OJM acusada de orquestrar fraude nas eleições do presidente da Associação de Estudantes da UEM

POLÍTICA
  • “Urnas fantasmas”: Fórmula da fraude chega à academia
  • Uma das urnas tinha 716 votos pré-votados a favor do candidato da Frelimo

Exclusão de candidatos, aparecimento de urnas fantasmas, envolvimento do braço juvenil do partido Frelimo e uma tomada de posse “à calada da noite” é o saldo das eleições da Associação dos Estudantes da Universidade Eduardo Mondlane (AEUEM), um processo, de todo, inquinado de ilegalidades e que está a ser contestado por uma parte considerável dos estudantes da maior e mais antiga universidade do país, que na última sexta-feira chegaram a manifestar-se junto da reitoria, exigindo a reposição da verdade eleitoral.

 Renato Cau

É que, segundo apurou o Evidências, o processo terá sido supostamente viciado pela Organização da Juventude Moçambicana (OJM), que para além de impor a substituição de um dos candidatos terá levado ao espaço da academia a fórmula fraudulenta com que se ganham eleições.

Segundo Evidências apurou, o pleito foi manchado pelo aparecimento de “urnas fantasmas” no momento de contagem e quando os candidatos derrotados ainda esperavam pelos resultados dos seus esforços de impugnar os resultados são surpreendidos com antecipação da tomada de posse, que acabou acontecendo à revelia três dias antes da data prevista.

Mas tudo começou com o lançamento do edital, onde de acordo com o regulamento interno qualquer estudante, querendo, podia concorrer, desde que reunisse requisitos. Três candidatos, apresentaram-se, nomeadamente Diamantino Atanásio Mário (lista A), Nabí José Raimunido (lista B), e Onório Eduardo António (lista C).

Mas a disputa que devia ser de estudantes acabou transcendendo para o campo político, com a OJM, que sempre manipulou as eleições naquela organização, a impor o candidato da Lista C, Onório Eduardo António, por sinal membro do braço juvenil do partido Frelimo.

Mas porque os demais candidatos mostravam uma grande pujança e preferência durante a campanha, foi accionada a máquina de fabricação de vitórias retumbantes, esmagadoras e asfixiantes. As eleições decorreram nas 28 faculdades da UEM, e no meio do processo a comissão eleitoral decidiu mudar as regras de jogo e impor que urnas que continham os votos deviam todas ser abertas e feita a contagem em único local, o que significa movimentar as urnas de um lado para o outro. Aí começou a desconfiança, mas garantiu-se que deveriam lá estar os delegados de cada lista.

Em meio a desconfiança de uns para com os outros, as urnas foram cautelosamente monitoradas pelos delegados, mas estes foram enganados debaixo dos seus olhos. Na sala onde decorreu a contagem apareceram algumas urnas não identificadas e com votos muito acima dos 120 previamente definidos, o que denuncia que houve enchimento de votos.

Na verdade, as urnas estavam identificadas em faculdades de ensino (ex: faculdade de Direito, de Economia, de Ciências Sociais etc), mas algumas destas urnas identificadas sumiram e apareceram nove que não continham identificação. As urnas normais tinham cerca de 70 a 120 votos.

Enchimento a moda Gaza

Entretanto, no decurso da contagem descobriu-se que as urnas, a partir da 12ª a 17ª, não tinham identificação e já tinham votos que roçavam a casa dos 300, chegando a haver dezenas de votos sequenciados a favor do candidato da lista C, Onório Eduardo António. Tal facto chamou a atenção de todos presentes, mas a contagem e validação dos votos não parou.

Mas o cúmulo do esquema foi verificado quando a 17ª urna continha 716 votos, “todos eram de um e único candidato, neste caso da lista C, e ninguém sabe explicar como”.

Irritados com o cenário, os delegados doutras mesas eleitorais iniciaram uma manifestação no local, tendo forçado a comissão a cancelar o processo.

“Nós sugerimos no mesmo instante que o candidato da lista C fosse desqualificado e todas aquelas urnas fantasmas retiradas, passando a validar aquelas que estavam devidamente identificadas, infelizmente isso não aconteceu”, refere uma fonte, para depois revelar que para o espanto de todos a contagem dos votos continuou em outro local, e na manhã do dia 14 de Dezembro, “eis que a comissão emite um comunicado anunciando o vencedor das eleições e dava o prazo de três dias para submissão de reclamações”, dizia.

Antecipação da tomada de posse

Mas o escândalo não pára por aí. O calendário de actividades mostrava que o dia 14 estava reservado à publicação dos resultados das eleições, dias 15, 16 e 17 estavam reservados para casos de reclamações, dia 18 dia de publicação dos resultados finais e, esta segunda-feira, dia 19 de Dezembro seria o dia de tomada de posse.

Não se sabe como, mas a comissão eleitoral já veio a público anunciar que o candidato da lista C tomou posse no dia 16, ou seja, enquanto os candidatos da lista A e B buscavam reclamar os resultados, o estudante Onório Eduardo António tomava posse como novo presidente da associação de estudantes da maior universidade pública do país.

Neste cenário, os estudantes que preferem não se identificar por temer represálias dizem ter certeza que “este processo está sendo colocado a questão do partidarismo dentro da instituição e todos têm que estar alinhados com a OJM aqui na UEM, tanto que todos já sabiam que um dos requisitos para se dar bem neste processo era fazendo parte do partido ou da OJM, porque lá você conseguiria apoiantes”.

No mesmo dia 16 de Dezembro, os outros dois candidatos a presidência submeteram formalmente as suas reclamações junto da comissão de eleições da universidade, “mas sequer passaram 10 minutos e fomos chamados para levantar os documentos e os mesmos tinham sido estranhamente indeferidos”.

Houve outro escândalo e o processo chegou a reitoria da universidade dirigida por Manuel Guilherme Júnior, mas a mesma nada fez com relação a este caso. Os estudantes insatisfeitos com o cenário contam que solicitaram a presença de alguns órgãos de comunicação.

“Demos entrevistas, falamos das nossas inquietações para que talvez o assunto fosse resolvido, e mais uma vez tivemos a certeza das nossas palavras, as reportagens não passaram em nenhuma televisão ou órgão que esteve lá naquele dia”, lamentaram.

Depois disso seguiram-se as ameaças e segundo relatam “o registo académico tem tentado nos calar, já recebemos ameaças de alguns jovens grandes da OJM e do próprio registo académico. Chegaram a nos dizer que nós somos jovens com um longo caminho pela frente, então temos que evitar certas coisas”.

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