “Acordo de terras raras”, como aconteceu com a Ucrânia.

Camaradas queriam um Congresso extraordinário

À entrada do Comité Central da última semana, os membros daquele que é o órgão mais importante no espaço entre os Congressos, esmeraram-se em intermináveis reuniões em quintas e mansões da capital e da Matola, para desenharem uma estratégia de enfrentamento com a toda poderosa Comissão Política.

Depois de falhada a estratégia de impor a renovação da Comissão Política por via da inclusão do tema na agenda dos trabalhos do Comité Central, uma empreitada tentada a 14 de Fevereiro, quando reuniram extraordinariamente, os membros tentaram fazer vincar a ideia da necessidade da convocação de um Congresso extraordinário.

A proposta que até foi apresentada por muitas vozes, mas não reuniu apoio suficientes, era do órgão mais importante do partido reunir antes de 2027, ano em que ordinariamente o órgão deve reunir.

Para sustentarem a sua ideia, os camaradas levantaram a necessidade de reorganização do partido, com particular destaque para o desmantelamento da actual Comissão Política e alguns membros do secretariado considerados problemáticos como é o caso do das Finanças que foi o mais criticado pela forma como é feita a gestão dos dinheiros do partido e das empresas participadas, através da SPI.

Membros não vêem mudanças

No seu discurso de abertura e de encerramento, Daniel Chapo foi bastante incisivo apontando a luta contra práticas como a corrupção e outros males como um dos seus principais objectivos, numa sessão em que convidou os camaradas para uma reflexão profunda em torno das causas das manifestações, de forma franca e desprovida de paixões.

“As manifestações violentas ilegais e criminosas levados a cabo por um certo candidato derrotado e claramente bem identificado devem ser matéria de análise de forma franca e desapaixonada sobre as verdadeiras causas”, disse.

Reconhecendo a existência de prováveis falhas no seio da Frelimo, Daniel Chapo acrescentou, por outro lado, que para o sucesso neste processo de análise que vai ser desencadeado para a estabilidade nacional é fundamental reconhecer que para além dos factores externos vai-se fazer uma introspecção dentro do partido para identificar eventuais desvios e falhas, num discurso que aumentou ainda mais as expectativas dos membros.

Com a alusão sobre prováveis falhas, os camaradas esperavam que fosse desencadeada uma varredura, sobretudo aos sectores perversos entrincheirados nos órgãos sociais, todavia saíram desiludidos e dizem não verem sinais de mudança. Antes pelo contrário, temem que o Presidente do partido esteja capturado, a ponto de não mexer nem sequer uma vírgula em relação ao consulado anterior.

“Ele entrou com muita força de mudanças, mas mudanças mesmo na verdade não existem. Vai manter a mesma Comissão Política, o mesmo secretariado, entre outros órgãos. Foi contra todas as expectativas. Nós tínhamos a certeza que ia se mudar no mínimo o secretariado. Ele também já foi capturado”, desabafou ao Evidências um membro do Comité Central.

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