LAM pretende comprar dois Embraer 190 mais usados (17 anos de uso) que os vendidos em peças em Nairobi

DESTAQUE POLÍTICA
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  • Governo anuncia compra de dois aviões no quadro do plano até final do ano
  • As duas aeronaves foram compradas na Holanda (Reino dos Países Baixos) e trata-se do mesmo modelo e mais usados que os E190 vendidos em peças por falta de comprador no Quénia

O Governo anunciou a sua visão na intervenção em curso nas Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), centrada na redução da força de trabalho e na aquisição de aeronaves a fim de tornar a companhia de bandeira sustentável, num contexto em que, apesar de reivindicar resultados positivos, como consequência de boa gestão, mantêm-se as queixas, principalmente com fornecedores. No entanto, o plano de renovação da frota, que inicialmente previa a compra de cinco e depois quatro aviões, foi reduzido para a aquisição de apenas dois Embraer 190, pelo menos para este ano. O Evidências apurou que se trata de aeronaves com mais de 17 anos de uso, a serem adquiridas na Holanda. Curiosamente, são da mesma marca e mais usados que a de dois aviões que a própria LAM, em Julho de 2019, colocou à venda para “padronização da frota”. Na altura, as aeronaves, armazenadas num hangar em Nairobi, Quénia, não atraíram compradores, e a companhia viu-se forçada a vendê-las como peças de reposição cinco anos depois, por menos de dois milhões de dólares cada. À margem deste processo de aquisição, e em contraste com a promessa de uma reestruturação que respeitaria os trabalhadores, o Jornal apurou que as audiências disciplinares na LAM foram marcadas por irregularidades. No quadro dos despedimentos, as audiências que se iniciaram semana passada decorreram com as advogadas do escritório Sal e Caldeira a actuarem sem o despacho judicial necessário, um facto que gerou forte controvérsias nos círculos jurídicos.

Evidências

O Governo esteve no Parlamento na semana passada para apresentar o seu retrato sobre a situação da LAM. No entanto, era uma visão que ignorava os desafios do presente, ou seja, o retrato actual da empresa, mas que revelou a ambição de, consciente dos desafios, no quadro da reestruturação, transformar a LAM numa companhia robusta e valorizada.

No capítulo das aeronaves, num plano que previa a aquisição de cinco aviões até ao fim do ano, o Evidências sabe que a LAM, através dos seus accionistas, que assumem agora o conselho de gestão, pagou dois milhões de dólares a título de garantia de compra para quatro aviões. No entanto, até ao final deste ano, segundo a ministra, vão ser adquiridas apenas duas aeronaves. O Jornal sabe que se trata de dois Embraer 190, a serem adquiridos na Holanda, não directamente do fabricante.

Trata-se de uma compra que não foi inspeccionada no terreno por nenhum técnico moçambicano, porque os engenheiros nacionais não têm qualificação para aquele tipo de avião, mas sim para Boeing e Q400. O que sugere que os aviões, que já têm 17 anos de uso, não terão qualquer acompanhamento de manutenção regular a ser feito por técnicos nacionais, porque estes não têm licença para o efeito. Uma formação para tal poderá levar até dois meses, o que deveria ter acontecido antes da aquisição.

Recorde-se que, no passado, a direcção da LAM tentou vender as aeronaves desta marca e com a mesma idade como peças, mas o cliente apenas viria a aparecer cinco anos depois, ou seja, em 2024. O facto, porém, é que enquanto o comprador não chegava, a LAM ia acumulando prejuízos com o hangar, cerca de 40 mil dólares por mês.

Aquela venda das aeronaves era fundamentada pela empresa com a necessidade de uniformização da frota. Com o mesmo objectivo, a companhia vendeu, em Dezembro de 2018, um Boeing 737-500 Classic à companhia afegã Ariana por 2,5 milhões de USD.

O “NewsAvia” lembra que os aviões “Embraer E190” chegaram novos à LAM em 2009. Os que estão no Quénia à espera de destino têm as matrículas C9-EMA (msn301) e C9-EMB (msn309). Tiveram 10 anos de serviço.

Advogados da LAM tentaram actuar sem despacho para diligências

Na semana passada, iniciaram-se audições na LAM, a pedido dos arguidos do processo disciplinar no âmbito da restruturação em curso que prevê a redução da força de trabalho dos mais de 800 trabalhadores de empresa, mas alguns acabaram sendo afastados ao serem surpreendidos em esquemas não abonatórios.

O curioso é que as pessoas foram notificadas no sábado (dia não útil) para comparecerem a diligências na terça-feira. Para piorar, o instrutor do processo estava acompanhado de duas advogadas da Sal e Caldeira que estavam a agir sem despacho para o efeito. Só conseguiram resolver o assunto já a tarde, depois de mais de três horas de espera, quando Hilário Tembe, accountable manager da empresa, saiu de urgência na Ponta de Ouro para se deslocar à LAM a fim de regularizar a situação da Sal e Caldeira, que actuava sem despacho.

São mexidas que se insere na restruturação que, segundo a primeira-ministra, Benvinda Levi, que falava no parlamento, são extensivos ao saneamento da dívida com a banca comercial e com fornecedores, ao reforço dos processos de controlo interno operacionais, administrativos e financeiros, bem como o redimensionamento da força de trabalho para o seu ajustamento à realidade operacional e tecnológica da LAM.

“Com a implementação destas e outras acções, pretendemos garantir a estabilidade financeira e operacional da nossa companhia aérea de bandeira, elevar a qualidade e regularidade dos serviços prestados ao público, aumentar a cobertura dos serviços de transporte aéreo nos segmentos de passageiros, carga e correio nos mercados doméstico e regional, assim como assegurar a sua maior contribuição na dinamização da indústria de turismo”, disse.

Relativamente à força de trabalho, o ministro Matlombe explicou que a avaliação feita identificou um excesso de colaboradores. A LAM tinha cerca de 800 trabalhadores que, a dado momento, tinham de ser pagos com receitas produzidas por dois aviões, antes da entrada do novo Conselho de Administração (CA) em Maio do presente ano.

Matlombe disse que 80 posições já se encontram em processo de desvinculação, sendo que o remanescente seria ajustado de forma faseada, mediante a implementação de medidas como encerramento de lojas desnecessárias e terceirização de serviços de atendimento.

No Parlamento, respondendo a uma questão colocada pela bancada da Renamo, no âmbito da sessão de informações do governo realizada na quinta e sexta-feira, o Ministro dos Transportes e Logística, João Matlombe, disse que o Governo está a reverter de forma gradual esta situação, com a introdução de um novo modelo de aluguer de aviões designado dry lease, com o qual a tripulação passará a ser nacional, prometendo, desse modo, o uso pleno do português nas aeronaves. O discurso do ministro Matlombe não passa de uma mera intenção, por isso, é interpretado como discurso de ocasião, porque até ao momento continua a vigorar o ACMI.

O Ministro dos Transportes e Logística deu a conhecer que os custos de aluguer, manutenção e aquisição de combustível para garantir as operações das aeronaves absorveram, em média, 84% das receitas, e o endividamento total da empresa supera 13 mil milhões de meticais, comprometendo a liquidez da empresa. Avançou que, nos últimos dez anos, a empresa tem enfrentado dificuldades económicas e financeiras persistentes, derivadas de vários factores, tendo destacado os seguintes: “Elevado endividamento com a banca e fornecedores. Custos operacionais muito altos, nomeadamente com leasing, manutenção e combustíveis. Estrutura de pessoal desajustada face ao volume real de operações”, esclareceu. Acrescentou Matlombe que, entre 2020 e 2023, a LAM conseguiu reduzir os resultados operacionais negativos de 4,6 mil milhões de meticais em 2020 para 2,6 mil milhões em 2023.

Recordou que foi no sentido de reverter a situação calamitosa da empresa que o Executivo decidiu intervir na reestruturação da LAM, alienando 91% das ações do Estado a três empresas públicas, CFM, HCB e EMOSE, no valor de USD 130 milhões, destinados à recapitalização da empresa, reestruturação das operações e aquisição de aeronaves. Os accionistas incluem INSS, cuja participação não está clara.

Actualmente, a LAM está a funcionar com um Q400 com matrícula AUV, que é o único avião próprio e que tem enfrentado problemas contínuos de avaria. Quanto ao resto, são aviões alugados no modelo ACMI, nomeadamente, dois CRJ 900 e um Q400 da Cemair, um Boeing 737-500 e um Airbus 319 alugados da Ucrânia.

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