- Nyusi, seus filhos e testa de ferro querem controlo de empresas estratégicas
- A intenção é tomar de assalto as empresas que são vacas leiteiras
- Tonela não é nenhum inocente. Deixa MEF com fortes indícios de uma corrupção institucionalizada
A queda de Max Tonela do cargo de ministro da Economia e Finanças continua a suscitar muitas interrogações. No entanto, ao que Evidências apurou, terá sido precipitada por algumas desinteligências com o Presidente da República, Filipe Nyusi, devido ao facto de o ministro ter se recusado a chancelar interesses do Chefe de Estado, seus filhos e do ministro na Presidência, Constantino Bacela, se apoderar de algumas participações do Estado nalgumas empresas participadas. Até ao princípio da noite daquela quinta-feira (08), Max Tonela não sabia que iria cessar funções e nem foi o Presidente que lhe informou, mas sim o ministro na Presidência para assuntos da Casa Civil, Constantino Bacela.
Até a última quinta-feira, Max Tonela fazia parte de uma selecta lista de sete ministros que compunham o núcleo duro do governo de Filipe Nyusi, mas acabou sendo desembarcado antes do tempo, numa altura em que o Governo entrou praticamente em modo gestão à espera do fim do mandato.
Desde logo, várias teorias surgiram, dentre as quais a de que estaria prestes a ser presenteado com o mais alto cargo de gestão do Fundo Soberano, que se encontra em fase de constituição. No entanto, as razões da sua queda perto do fim parecem mais profundas.
Informações que circulam dão conta que Max Tonela está a ser punido por não ter acedido a vários pedidos dos filhos do Presidente da República, Filipe Nyusi, que pretendem obter a título gratuito participações detidas pelo Estado nalgumas empresas estratégicas e outras consideradas simples vacas leiteiras.
Para continuarem a viver uma vida fausta e sem grande esforço depois do mandato consta que os filhos do Presidente mapearam e escolheram as empresas que têm negócios nebulosos com o Estado, algumas das quais foram criadas simplesmente para acomodar interesses inconfessos. O seu interesse consiste em obter participações ou forçar a antecipação de assinatura de contratos, como aconteceu no polêmico caso do MPDC.
Entre as empresas que estavam no radar dos filhos do Presidente está a MCNet, uma empresa privada, formada pela SGS e a Escopil com 60%, CTA com 20% e AT com 20%. Sua missão é servir de suporte para o processo de desembaraço aduaneiro através da Janela Única Electrónica (JUE).
Muitas vezes foi descrita como uma espécie de vaca leiteira para acomodar interesses das elites, gerando um aumento dos custos de importação de produtos. A MCNet factura milhões ao descontar uma percentagem em cada produto que entra ou sai do país através da JUE. É aqui onde entra o interesse da família presidencial que quer se posicionar estrategicamente na boca da Janela Única Electrónica para “mamar” silenciosamente durante anos a fio.
Isso segue um padrão de negócios da família de Filipe Nyusi, que tem interesses e come a torta e grossa na REVIMO, onde um dos filhos é um dos principais provedores de serviços, num negócio fechado secretamente e sem seguir nenhum padrão de transparência.
Apoio aberto ao candidato pode ter gerado sentimento de traição
Para além dos filhos do Presidente, consta que o ministro na Presidência, Constantino Bacela, por muito tempo considerado testa de ferro de Filipe Nyusi, está metido nesta intentona que sempre teve “NÃO” de Max Tonela. Só para se ter ideia, neste momento, a própria Presidência da República está no modo de gestão do fim, acumulando dívidas com os fornecedores, o que pode ser indicador da qualidade da sua gestão, voltada para caça- oportunidades.
As propostas para a viabilização do que seria o último banquete da família presidencial, antes do fim do ciclo, estavam em cima da mesa de Max Tonela há já bastante tempo, mas nunca tiveram o “OK” para a sua efectivação, mas nunca foram aprovadas, o que terá irritado o “dono da caneta”, que sem contemplações decidiu demitir um dos ministros que fazia parte da sua dream team.
Longe do bloqueio de Max, os interesses da família presidencial incluem a empresa de Silos e Terminal Graneleiro da Matola (STEMA), que fornece serviço de manuseamento de carga cerealífera e leguminosa, com destaque para armazenamento, expedição e ensacagem. Num passado recente, STEMA foi apontada como insustentável, uma inverdade que visava desvalorizar a mesma, num contexto em que apresentava resultados sólidos.
Para além de inviabilizar os projectos da família presidencial, outro pecado de Max Tonela, que sempre teve relação próxima com Nyusi, é o facto de a dado momento ter passado a dar apoio directo ao candidato da Frelimo, Daniel Chapo, o que fez com que perdesse confiança política.
O apoio directo e aberto à Chapo, aliado ao facto de não ter anuído o plano de assaltar as “vacas leiteiras”, foi entendido como traição. Por isso, a entrada de Adriano Maleiane é tida como tendo em vista materializar o plano.
Sem legado no MEF
Max Tonela é nomeado ministro de Economia e Finanças (MEF) em Março de 2022, depois de ter assumido as pastas dos Recursos Minerais e Energia desde 14 de Dezembro de 2017. O que é evidente é que a exoneração de Max foi uma decisão de rotura, uma “zanga de comadres”, onde foi preferível sobrecarregar Adriano Maleiane, que muito bem conhece a casa e com flexibilidade demonstrada na resolução dos assuntos domésticos, no entanto persona non grata para as instituições de Bretton Woods, cuja retoma do apoio directo ao Orçamento do Estado, no caso do FMI, coincide com os primeiros dois meses da indicação do Max Tonela no MEF. O que sugere tratar-se de uma medida dura, que a menos de seis meses do fim do mandato sobrecarrega Maleiane.
Por outro, as contínuas queixas dos empresários, embora não documentadas, de que o Tesouro se transformou num antro de corrupção, constituem uma mancha para o ex-ministro. A suposta institucionalização de corrupção naquela direcção começa com o modelo centralizado das Finanças Públicas.
Antigamente, o Estado libertava fundos para as províncias onde estes tinham a liberdade de pagar suas despesas com menos burocracia. No segundo mandato de Nyusi, MEF entendeu que o processo devia estar centralizado, o que tornou o processo mais burocrático. Neste momento, um fornecedor que prestou serviços na Zambézia manda as suas facturas à província que dá o aval do pagamento no sistema.
No entanto, para o desembolso se efetivar e se refletir na conta do fornecedor, precisa do aval de Maputo (Tesouro), que pode levar mais de um ano, se o fornecedor não colaborar nos esquemas. Existe aqui uma percepção de institucionalização de corrupção que frustra o empresariado.
Esta é uma realidade assumida internamente, no entanto uma fonte disse ao Evidências que “é verdade. Mas é um assunto do Tesouro e de Chamila Idrisse Aly (directora Nacional do Tesouro e Cooperação Económica e Financeira). Não tem nada a ver com o Max”. Enquanto se discute sobre os chefes que realmente se beneficiam, o facto é que os fornecedores passaram a negociar directamente com o Tesouro para ver seus pagamentos das dívidas. Muitos empresários começaram a pagar 10% para receber os pagamentos.
Num país onde a corrupção assombra os negócios com Estado, imagina um empresário que tem de pagar 21% às finanças (16% do IVA + 5% anual), 10% na província para garantir o negócio e mais dez 10% a Maputo, para o tesouro desembolsar. A questão que fica é: qual é este negócio onde é possível lucrar 50%? Nada desta simulação é certa, mas há quem está convicto que os negócios com Estado funcionam desta maneira.
Mas Max Tonela não é inocente. A polêmica reforma da Administração Pública, que introduz a Tabela Salarial Única (TSU), o pesadelo dos funcionários públicos, configura-se como a maior fonte da insatisfação na função pública, com funcionários a ver as suas expectativas frustradas face às promessas das vantagens apresentadas. Hoje, em consequência da reforma mal-sucedida na Administração Pública, degradou a qualidade dos serviços públicos em todos os sectores, e as sucessivas greves expõem o fracasso de Max no pelouro das finanças. Contribuindo, em consequência, para o fracasso de todo um consulado de dez anos de Nyusi.

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