Outra vez a reestruturação da LAM!

OPINIÃO
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Alexandre Chiure

Ouvi, esta semana, pela terceira vez, de um governo, que as Linhas Aéreas de Moçambique seriam objecto de reestruturação. A primeira foi em 2016, promessa replicada nos anos seguintes. A segunda, em 2022. Agora é o presidente Daniel Chapo a entrar na jogada, prometendo as mesmas coisas que os outros.

O que os anteriores governos fizeram foram exonerações e nomeações, umas atrás das outras, de quadros para dirigirem a LAM. O resto continuou na mesma. Nessas movimentações, desfilaram directores gerais, administradores-delegados e presidentes dos conselhos de administração. Infelizmente, a crise, essa, ficou intacta.

Entre 2016 e 2022, a transportadora aérea registou prejuízos enormes, segundo relatórios e contas da empresa. Funcionários de ministérios, instituições públicas e privadas, partido Frelimo, AR, Defesa, ONG e outros viajavam de borla. Requisitavam bilhetes a crédito e a dívida situou-se em 1.700 milhões de meticais.

Em 2019, o prejuízo, nos relatórios e contas, foi de 3.6 mil milhões de meticais, depois de, em 2018, ter sido de 2.8 mil milhões de meticais.

Em Maio de 2017, o então ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, disse, aos deputados da AR, que os cancelamentos sistemáticos de voos que se verificavam e que resultavam da redução da frota de aviões de sete para três tinham dias contados, o que seria fruto de uma parceria com uma companhia aérea estrangeira que o governo não chegou a torná-la público.

Em Julho de 2018, o executivo anunciou que ia acelerar a busca de um parceiro estratégico para viabilizar a actividade da LAM. Batemos palmas. Não era caso para menos. Estava aberto um espaço para sonhar e sonhamos acordados. Visualizámos o fim da crise. Passado algum tempo, o assunto morreu vítima do silêncio.

Ainda em Julho, a LAM foi afectada por uma crise de combustível e, em consequência disso, 300 passageiros não puderam viajar num dia. Era o problema do acerto de contas entre a transportadora aérea e as gasolineiras. O caso das dívidas.

Reagindo a esta situação, o governo do dia veio com uma nova tese, a de reestruturação da LAM, num processo que iria abranger, também, empresas públicas. Nasceram novas esperanças entre os moçambicanos. A crença de que a crise financeira estava perto do fim, o que não passou de uma utopia.

Extinguiu-se o Conselho de Administração na LAM e, no seu lugar, criou-se uma Direcção Geral. É a reestruturação prometida. Em Janeiro de 2020, o governo, através do IGEPE – Instituto de Gestão das Participações do Estado – apareceu com um novo discurso, o de contratação de uma consultoria para a reestruturação financeira da companhia de bandeira.

Esta semana, voltámos a ouvir a palavra reestruturação, desta vez a sair da boca de Daniel Chapo. O que é que vai acontecer desta vez? Que reestruturação é essa que o governo pretende fazer na LAM? Dá a entender que o PR vai correr com o que chamou de pessoas com conflitos de interesse.

Aqueles que, segundo o presidente, não estão interessados em que a empresa tenha aviões próprios porque tiram vantagens do aluguer de aeronaves ao ganharem comissões. Os tais a quem o PR apelidou de corruptos, nhonguistas e burladores. Se é isso que Chapo quer fazer, é muito pouco. Com uma decisão dessas de demitir uns e nomear outros, duvido que se consiga alcançar os resultados desejados que são de ter uma LAM livre de quaisquer interferências. Uma LAM saudável.

Os problemas da LAM são mais do que simples exonerações ou nomeações. Isso já foi feito, por diversas vezes, pelos anteriores governos e as medidas não resultaram em nada. Por melhor que sejam os PCAs ou directores-gerais nomeados; por mais competentes que sejam, nada podem fazer. Não há mudanças que possam ser operadas dentro daquela empresa aeronáutica, se as mesmas não beneficiarem a rede criminosa que comanda a companhia por dentro e por fora.

Se o governo do dia quer reestruturar a LAM, tem que ir mais a fundo da questão. Na verdade, os problemas da transportadora aérea são estruturantes e, por isso, requerem medidas estruturantes. Mais do que exonerações e nomeações de novos dirigentes da companhia, punir um e outro funcionário, urge desmantelar redes criminosas que actuam dentro e fora da LAM e que capturaram por completo a empresa, fazendo e desfazendo a seu bel-prazer.

Não faz sentido, por exemplo, que após várias denúncias feitas no ano passado pela empresa sul-africana Fly Modern Arc, contratada pelo governo de Filipe Nyusi para tirar a LAM do fundo do poço, não haja, até agora, nenhum processo-crime, pelo menos de domínio público, contra os implicados nos desmandos.

Há o caso de cerca de 80 POS recolhidos em 20 postos de venda de bilhetes electrónicos, cujos donos são desconhecidos. Quando os clientes da transportadora aérea compravam os bilhetes usando estes equipamentos, o dinheiro ia para contas de particulares. Com essas operações foram desviados 190 milhões de meticais. Até hoje ninguém está preso. Estamos perante uma impunidade.

O mesmo acontece em relação a casas compradas ilegalmente com o uso de fundos das Linhas Aéreas de Moçambique e o caso de uma conta bancária descoberta em Malawi com um saldo de 1,2 milhões de dólares. Ninguém está preso e é como se nada tivesse acontecido.

Na LAM há muitos interesses em jogo. Por um lado, há agências de viagens que mandam na empresa e, por outro, grupos que se aproveitam da desordem prevalecente para tirar vantagens. Há esquemas e esquemas montados que enriquecem alguns indivíduos em detrimento da transportadora. Reestruturar é, também, dotar a empresa de ferramentas ou mecanismos que permitam melhor gestão.

Antes de qualquer coisa, o governo tem que responsabilizar os 12 funcionários da companhia que se deslocaram a Europa por 15 dias alegadamente para inspeccionar aviões colocados à mostra para a compra pelos novos accionistas da LAM por parte de Lion Aviation (LA), baseada nos Países Baixos.

O ponto é que eles foram avisados com antecedência pela LA de que o momento não era apropriado para o efeito. Ainda assim, a delegação insistiu em fazer viagem, que se transformou em passeio porque não havia nenhum avião disponível para a visualização.

Por isso, eles devem ser obrigados a devolver o dinheiro que gastaram nessa deslocação inútil. O executivo não deve compactuar com brincadeiras deste género. Está mais do que claro que indivíduos destes não estão, nem tão pouco, interessados em ver a LAM a sair do buraco. Fizeram a cama dos PCAs, administradores-delegados e directores-gerais que passaram por aquela casa.

Esses fulanos fizeram de tudo para sabotar o trabalho de Fly Modern Arc, uma companhia sul-africana contratada pelo governo de Nyusi para tirar a LAM do fundo do poço e estão, agora, a tentar sabotar a compra de aeronaves para a transportadora de bandeira. Aliás, a  Lion Aviation diz, mesmo a propósito, que o processo está a ser alvo de sabotagem interna na LAM. Antes de serem intimados a devolver o dinheiro que gastaram na Europa com passagens aéreas e ajudas de custos, deviam ir directamente para a cadeia para aprenderem que não se deve brincar com coisas sérias.

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