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A decisão do Tribunal Supremo que garantiu à empresária Ângela Dinis Buque Leão o direito à liberdade condicional após cumprir metade de sua pena de 11 anos por branqueamento de capitais não apenas destacou falhas na aplicação da lei, mas expôs uma crise estrutural: a morosidade crónica do Tribunal Superior de Recurso (TSR) de Maputo, que prolongou injustamente a sua prisão preventiva e violou princípios básicos de justiça.
No despacho controverso após a defesa solicitar a liberdade condicional em setembro de 2024, alegando o cumprimento de metade da pena (cinco anos e seis meses), o TSR de Maputo levou poucos dias para negar o pedido, mas baseando-se em uma interpretação legal questionável. Curiosamente, a rapidez aqui contrastou com a lentidão em outras etapas, como por exemplo o próprio recurso contra a condenação de 11 anos que já estava parado no TSR desde 2023, sem decisão.
A defesa recorreu ao Tribunal Supremo em Setembro, mas o TSR não enviou os autos por três meses, só o fazendo após reclamação formal. Esse atraso inexplicável manteve Ângela Leão presa preventivamente por mais um trimestre, mesmo com a lei anterior (mais favorável) claramente aplicável.
Após o TS determinar a liberdade condicional em 15 de abril, o TSR só reagiu em 28 de abril para enviar o caso ao Ministério Público, que respondeu em 07 de maio. Em outras palavras, mesmo com uma decisão vinculativa, o tribunal demorou 13 dias para cumprir um acto meramente administrativo.
A lentidão do TSR não é isolada. Tudo bem que o TSR de Maputo é responsável por recursos de toda a região sul do país, com equipa insuficiente, mas há aqui uma aparente sabotagem do processo, não apenas a falta de priorização do processo – caso penal complexo, como o de branqueamento de capitais, que exige análise detalhada, mas a falta de directrizes para priorização cria dúvidas.
Por outro, a ineficiência administrativa é uma realidade, o atraso no envio do recurso ao Supremo revela falhas na gestão de prazos e comunicação deficiente entre instâncias.
No momento, a morosidade do TSR tem impactos palpáveis, ou seja, concretos, como a prisão preventiva além do limite Legal – pois Ângela Leão já cumpriu seis anos de prisão preventiva (desde 2019), tempo que supera a própria pena mínima para alguns crimes.
São consequências extensíveis à erosão da confiança na Justiça: o caso virou símbolo de como a lentidão judicial beneficia a arbitrariedade. Como chegam a especular os advogados ligados ao processo e não só, podemos estar diante de uma situação em que o Estado usou a morosidade como instrumento de punição extra.
Enquanto isso, Ângela Leão aguarda a soltura final, marcada para as próximas semanas. O seu caso, porém, deixa uma lição clara: sem reformas urgentes, a morosidade continuará a ser o maior inimigo da justiça moçambicana.

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