Líderes  comunitários cobram entre quatro e seis mil meticais para emitir declaração do bairro

POLÍTICA
  • Residentes do município de Boane “assaltados” em plena luz do dia
  • Edil de Boane disse que ainda não recebeu nenhuma denúncia
  • Secretário do Bairro VI refuta as acusações e diz que se trata de difamação

Embora o ministério da Administração Estatal tenha referido que pagamento das taxas para emissão de declaração dos bairros é ilegal, acrescentado que os pedidos resultam de uma decisão empírica, em vários cantos do País, os chefes de quarteirões e os secretários do bairro continuam a fazer cobranças para a emissão de declaração de bairro. No Bairro VI, arredores do Município de Boane, província de Maputo, há um secretário de bairro que cobra entre quatro e sete mil meticais para emitir uma declaração do bairro, facto que deixa agastados os residentes daquela circunscrição. Jacinto Loureiro, edil de Boane, disse que o caso das alegadas cobranças ilícitas ainda não chegou ao seu gabinete, contudo, desafiou os munícipes a denunciarem casos do género as autoridades governamentais, enquanto Carlos Acácio refuta as acusações e diz que se trata de um caso de calúnia e difamação movida por pessoas de má-fé.

Duarte Sitoe

No bairro da Zona Verde, arredores do município da Matola, quem pretende tratar declaração do bairro deve estar munido de 300 meticais, ou seja, primeiro paga 100 meticais ao chefe de quarteirão e posteriormente paga 200 meticais ao secretáriodo bairro.

No entanto no Bairro VI, arredores do município de Boane, um secretário do bairro que responde pelo nome de Carlos Acácio decidiu inovar e fixou entre quatro e sete mil meticais o valor para emissão de declaração de bairro numa altura que muitos munícipes procuram aquele documento para pedidos de atribuição do Direito de Uso e Aproveitamento da Terra (DUAT) e contratos de novas ligações de energias eléctrica.

Osvaldo de Jesus, morador daquele bairro, jura de pés juntos que se viu obrigado a pagar cinco mil meticais para ter a declaração do bairro, documento indispensável quando se precisa assinar um contrato com a Electricidade de Moçambique no âmbito das novas ligações.

De Jesus contou ao Evidências que numa primeira fase recusou-se a pagar a referida quantia, mas com o tempo conformou-se e tirou os cinco mil meticais para estar ligado à rede eléctrica nacional.

“Estamos diante de um secretário do bairro que desenhou as suas próprias leis.  Infelizmente, vivemos num País onde a corrupção e as cobranças ilícitas já foram legalizadas. Em outros bairros, pagam 200 meticais na emissão da declaração de bairro, mas aqui no Bairro VI o secretário do bairro é quem escolhe o valor a pagar. Fui obrigado a pagar cinco mil meticais para ter o documento para entregar a Electricidade de Moçambique no âmbito da assinatura do contrato para ter energia eléctrica. É um assunto com barbas brancas e acho que já é do conhecimento do Conselho Municipal de Boane, mas até aqui nada aconteceu”, lamentou a fonte.

Indo mais longe, Osvaldo de Jesus referiu que tentou ameaçar o secretário do bairro com uma queixa nas autoridades governamentais, mas o mesmo trouxe à baila que pode até levar a queixa ao Presidente da República que nada iria lhe acontecer.

“Estamos mesmo entregues a nossa própria sorte. O secretário do bairro já nos provou que é intocável. Tivemos casos de munícipes que ameaçaram denunciar as cobranças ilícitas, mas, debalde, o senhor Carlos Acácio teve a ousadia de dizer que nada iria lhe acontecer, tendo incentivado os críticos que mesmo levando o caso ao gabinete do Presidente da República nada iria lhe acontecer”, desabafa.

Anastácia Matavele solicitou a emissão da declaração de bairro para fazer um requerimento a solicitar Direito de Uso e Aproveitamento da Terra (DUAT) mas ficou surpreendida quando soube que tinha que pagar sete mil meticais para ter aquele imprescindível documento.

“O secretario do Bairro VI sabe que o grosso das pessoas que solicitam a emissão da declaração do bairro tem assuntos para tratar com carácter de urgência e aproveita-se desta situação para aplicar taxas exorbitantes. Não fui a primeira e nem a última a ser assaltada. Nos sujeitamos a estas situações porque tratamos documentos em cima de joelhos e quando isso acontece pagamos por um serviço que em norma é gratuito. O Governo deve regular a actuação dos chefes de quarteirão e os secretários dos bairros. É inadmissível termos um secretário do bairro que aplica leis que são desconhecidas pelo Estado”, disse Anastácia Matavele.

Uma das razões que aumentam a desconfiança dos residentes do Bairro VI é o facto do referido secretário nunca emitir recibo no acto da emissão da declaração do bairro.

“A minha esposa foi ao gabinete do secretário do bairro para tratar declaração do bairro para abertura de conta, mas ficou espantada com o valor que foi cobrada. Foram seis mil meticais. Felizmente ela não pagou esse valor, preferiu tratar o documento no bairro do Infulene onde pagou 550 meticais, uma vez que ainda não havia feito o pagamento do imposto autárquico”, disse Mateus Valente, outro morador.

Madalena Filimone culpa o Governo pela postura dos chefes de quarteirão e dos secretários do bairro, por não terem uma remuneração.

“Por não receberem essas duas figuras procuram tirar o proveito dos seus cargos para extorquir a população e o Governo é o principal culpado por esta situação. Pedimos a quem é de direito para colocar um travão no senhor Acácio que, por sinal, é membro da Assembleia Municipal de Boane”, desabafou.

Município desconhece as cobranças ilícitas e Carlos Acácio refuta as acusações

O presidente do Conselho Municipal de Boane, Jacinto Loureiro, interpelado pelo Evidências, disse que a edilidade ainda não recebeu nenhuma denúncia sobre as supostas cobranças ilícitas no Bairro VI, tendo instando os munícipes a denunciarem casos de género para que os infractores sejam responsabilizados.

“Essas denúncias são sempre bem-vindas, mas devem ser canalizadas a edilidade para podermos averiguar. Dito assim nada podemos fazer, não passa de um boato. Agora se trouxerem os factos nós vamos levar o caso para frente”, disse Loureiro.

Por sua vez, o secretário do Bairro VI, Carlos Acácio, refutou todas acusações e referiu que se trata de um caso de calunia e difamação movida por pessoas de má fé, tendo mandatado o seu advogado para prestar mais esclarecimentos sobre o assunto.

“Estamos num período que as eleições autárquicas estão próximas e há muitas especulações que vão decorrer, mas com intuito de manchar um e outro. As pessoas devem provar que foram cobradas quatro mil meticais. Há muita gente que pode falar e essas pessoas podem ter sido instrumentalizadas para sujar uma outra pessoa, mas o essencial é existir provas para que este assunto siga os trâmites legais”, disse o advogado que preferiu não se identificar.

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