Continuará a Frelimo surda, muda e a se transformar num covil de oligarcas insaciáveis?

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  • Membros, acadêmicos e religiosos reconhecem que Frelimo perdeu sua ideologia
  • Jauana desafia a FRELIMO a “abrir-se às vozes críticas” e propõe reformas profundas
  • Chissano admite que Moçambique enfrenta, actualmente, pobreza e corrupção
  • Padre Couto defende descentralização como caminho par  a unidade nacional 
  • Cadeado exorta Frelimo a recuperar prestígio internacional através da comunicação assertiva 

 O que era para ser um simples simpósio de reflexão, no quadro da passagem dos 63 anos da criação da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), que anos depois viria a dar nome ao partido que Governo o País, bem como os 50 anos da Independência, acabou se transformando numa sala de diagnóstico do estado de saúde do partido-Estado e tal como já se deixava transparecer cá para fora, o quadro clínico do sexagenário é delicado e inspira cuidados intensivos. Membros, académicos e outros extratos da sociedade convidados ao evento, deixaram ficar duras críticas sobre o estado das coisas na Frelimo. Hélder Jauana, o mais contundente e por muitos visto como o mais corajoso, dissecou sobre o distanciamento da Frelimo com a sua própria ideologia e com as massas, advertindo que as estruturas do partido no poder continuam minadas por conflitos internos, corrupção e uma crescente distância em relação ao povo. O antigo presidente da República, Joaquim Alberto Chissano, reconheceu que Moçambique enfrenta, actualmente, pobreza, corrupção e exclusão social. Para acabar com os problemas que minam o desenvolvimento do País, Chissano pediu mais esforços à juventude. O académico Calton Cadeado defendeu que o País, agora presidido por Daniel Chapo, deve recuperar a reputação que construiu durante e após a luta de libertação nacional que culminou com a proclamação da independência nacional, altura que, ao seu ver, granjeou respeito na arena internacional.

Duarte Sitoe & Elisio Nuvunga

A capital moçambicana, Maputo, foi palco do simpósio alusivo à celebração dos 50 anos da Independência Nacional e dos 63 anos da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).

Na qualidade de presidente do partido sexagenário, coube a Daniel Chapo fazer a abertura do evento que, entre os principais objectivos, visava reflectir sobre os 50 anos da independência nacional que se assinalam no dia 25 do mês em curso e sobre os 63 anos do partido no poder.

Na sua intervenção, Chapo enalteceu a visão e, sobretudo, os feitos de Eduardo Mondlane, arquitecto da unidade nacional, a quem elogia a visão que tem tornado a FRELIMO numa organização, segundo ele, aglutinadora das vontades de milhões de moçambicanos, do Rovuma ao Maputo, do Zumbo ao Índico, independentemente da tribo, região, raça ou outros factores de diferenciação.

“O orgulho que sentimos reside no facto de que a visão de Mondlane sobre a unidade nacional continua hoje inabalável. Isto reafirma a justeza dos objectivos da FRELIMO, que expressam de forma genuína a vontade colectiva dos moçambicanos e a razão da sua luta contra o colonialismo e o fascismo”, declarou.

Chapo aproveitou a ocasião para renovar o compromisso de pacificar o País, tendo, por isso, referido que há poucas margens para manobras para que Moçambique deixe de ser visto como um país de conflitos recorrentes.

“Estamos proibidos de falhar. Temos de criar um  ambiente de paz plena e duradoura, para que  Moçambique deixe de ser visto como um país de  conflitos recorrentes e de vários acordos, o que não  ajuda a atrair investimentos que precisamos para  criar mais emprego para a nossa população, para a  nossa juventude. Os investidores nacionais e estrangeiros, para colocarem os seus investimentos, precisam de um país em paz, em segurança e com estabilidade política, económica e social”, declarou.

“São os jovens, hoje, os novos libertadores”

Intervindo no painel sobre “Desafios para Moçambique”, o antigo Estadista moçambicano, Joaquim Chissano, não tapou o sol com a peneira, para além de reconhecer, apoiando-se no Acordo Geral de Paz, assinado em Outubro de 1992, que sem paz não há progresso e que sem inclusão não há paz verdadeira, referiu que Moçambique enfrenta actualmente vários problemas, com destaque para a pobreza e corrupção.

“Hoje, enfrentamos a pobreza, a corrupção, a exclusão social, a ignorância e o extremismo violento. Essas são as novas formas de opressão que minam os exércitos da nossa liberdade. A luta, portanto, continua com outras ferramentas, outros campos de batalha. Empunhamos agora o conhecimento, a ciência, a ética, o diálogo, a boa formação e a solidariedade como armas da transformação. Neste novo capítulo, a juventude tem um papel decisivo. São os jovens, hoje, os novos libertadores”, declarou o antigo Presidente da República.

 

Prosseguindo, Chissano, que instou os jovens a continuarem a obra iniciada pelos fundadores da Frelimo, mas com instrumentos adaptados aos tempos modernos para mudar o actual cenário, referiu que o diálogo deve ser cultura dos moçambicanos para a resolução dos problemas.

“A política deve ser instrumento de transformação e não de privilégios de alguns. E o diálogo deve ser parte intrínseca da cultura da nossa nação para que possamos nos movermos sempre juntos para o mesmo objetivo, o progresso. Que a diversidade de ideias não seja uma entrada à nossa marcha, mas sim um contributo para a tomada de decisões mais adequadas a cada passo da nossa marcha”, destacou.

Jauana desafia a FRELIMO a “abrir-se às vozes críticas” e propõe reformas profundas

Para finalizar, Padre Couto destacou a necessidade da revisão da eleição dos governantes provinciais (secretários e governadores). Aliás, muitas vezes é discutida a falta de clareza, mas nada é feito.

 

“A questão dos secretários do Estado deve ser bem analisado e que o governador das províncias deve ser bem eleito e ele também deve mandar e não ser ‘moleque’  do director. Se isso não acontecer, pode criar a desunião dentro da FRELIMO. Na questão dos secretários do Estado, a discussão é que se diz é que o procedimento electivo deve ser corrigido e que muitas das vezes não é claro, mas nada se faz”, concluiu.

 

O académico e membro sénior da FRELIMO, Hélder Jauana, teceu duras críticas ao seu próprio partido, desafiando-o a abrir-se “às vozes críticas” e a liderar uma transformação profunda em Moçambique. Jauana, que intervinha no painel dedicado à reflexão sobre os actuais desafios de Moçambique, apontou para a necessidade urgente de renovar a liderança política, combater o nepotismo, a tribalização da política e promover a independência económica, alertando que “mudar Moçambique é mudar o contexto de miséria e pobreza em que o país se encontra”.

“Este é o desafio de um líder. A quem eu busco que tenha a capacidade de ouvir, aprender e mudar o mundo. Mudar o mundo é mudar Moçambique no contexto que nós conhecemos. Um contexto de miséria, um contexto de pobreza, um contexto em que mesmo dentro do partido, este partido que celebra os sessenta e três anos, há luta de interesses, interesse de grupos e há assassinato de carácter entre os próprios membros, principalmente em períodos eleitorais”.

Para além de apontar os “assassinos de carácter” no seio da FRELIMO, o académico foi mais longe afirmando que no partido cargos importantes são maioritariamente por aqueles que têm posses financeiros.

“Onde a tribo que se diz foi combatida, a tribo é resgatada em todos os momentos eleitorais, com o discurso do viente, com o discurso de que este não é nosso e com o discurso de que quem paga mais coopta-se. Quer dizer, é o dinheiro que é mais importante para ocupar lugares”, afirmou, acrescentando que, sob ponto de vista representativa, alguns membros que se dizem ser do povo, não granjeiam a simpatias destes actores sociais.

“Se nós olharmos para a disposição dos órgãos da FRELIMO, vamos ver que do ponto de vista discursivo, dizemos que a FRELIMO é um partido de massas, um partido que tem campesinos”, lamentou Jauana.

O sociólogo defendeu ainda a necessidade de uma reforma de mentalidade, que qualificou como “a mais estruturante de todas”. Segundo ele, Moçambique não poderá avançar com líderes e técnicos “presos à lógica da repetição, da conveniência e da imobilidade”.

“Vivemos com muito medo do pensamento crítico. O maior perigo de qualquer que seja o líder é a qualidade dos assessores que se tem. Os assessores é que capturam os presidentes, capturam as lideranças, constroem um discurso de que há o nosso e há os outros, aqueles outros que são perigosos”, afirmou Jauana.

Num apelo directo ao partido, Jauana sugeriu uma inversão na composição dos órgãos dirigentes, propondo uma lógica de 80% de renovação e 20% de continuidade: “Não se trata de descartar os veteranos, mas de equilibrar com novas ideias e práticas”, sublinhou.

 

Cadeado exorta Frelimo a recuperar prestígio internacional através de comunicação assertiva

Jauana defendeu igualmente a nacionalização dos recursos minerais como passo essencial para alcançar a independência económica. O académico tomou exemplo concreto os distritos ricos em recursos, como “Namanhumbir (Cabo Delgado), onde crianças vivem em extrema pobreza:

“Não faz sentido um país com minerais tão importantes como o Rubis, uma criança de Namanhumbir, viver na miséria com barriga de fome. Quando falo de Namanhumbir, falo de outros distritos. Aquela criança devia ter um ensino primário com computador de início ao fim”,

Ainda no painel dedicado à reflexão sobre os actuais desafios de Moçambique, o académico Calton Cadeado defendeu que Moçambique deve recuperar a reputação que construiu durante e após a luta de libertação, altura em que a diplomacia moçambicana granjeou respeito internacional.

“Moçambique é um Estado com relevância nas relações internacionais, mas estamos a ter dificuldades em manter esse prestígio. Mesmo quando o seguimos, os seus sinais não são reconhecidos. Não basta fazer coisas boas — é preciso comunicá-las bem”, lamentou.

Para sustentar a sua tese, Cadeado lembrou que, nos primeiros anos enquanto País independente, a Frelimo  destacava-se pela sua capacidade de comunicação. “Houve acções bem feitas pela Frelimo e bem comunicadas. O prestígio da Frelimo era inquestionável, onde quer que os seus membros passassem”, recordou.

Indo mais longe, o académico defendeu que o Estado deve adoptar uma diplomacia do cidadão com vista a reconhecer o papel dos moçambicanos na diáspora com embaixadores do País, tendo dado o exemplo e Maria de Lurdes Mutola, considerada a melhor atleta moçambicana de todos os tempos, que é uma marca nacional.

 

Padre Couto defende a descentralização como caminho para  a unidade nacional

Por sua vez, o padre e professor moçambicano Filipe Couto defendeu que  a consolidação da unidade nacional como uma prioridade fundamental para o futuro do país. Numa altura em que Moçambique se prepara para celebrar os 50 anos da independência nacional, o religioso destacou que o desenvolvimento nacional deve ser o principal farol da coesão entre os moçambicanos.

Para o padre Couto, a concretização da unidade nacional passa, inevitavelmente, por uma descentralização efectiva e funcional: “Há uma coisa que se deve decidir: é a descentralização. Fala-se de descentralização, mas o que temos ainda é centralismo”, afirmou.

Segundo o académico, a descentralização não pode ser apenas retórica ou uma manobra político-administrativa. Deve implicar transferências reais de poder e recursos para os níveis locais, de forma a garantir que todas as regiões do país se sintam verdadeiramente incluídas no processo de construção nacional.

 

Padre Filipe Couto entende que, sem descentralização, o país continuará a enfrentar assimetrias regionais, exclusão política e desigualdade no acesso a oportunidades, factores que enfraquecem os laços de unidade nacional.

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