A (i)legitimidade dos ex-guerrilheiros da Renamo

OPINIÃO
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Alexandre Chiure

A Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), que, nas eleições legislativas e presidenciais de 2024, tornou-se na terceira força política do país com apenas 28 assentos, e o seu próprio presidente, Ossufo Momade, são casos de estudo.

Contrariamente ao que acontece com os outros partidos políticos, a Renamo discute os seus problemas, alguns dos quais sensíveis, em público. O normal é que sejam colocados e debatidos em fóruns próprios.

Os membros e os simpatizantes do partido não se importam de lavar roupa suja na comunicação social. Criticam-se e acusam-se frontal e mutuamente. Quando entendem, atacam o seu líder, e o líder ataca alguns quadros do partido também em público.

É um tipo de democracia estranha em que tudo acontece sem que haja o mínimo de preocupação da parte dos membros ou dirigentes a vários níveis em preservar a imagem da sua formação política, nem tão pouco o prestígio e a credibilidade perante o público. Cada um faz o que entender que deve fazer, como encerrar delegações da Renamo.

Ossufo Momade, que era suposto ter uma postura de Estado, quando entende faz acusações graves contra alguns dos seus quadros, através da imprensa. Discute assuntos melindrosos sobre a vida do seu partido em fóruns inapropriados.

Nos meados de Setembro último, o presidente da Renamo acusou, publicamente, Alfredo Magumisse e Elias Dhlakama, quadros seniores da perdiz, de apoiar os ex-guerrilheiros para o encerramento da sede nacional e das delegações políticas provinciais.

Aquando da sua reeleição para o cargo de presidente do partido, no congresso de Alto-Molocué, na Zambézia, o edil de Quelimane, Manuel de Araújo, saiu a público a fazer duras críticas a OM por aquilo que chamou de postura pouco combativa durante o mandato anterior em que perante deficiências e fraudes, nas eleições autárquicas, esteve mudo.

Esta semana, Alfredo Magumisse deu uma grande entrevista ao semanário “Evidências” em que, rebatendo as acusações do seu chefe, disse que tudo não passa de “pensamentos para o estômago”.

O ex-deputado da Assembleia da República não poupou críticas ao seu partido. Disse que a Renamo está estagnada e sem rumo. É verdade, mas não tem que ser ele a dizer isso. É um tipo de afirmações que não é  abonatório à imagem do seu partido. Não é normal estas palavras saírem da boca de um membro sénior sobre a sua própria formação política. É o mesmo que disparar contra o seu próprio pé.

Que democracia é esta que se pratica na Renamo em que não há disciplina partidária? Cada um, seja ele membro ou simpatizante, ex-guerrilheiro ou dirigente, diz o que entende que deve dizer. Os outros que se cuidem. É um caso de estudo como o é Ossufo Momade.

Faz tempo que o presidente da Renamo perdeu legitimidade para dirigir o partido por inoperância. Apesar da forte pressão interna exercida por ex-guerrilheiros para deixar o poder, ele está de pedra e cal. Não convoca a sessão do Conselho Nacional e tudo está parado.

OM já não é líder da oposição, mas ainda não entregou o património ao Estado, nomeadamente a casa, o gabinete e carros. A Renamo está praticamente paralisada, com a excepção da bancada parlamentar. A sede nacional desconectou-se da base.

Agora, os ex-guerrilheiros, que deviam ser motivo de orgulho para o partido, porque, apesar da crise prevalecente, continuam firmes e fiéis à Renamo, falam em criar uma comissão de gestão e reabrir as delegações como que a criarem condições para a organização do almejado Conselho Nacional. Ainda assim, o seu líder não diz nada. O silêncio é a sua principal arma.

É verdade que Ossufo Momade é responsável pela auto-destruição do partido da perdiz com a sua teimosia em não querer ceder à pressão para abandonar a liderança, mas há que reconhecer que os ex-guerrilheiros que hoje tentam destitui-lo são cúmplices desta situação.

Como é que se queixam hoje de OM se foram eles próprios que o apadrinharam e o ovacionaram no congresso de Alto-Molocué num processo que levou à sua reeleição como presidente do partido? Disseram que era a pessoa certa para continuar a dirigir os destinos da Renamo.

Houve oportunidade para a renovação da liderança. Não têm como se queixar. Só que no lugar de apostarem na renovação, votaram na continuidade. Os ex-guerrilheiros foram contrários a todas as tentativas de mudanças na liderança.

Quadros seniores do partido, com sede de mudanças dentro da Renamo, num total de dez, concorreram para a sucessão de OM na presidência. Foram, entre eles, Ivone Soares, Elias Dhlakama, André Magibire, Alfredo Magumisse, Juliano Picardo, Anselmo Victor e outros.

A candidatura de Venâncio Mondlane, que constava na lista, foi aquela que granjeou muitas simpatias do público que prometia votar em massa na “perdiz”, caso VM7 estivesse em frente. Mondlane foi visto como ambicioso e ganancioso e não como alguém que pudesse trazer uma nova dinâmica que se pretende. Os congressistas preferiram depositar confiança no OM e só hoje é que descobriram que cometeram um erro.

Leiam os estatutos e vejam o que é que dizem, o que se deve fazer numa situação destas em que o presidente do partido não quer convocar os órgãos internos do partido, não faz nada e não deixa fazer. Talvez não seja necessário encerrar delegações ou criar uma comissão de gestão, procedimentos ilegais, há uma outra forma eficaz de resolver o problema ou de obrigar OM a convocar o Conselho Nacional.

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