Depois do descalabro da FMA, Governo entrega LAM à consultoria estrangeira sem ouvir a própria empresa

• Knighthood Global é a nova contratada para intervencionar a companhia
• Consultora estrangeira entra após fiasco político de Magala que pode continuar a influenciar
• Proximidade com o Presidente levanta suspeitas deste vir a contaminar o processo e as decisões
• Accionistas já entraram e adiaram a compra de aviões para privilegiar a restruturação da LAM
• Todo processo foi feito sem ouvir a própria LAM que desconhece por completo o dossier

A consultora internacional Knighthood Global, liderada pelo ex-responsável pela Etihad Airways, James Hogan, é a nova contratada pelo Governo de Moçambique para liderar o processo de revitalização da companhia aérea nacional, LAM – Linhas Aéreas de Moçambique, e do sector da aviação em geral. A decisão, tomada pelos accionistas sem consultar a própria LAM, surge após o fracasso da consultora FMA, escolhida no passado com o apadrinhamento do então Ministro dos Transportes e Comunicações, Mateus Magala, que actualmente exerce funções como conselheiro económico do Presidente da República, o que levanta suspeitas sobre a possibilidade deste vir a contaminar o processo e  as decisões de Daniel Chapo.

 Evidências

A nova intervenção foi gerida directamente ao nível do Governo e dos novos accionistas da LAM — Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB), Portos e Caminhos de Ferro de Moçambique (CFM) e Empresa Moçambicana de Seguros (EMOSE) — sem qualquer envolvimento da equipa técnica ou da administração da companhia aérea.

Internamente, a decisão foi recebida com surpresa e perplexidade, uma vez que os profissionais e administração da LAM, depois de tomarem conhecimento da reestruturação pela boca do próprio Presidente da República, não foram integrados na decisão ou sequer informados sobre os passos seguintes.

Apesar de já ser do conhecimento público a intenção de intervenção na LAM, a nomeação da Knighthood Global apanhou de surpresa os quadros da empresa, particularmente numa altura em que a nova administração da LAM realizava mudanças estruturais próprias, incluindo a nomeação de gestores inexperientes para posições de responsabilidade na subsidiária MEX (Moçambique Expresso).

Em comunicado, a Knighthood Global afirmou que os primeiros três meses de actuação serão focados na estabilização e reposicionamento da companhia aérea. A consultora assumiu como prioridade trabalhar com os novos accionistas no processo de aquisição de novas aeronaves, substituindo a frota reduzida e envelhecida que actualmente inclui dois Embraer EMB-145, um Bombardier CRJ900 e um Boeing 737-500, operados a partir do Aeroporto Internacional de Maputo.

Segundo a consultora, o sucesso da intervenção depende de uma abordagem governativa sólida e do alinhamento das partes interessadas. “O envolvimento e a governação das partes interessadas sustentarão crucialmente o processo consultivo para recriar a confiança na transformação da LAM e alinhar todas as partes em torno de uma única estratégia”, lê-se no comunicado.

E continua que “além disso, a correcta conectividade apoiará o turismo em Moçambique e, principalmente, o desenvolvimento de sectores-chave como mineração, petróleo e agricultura.”

A entrada da Knighthood Global como consultora na LAM representa mais um episódio de tentativa de resgate da companhia aérea moçambicana, marcada nos últimos anos por défices operacionais crónicos, rotatividade na gestão de topo, suspensão de rotas e indisponibilidade de aeronaves. Ao mesmo tempo, reforça a politização do processo, com decisões estratégicas tomadas à margem dos profissionais da casa, levantando dúvidas sobre a real sustentabilidade e eficácia desta nova fase de reestruturação.

A Knighthood Global, sediada em Abu Dhabi, tem um histórico de envolvimento em projectos de reestruturação no sector aéreo africano, incluindo a revitalização das companhias aéreas nacionais do Zimbabwe e da Tanzânia. Em 2024, a empresa destaca que concluiu com sucesso o plano de negócios para a nova Air Malta (KM Malta Airlines), uma solução aprovada pela União Europeia após o colapso da anterior companhia maltesa.

Mais recentemente, a Knighthood foi nomeada consultora da startup britânica Global Airlines, onde também se tornará accionista, assumindo um papel central na estratégia de introdução de aeronaves Airbus A380.