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- Disse que a anterior era pequena para a sua “grande” família e exigiu uma maior
- A nova casa em que cabe toda família do ministro é quase duas vezes mais cara que a anterior
- A casa foi paga pelos Cofre Geral dos Registos e Notariado, a um valor de 39 milhões de meticais
- O mesmo cofre havia gastado 24 milhões de meticais por outra casa protocolar
- Ministério disse não ter contornos da aquisição da casa, mas a directora do CGRN confirma
Em tempos de crise, o Ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Mateus Saize, exigiu que lhe fosse atribuída uma casa maior do que a deixada pelos seus antecessores. Entre os argumentos, está o facto de ter uma família alargada que não podia caber na casa que foi ocupada pelos seus antecessores, como Helena Kida (2020-2024) e Joaquim Veríssimo (2018-2020). A nova casa, uma exigência feita antes de o ministro conhecer todos os cantos do ministério, custou ao Estado 39 milhões de meticais, pagos através do Cofre Geral dos Registos e Notariado. Tem mais de seis compartimentos e anexos, suficientes para albergar a grande família do ministro, o primeiro a se impor e deixar claro que as suas preferências devem ter acolhimento imediato. Quando comparada com a anterior residência protocolar, a mansão luxuosa de Mateus Saize é 15 milhões mais cara. Mateus Saize é o velho árbitro do Conselho Constitucional, cuja chegada no Governo é confundida com o seu desempenho nas suas funções anteriores e a flexibilidades na concretização das suas preferências vaidosas corrobora com a ideia de que está ali para compensação. O Ministério que dirige disse à nossa reportagem que nada podia comentar, por não ter conhecimento dos contornos por detrás da nova aquisição, limitando-se em partilhar que a anterior casa não foi ocupada porque está em reabilitação. No entanto, a directora do Cofre Geral dos Registos e Notariado, Maria Teresa Buce, confirmou tratar-se de uma nova aquisição com vista a atender a uma reclamação que diz não ser nova: “a casa era pequena”. Ela argumenta que a anterior casa será usada para outros fins ainda não identificados, incluindo a possibilidade de colocar à disposição para ser arrendada.
Nelson Mucandze
É mais um exemplo de despesismo em momento de crise e que coloca em causa a retórica de austeridade que tem sido defendida por Daniel Chapo. Desta vez envolve o Ministro de Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, que antes de completar dois meses, já tem uma exigência que custou ao Estado 39 milhões de meticais.
Nos parcos dois meses em que não se conhece a sua acção de destaque enquanto ministro, foi possível exigir casa, identificar e adiantar pelo menos cinco milhões de meticais. Curiosamente, o fornecedor da casa é o mesmo que há menos de 10 anos vendeu a residência protocolar que foi ocupada pelos antigos ministros do mesmo pelouro, nomeadamente, Joaquim Veríssimo e Helena Kida, que custou 15 milhões mais barato. A mudança do ministro para a nova residência protocolar também foi rápida.
Segundo apurou o Jornal Evidências, o ministro teria argumentado que a sua família é grande para caber numa casa menor de quatro quartos. O novo imóvel tem seis quartos e anexos para empregados com dois quartos e duas garagens com capacidade, cada, de três viaturas, para além de espaço no quintal para lazer, características que o governante procurava.
No entanto, as preferências do ministro, num contexto de crise quase palpável demonstra insensibilidade às necessidades mais pontuais, que têm ganho eco no Executivo actual, que vem mostrando dificuldades até para pagar salários na Função Pública.
Apesar desta preferência vaidosa do ministro não ter qualquer possibilidade de resultar em consequências legais, o acto de governante cuja ascensão por si só é exemplo de promiscuidade entre o sector judicial e político, compromete a ética na administração pública. Em termos rigorosos, é o nomeado que se devia ajustar à configuração política do Estado, e não o Estado a sucumbir à grandeza da família do nomeado, remodelar-se até conseguir recursos para satisfazer os caprichos familiares do governante.
Geralmente, a gestão da família fica por conta do nomeado e não do Estado, por exemplo, Eduardo Mulémbwè, ministro na Presidência para Assuntos Parlamentares, Autárquicos e Assembleias Provinciais, tem mais de dez filhos, mas não obrigou o Estado a procurar uma residência que atenda a essa grandeza da sua família.
Um desconforto, duas casas, 39 milhões, depois de gastos 24 milhões de meticais
Neste momento, existem duas casas protocolares. A casa ora em reabilitação, depois que foi rejeitada pelo ministro actual, foi comprada a 24 milhões de meticais, quase a metade do que foi gasto com a nova aquisição e passou dela a ministra Helena Kida (2020-2024), depois que foi ocupada pelo ministro Joaquim Veríssimo.
Ambas as casas foram adquiridas do mesmo vendedor pelo Cofre Geral dos Registos e Notariado, um fundo especial que financia as atividades dos serviços de registo e notariado e é alimentado por taxas cobradas pelos serviços de registo civil, predial, comercial e notarial, além de outras receitas geradas por esses serviços.
A sua directora, Maria Teresa Fernando Buce, explicou à nossa reportagem que esteve à disposição do ministério uma residência protocolar, no entanto, “quando chegou o ministro Size, avaliou-se o estado da residência e, por sorte, tem estado agora numa política de rentabilização e aquisição de imóveis para o aumento da renda para o cofre do Estado”.
“Então, nessa pespectiva, avaliou-se que aquela casa que nós já tínhamos como residência protocolar é de tamanho reduzido. Não sendo suficiente e já vinhamos recebendo reclamações por parte dos nossos titulares das pastas, alguns com famílias um pouco alargadas e não se sentem a vontade ali e nem alojar todo os membros da sua familia, que é o caso também do titular recente que tem uma familia maior”, disse, prosseguindo que também enfrentaram as mesmas dificuldades com os ocupantes anteriores.
De acordo com a directora do Cofre Geral dos Registos e Notariado, foi equacionada a medida de se ampliar aquelas instalações, mas não há mais espaço.
“E a maior dificuldade que tem é a garagem. Aquelas instalações têm um espaço muito pequeno, só cabe uma viatura, então para as famílias com um número maior e em alguns casos os titulares e dirigentes têm filhos já maiores e que também têm as suas viaturas. Outros carros tinham que ficar fora e aquela zona não é muito segura”, observou.
Quando questionada pela nossa reportagem sobre o porquê de se assumir como investimento uma aquisição que envolve valores assustadores, ela respondeu que “é um investimento no sentido de que os recursos do Cofre são somente as receitas próprias. Não tem orçamento do Estado e é, por isso, que quando há uma situação de crise económica, o cofre fica numa situação de negatividade. Existem compromissos expressos que o cofre tem a nível da instituição, então é um pespectiva tal como as outras instituições financeiras que tem estado agora a correr em busca de outras fontes de recursos, nós também estamos a correr em busca de recursos”, disse, enumerando algumas iniciativas da instituição.
Sobre o porquê de se adquirir do mesmo fornecedor, sem qualquer concurso, justificou que “não há algum laço assim directo que nós como instituição temos com o indivíduo, mas calha que quando identificamos uma moradia, ele está à frente a responder por aquela moradia. Para o caso desta última, nós procurámos saber se a casa era dele e ele confirmou que sim, pedimos a documentação e ele nos trouxe a documentação e provou”.
Referir que o Secretário Permanente do Ministério da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Justino Tonela, quando foi convidado a se pronunciar em nome do ministério, disse que na aquisição “não esteve envolvido o ministério. A casa pertence ao Cofre Geral dos Registos e Notariado, que apesar de ser uma entidade pública tutelada pelo Ministério da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, tem autonomia administrativa e patrimonial, portanto, faz investimentos com base naquilo que é a sua receita”.

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