- Enquanto o Governo assobia para o lado e a ministra Namashulua continua a mentir
- Livros que para o MINEDH chegaram em Março ainda não estão nas mãos das crianças
- Docentes acusam Executivo de não estar preocupado com o desenvolvimento do sector
- Professores têm feito das tripas coração para suprir falta de manuais
- Namashulua admite que há problemas que afectam o sector da educação
Ao contrário do que aconteceu nos últimos anos em que o Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano conseguiu distribuir o livro da distribuição gratuita no ensino primário em todo território nacional ainda no primeiro trimestre, no corrente, os professores e os alunos vivem no reino da incerteza, ou seja, não sabem quando é que serão disponibilizados os manuais. Para a classe docente, a ausência do livro dificulta sobremaneira o processo de ensino e aprendizagem, daí que apelam ao Governo para redobrar esforços para que o livro chegue o mais rápido possível aos educandos. No que respeita aos manuais, o Governo garantiu, no primeiro semestre, que os mesmos já estavam nos portos nacionais, faltando apenas a distribuição para os distritos. No entanto, de lá a esta parte nenhuma escola recebeu os referidos livros. Aliás, sem tocar na componente dos materiais didáticos, uma temática a qual nos últimos tempos tem estado a fugir quando abordada pela imprensa, a ministra de Educação e Desenvolvimento Humano (MINEDH), Carmelita Namashulua, admitiu, recentemente, a existência de vários problemas que afectam o sector da educação, desde infra-estruturas até as dificuldades de pagamento das horas extras aos professores.
Duarte Sitoe
O sector da educação está à beira do colapso em Moçambique. Para além das iminentes ameaças de paralisação que derivam dos recorrentes atrasos no pagamento das horas extras dos professores, o pelouro liderado por Carmelita Namashulua debate-se com a falta de livros de distribuição gratuita para o ensino primário.
A falta dos materiais didáticos inquieta a classe docente que deve fazer das tripas coração para dar prosseguimento ao processo do ensino e aprendizagem. Elma Matias, professora da 2ª classe numa das escolas sediadas no Município da Matola, província de Maputo, não tem dúvidas que a falta de livros coloca em causa a qualidade do ensino.
“Não restam dúvidas, a qualidade de ensino em Moçambique tende a regredir a cada ano que passa. Infelizmente, nesta situação toda, apontam o dedo ao professor, que por vezes trabalha com mais de 80 alunos e sem condições mínimas. Os anos vão passando e continuamos com as mesmas dificuldades de sempre. Estamos no segundo trimestre e ainda não recebemos livros. É imperioso os alunos da 1ª a 3ª classes terem o livro para facilitar o processo de ensino e aprendizagem porque são classes nucleares. Agora temos que improvisar porque o Governo diz que não tem dinheiro, tanto para livro, assim como para horas extras dos professores”, declarou Elma.
“Ao invés de ir para frente estamos a regredir”
Visivelmente agastada, Elma conta que a classe docente viu-se obrigada a recuar para o passado em que o professor era o único que tinha livros dentro da sala de aulas.
“Estamos num país em que os dirigentes andam de carros de luxo e vivem em mansões, enquanto os funcionários públicos continuam desgraçados. Não se justifica o que está a acontecer em Moçambique. Ao invés de ir para frente estamos a regredir. Voltamos à época em que apenas o professor tinha o livro dentro da sala de aulas. Trabalhamos sem mínimas condições e mesmo com isso ainda nos negam o que é nosso de direito. O nosso Governo deve valorizar mais o sector da educação, disponibilizando materiais didáticos a tempo e hora e sem esquecer melhor a remuneração dos professores.
Anacleto Langa, docente da 5ª classe, contou ao Evidências que desde o arranque do ano lectivo os seus alunos só receberam apenas um manual, tendo advertindo que com estas condições o sector da educação está condenado ao fracasso.
Segundo Langa, há três sectores vitais que não podem ser negligenciados, uma vez que são imprescindíveis para o desenvolvimento de qualquer nação. Trata-se da educação, saúde e segurança.
“Estão a brincar com um sector vital para o desenvolvimento da nação, tal como tem feito com a saúde e defesa. É urgente o país mudar para se resgatar a qualidade de ensino. O professor precisa de material para ensinar, não basta apenas disponibilizar giz e uma sala de aulas, temos que ter livros para facilitar a interação entre o aluno e o professor”, declarou.
Quem foi mais contundente é Eunice Xavier, acusando o Governo de assobiar para o lado quando se trata de problemas que enfermam o sector da educação. Eunice referiu que não percebe a razão da actual ministra da Educação e Desenvolvimento Humano continuar em exercício, apesar de já ter mostrado que não tem competências para digerir aquele pelouro.
“Temos uma ministra que não vai deixar saudades. Com ela ao leme, ao invés de melhorar, o sector da educação caminha a passos largos rumo ao precipício. Foram feitas várias mudanças e trouxeram algumas inovações, mas a qualidade de ensino ainda está longe de roçar a perfeição. Os professores têm sido heróis, mesmo sem ovos conseguem fazer omeletes. O Governo deve saber que existe uma diferença abismal entre o ensino primário e secundário. No ensino primário, sobretudo na 1ª e 2ª classe, é imperioso ter livros para facilitar o processo do ensino e aprendizagem. Estamos a iniciar o segundo trimestre, mas ainda sem livros. Temos que pensar para onde queremos levar o nosso sistema de educação”, desabafou.
Falta de livros (também) inquieta encarregados de educação
No passado, os livros chegavam às escolas, mas eram insuficientes, ou seja, não chegavam para todos alunos. No presente, os livros tardam em chegar aos estabelecimentos de ensino.
Esta situação deixa os pais e encarregados de educação com os nervos à flor da pele, uma vez que são obrigados a ir ao mercado negro para adquirir o material didático. Zefanias Magagule tem um filho que actualmente frequenta a primeira classe e mostrou-se preocupado com a demora na distribuição dos manuais.
“O primeiro trimestre terminou sem livros. A direcção da escola garantiu que os manuais serão distribuídos no trimestre em curso. Esta situação me incomoda como pai e encarregado da educação. Nas actuais condições não tenho como auxiliar o professor no processo do ensino e aprendizagem. O estranho é que as escolas privadas têm livros, mas no sector público dependemos da boa vontade do Governo. Não podemos continuar a brincar com coisas sérias. Pedimos a quem de direito para resolver esse problema de livros”.
Ao contrário de Magagule, que ainda aguarda pelos manuais de distribuição gratuita, por ter matriculado o filho numa escola privada, Dórica Ngulele sabe que ano após ano deve comprar livros, e neste não fugiu à regra.
Em conversa com o Evidências, Ngulele referiu que se viu obrigada a transferir o filho da escola pública para a privada porque percebeu que a qualidade não era das melhores.
“O meu filho iniciou-se nos estudos com seis anos de idade, por sinal mesma idade da filha da minha irmã. Com oito anos, a minha sobrinha sabia ler e escrever o seu nome, mas o meu filho nem conseguia copiar o nome. Foi daí que decidi o transferir para uma escola privada. Foi uma boa aposta porque em menos de um ano já estou a colher resultados positivos, ele já sabe ler e escrever. A diferença entre o ensino público e privado é que temos que comprar livros. Os livros que tanto faltam nas escolas públicas nós adquirimos nas papelarias e no mercado negro. É necessário investir na educação, enquanto o Governo não fizer isso continuaremos a apostar no ensino privado.
Namashulua reconhece “vulnerabilidade”, mas continua a fugir “assunto livros”
O Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano garantiu, em Março do corrente ano, que os livros do ensino primário já estavam no país, faltando apenas a distribuição para os distritos. Entretanto, volvidos quase dois meses, os professores e alunos ainda não viram a cor dos mesmos.
Aliás, o Governo garantiu que os livros da 1ª a 3ª classes estão a ser impressos intramuros pelas gráficas que ganharam o concurso público, mas, debalde, tratou-se de mais uma mentira do Executivo, uma vez que as supostas gráficas que estariam a imprimir o livro não alinham com a narrativa do MINEDH.
Resignada com actual estágio do sector da educação em Moçambique, escusando-se de tocar no assunto do livro escolar, a ministra de Educação e Desenvolvimento Humano (MINEDH), Carmelita Namashulua, admitiu, recentemente, existirem vários problemas que afectam o sector da educação, desde infra-estruturas até as dificuldades de pagamento das horas extras aos professores, tendo justificado que tal facto deve-se à escassez de recursos.
“Não temos salas suficientes porque não temos recursos para satisfazer as nossas necessidades, a demanda é maior em relação ao nosso sistema educativo, não temos professores suficientes face à demanda nas nossas escolas”, disse a governante, para depois referir que os países africanos devem transformar os seus recursos em meios sustentáveis para garantir uma educação de qualidade e sólida.
Por sua vez, a Associação Nacional dos Professores promete se pronunciar nos próximos dias sobre a falta de materiais didáticos nas escolas públicas e a provável paralisação das actividades.
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