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Alexandre Chiure
As nossas estradas, de simples vias de comunicação entre as comunidades, transformaram-se, nestes dias, em corredores da morte. É assustador a forma frequente com que os acidentes de viação ocorrem no país, saldando-se em mortes, feridos graves e ligeiros e avultados danos materiais.
Hoje em dia, para alguém viajar usando o transporte público ou, mesmo, a conduzir o seu próprio carro é preciso pensar mil vezes se vale a pena ou não pegar a estrada. Se é urgente ou não fazer a viagem ou pode evitá-la e poupar a sua vida.
É que a decisão de avançar pode significar uma espécie de assinatura da sua própria certidão de óbito porque pode ser uma viagem sem volta, deixando para trás sonhos, projectos e, acima de tudo, amigos, vizinhos, colegas de serviço ou da faculdade e, sobretudo, a família.
Antes de sair de casa e meter-se na estrada, talvez o melhor seja despedir-se dos filhos e da mulher ou marido como se fosse o seu último dia de vida no mundo porque não há certeza de que irá chegar ao destino.
Catorze pessoas partiram para a eternidade sem dizer adeus no caso mais recente de acidente de viação ocorrido em Nicoadala, na província da Zambézia, envolvendo uma viatura de transporte de passageiros e um camião.
Esta tragédia acontece a menos de uma semana de uma outra registada no distrito de Moamba, província de Maputo, em que morreram nove cidadãos e outros oito, feridos, dos quais sete em estado grave. Sinistro que envolveu três veículos pesados, um dos quais de passageiros.
Afinal, o que é que se passa nas nossas estradas? O que é que estará por detrás dos acidentes de viação? Será que o problema é com a Polícia de Trânsito e o Instituto Nacional dos Transportes Terrestres que não fazem, devidamente, as suas actividades de fiscalização rodoviária ou porque temos maus condutores?
Por mim, há um misto entre a fiscalização rodoviária vs a corrupção e o comportamento dos automobilistas em si, na via pública. Quando a polícia, na Manhiça, permite que uma viatura de transporte de passageiros circule antes das 5:00 horas, violando o decreto ministerial que proíbe tal facto e logo a seguir esse carro se envolve em acidente, vitimando 23 pessoas e tantos outros feridos, o problema é a polícia, a fiscalização rodoviária, em conivência com o condutor.
A decisão que o ministro do Interior, Paulo Chachine, tomou foi de tirar toda a força que estava de serviço a noite, até à madrugada, naquela via (EN1) enquanto se faz investigação. Soubemos, depois, que os agentes foram suspensos das suas actividades.
O castigo aplicado contra os referidos agentes da Polícia de Trânsito é pouco. Devia ter sido uma pena pesada: a prisão e a condução destes ao tribunal para o julgamento e responsabilização. Trata-se da perda de 23 vidas humanas e de avultados danos materiais.
Quando são pessoas como eles, a quem cabe a obrigação moral e legal de impor ordem e disciplina na estrada, as responsabilidades são acrescidas. Exige-se deles uma atitude exemplar perante o público.
Seria interessante que eles dissessem ao tribunal porque é que liberaram o autocarro de passageiros antes da hora prevista na lei e a troco de que terão tomado essa decisão, sabendo que é violação da lei.
O acidente de viação de Moamba, há uma semana, que matou nove indivíduos, ocorreu por volta das 4:45. Significa que o autocarro, uma das três viaturas envolvidas no sinistro, fez-se à estrada antes da hora autorizada.
O mesmo aconteceu na Manhiça, onde 23 pessoas perderam a vida. A viatura de transporte de passageiros estava em circulação já às 3:00 horas de madrugada. É, no mínimo, inadmissível que sejam as próprias autoridades a pontapearem as leis.
Não consigo entender como é que situações desta natureza acontecem quando temos tanta polícia de trânsito na estrada e postos de fiscalização rodoviária que nunca mais acabam.
Só há uma explicação possível: a corrupção. A ganância pelo dinheiro e vida fácil. O hábito de extorquir o cidadão. A cumplicidade polícia-automobilista. A irresponsabilidade do agente. O razoável é que o condutor da viatura tenha soltado algum dinheiro para poder prosseguir com a viagem e pronto. Infelizmente, desta vez as coisas correram mal. Nos dois casos, houve, a seguir, acidentes de viação mortais.
Não cabe na cabeça de ninguém que a polícia não tenha conhecimento do decreto ministerial que vem desde os tempos de Tomaz Salomão, quando era ministro dos Transportes e Comunicações, o qual proíbe a circulação de veículos de passageiros no intervalo das 21:00 às 05:00 horas da manhã, justamente por causa dos acidentes rodoviários.
O outro lado da moeda é o comportamento dos automobilistas que deixa muito a desejar. Sabem que, nas localidades, a velocidade máxima é de 60 quilómetros por hora, mas, infelizmente, excedem. Estão conscientes de que uma ultrapassagem irregular é uma ameaça à segurança rodoviária, mas o fazem com muito gosto.
Parte significativa dos acidentes de viação tem como origem o erro humano. Se não é excesso de velocidade, a causa é ultrapassagem irregular. Curiosamente, os mesmos automobilistas têm um comportamento exemplar quando conduzem na África do Sul.
A explicação é simples. É que, do lado de cá, reina a impunidade e a corrupção em que alguns agentes da polícia estão mais preocupados em encher os seus bolsos do que propriamente punir os prevaricadores na estrada.
Do outro lado da fronteira, as coisas são outras. Há maior rigor na fiscalização. Em Moçambique, a polícia pede carta de condução, livrete e seguro. Na África do Sul, além destes documentos, verificam as luzes (máximo, médio e mínimo), se tem triângulo ou não, extintor, etc. Cá entre nós, uma viatura com fraca iluminação circula à noite num à vontade. Basta ter dinheiro para dar ao agente. Na RAS, não é possível. Para dizer que grande parte dos acidentes é por uma questão de atitude e de responsabilidade por parte do agente da PT e do condutor.

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