Golpe ao poder do Xerife: Efeito Chapo?

EDITORIAL
Share this

Mudam-se os tempos, em cadeia, também os fenómenos. Mudam-se as pessoas, mudam também os objectivos. É o que podemos entender do novo acórdão do Tribunal Administrativo (TA), no qual, de forma inédita, o colectivo deste órgão decidiu, de forma unânime, deliberar pela anulação das decisões do Xerife, ou seja, anular todos os actos referentes à intervenção que o Banco de Moçambique fez no Moza Banco.

Rogério Zandamela é aquele tipo que, pela arrogância ou excesso de rigor, foi acumulando inimigos tanto na banca comercial, por se mostrar energicamente interventivo, imparcial e cínico a ponto de acusá-los do caos que hoje afecta transacções; quanto no sector privado que, com escassez de moeda, viu o seu poder de importação para alimentar a economia a abrandar, viu, igualmente, as promessas sobre a disponibilidade de dinheiro para investimento a não se concretizarem (os 500 milhões anunciados nos tempos da COVID-19 são parte desta ilustração); e depois o parlamento, que experimentou da arrogância do Xerife, a ponto de gazetar quando entendia.

Enquanto desfilava este currículo nas hostes públicas, internamente o Xerife enfrentava processos, não só no caso do Moza Banco, mas também com os trabalhadores, quando decidiu, de formar compulsiva, mandar-lhes à reforma, com uma proposta de indemnização problemática.

Ou seja, o Xerife foi um problema para todo o mundo, tanto para as pessoas e às vezes para a economia, com decisões que, apesar de parecerem sábias, pecavam por expor traços de arrogância. O poder político do consulado de Filipe Nyusi foi o seu amparo porque acomodava os seus caprichos, sem olhar para os murmúrios que se faziam ouvir. É por isso que o Xerife teve um percurso de intocável, fazia e desfazia e até quando a justiça lhe condenava, o efeito da decisão não se sentia, era o deus de um consulado assentado no tecto de vidro.

O colectivo do Tribunal Administrativo esteve a par de todo esse percurso, esteve a par dos contornos da intervenção do Moza Banco, arrastou o processo desde 2023, nesta terra onde a promiscuidade entre a justiça e política se acasalam à luz do dia, mas eles nada fizeram. Precisaram da transição do poder, de novos tempos, outros acertos, outros actores, para expor a arrogância do Xerife, sem exaltar os efeitos da decisão em si, dirão que não era a decisão o objecto do litígio.

Mas que arrogância? Nem tanto. Por que houve um pouco da sabedoria na decisão do Xerife, que está mesmo a apanhar mais pela forma como executou a decisão do que pela própria decisão. O facto é que o Moza Banco, aquando de intervenção em 2016, esteve na falência e o Banco de Moçambique, com recurso aos fundos dos trabalhadores, sem auscultar estes (mas não importa), injectou dinheiro num banco à beira da falência e, este, pelo menos na gestão de João Figueiredo, o qual se demitiu semanas antes do barulho, teve lucros, ou seja, teve uma produtividade que, de alguma forma, legitimou a decisão do Xerife.

 Caso para dizer que o golpe é real, mas atenta mais contra a arrogância do Xerife, na forma como faz as coisas, na falta de publicação das suas decisões no Boletim da República e não na intervenção em si. Em países saudáveis, após a decisão do TA, o normal seria que sendo esta plenária a última instância para os actos administrativos, a anulação da intervenção tivesse implicação directa na estrutura do Moza Banco, mas nem o Moçambique Capitais demonstra qualquer interesse nesse sentido, deixando uma incógnita sobre os passos de seguimento.

Promo������o
Share this

Facebook Comments