Nyusi chama Chissano, Hermenegildo Gamito e Castigo Langa de hipócritas

DESTAQUE POLÍTICA
  • É “ridículo” não concordar com o “Messias”
  • PR lançou uma reflexão, mas não está disposto a ouvir opiniões contrárias

Filipe Nyusi lançou, em Dezembro último, na casa do povo, uma reflexão e debate sobre a sustentabilidade ou não das eleições distritais a partir de 2024, no entanto parece que não está disposto a ouvir opiniões contrárias. Ao posicionamento do antigo estadista, Joaquim Chissano; do antigo presidente do Conselho Constitucional, Hermenegildo Gamito e do antigo ministro de Energia, Castigo Langa, que declararam não ver nenhum impedimento para a realização das eleições provinciais, respondeu de forma vil e sem contemplações. Chamou de “ridículo” defender a realização de eleições distritais a partir de 2024.

Reginaldo Tchambule

O Presidente da República, Filipe Nyusi, continua implacável na defesa do seu projecto pessoal que visa, a todo o custo, forçar uma revisão da Constituição da República para adiar as eleições distritais em 2024. Trata-se de uma reflexão que tem estado a defender desde 2021 e que já é vista nalguns corredores como uma estratégia que visa acomodar algumas alterações no texto constitucional que lhe possam conferir um terceiro mandato.

Depois de Joaquim Chissano, Hermenegildo Gamito e Castigo Langa, destintos membros do partido no poder, terem defendido não haver espaço para se rasgar um compromisso assumido e que está plasmado na Constituição da República, o Presidente da República mostrou-se irritado com a confrontação.

No dia em que empossou os novos secretários de Estado de algumas províncias, Filipe Nyusi não teve palavras a medir e rotulou de “ridículo” o posicionamento de quem se mostra contrário ao adiamento das eleições distritais.

“Lançámos um debate que corre em torno da nossa continuidade para os distritos, não dissemos que devia parar, dissemos que é preciso reflectir, apesar de que alguns nem querem reflectir, sobretudo por serem as mesmas pessoas que ontem nem aceitavam que as províncias fossem descentralizadas. É ridículo”, disse Nyusi, numa clara resposta a camaradas seniores do partido que colocam em causa a reflexão por ele lançada, oficialmente, a 20 de Dezembro, depois de meses de insistência intransigente no assunto.

Para Filipe Nyusi é uma espécie de hipocrisia os camaradas do partido criticarem o debate por si levantado, quando sempre se mostraram contra o processo de descentralização, que só foi possível no seu mandato.

Recorde-se que Joaquim Chissano, antigo Chefe de Estado, em entrevista ao Grupo Soico, disse não ver nenhum problema na realização das eleições distritais a partir de 2024. Aliás, disse claramente que não há motivos claros que impeçam que Moçambique possa avançar com este passo.

“São viáveis. Eu não vi nenhum impedimento para que as eleições tenham lugar daqui a mais um ano. Os órgãos e as estruturas devem ser respeitados. Já começaram a ser preparadas um pouco antes. O que eu desejo é sucesso àquelas instituições que foram designadas para a organização das eleições. Que o povo participe nelas conforme as condições que forem criadas. Não é cada um pensar nas suas próprias condições. Vamos fazer o jogo naquele campo, as balizas são iguais de um lado e de outro. Não é para perderem o jogo e depois dizerem que uma baliza era maior que a outra”.

Suspeita-se que pode estar em causa interesse do terceiro mandato

Seguindo no mesmo diapasão, Hermenegildo Gamito, antigo presidente do Conselho Constitucional, reagindo a proposta de Filipe Nyusi, que anunciou a criação de uma Comissão para uma auscultação pública sobre as eleições distritais de 2024, diz que não deve haver espaço para debater sobre uma questão que deve ser executada em cumprimento da Constituição da República.

Aliás, enfatiza que é incontornável e sentencia: “Está na Constituição. Façam-se as eleições como reza a Constituição”.

Já para Castigo Langa, antigo ministro e militante da Frelimo, as eleições distritais são um imperativo da Constituição da República, que deve ser seguida escrupulosamente. Castigo Langa foi quem em Setembro último, confrontou directamente Filipe Nyusi sobre a ideia de terceiro mandato e há receio que este debate vise essencialmente criar uma brecha para a revisão da Constituição e acomodar um terceiro mandato, através de uma eleição directa.

A ideia de revisão da Constituição vem sendo ensaiada desde 2021. O primeiro tiro deste debate foi dado por Celso Correia, em sede da quarta sessão do Comité Central da Frelimo realizada em Maio de 2021, quando defendeu pela primeira vez a inviabilidade daquela eleição.

Curiosamente, foi também na mesma sessão que foi levantada pela primeira vez a questão do terceiro mandato, quando Felizarda Paulino, membro do Conselho de Estado e antiga deputada da Frelimo, gelou a sala ao propor que Filipe Nyusi seja confiado mais mandatos até 2030.

Nyusi está irredutível e Assembleia da República agendou debate sobre o assunto

Ainda não foi indicada a composição da Comissão que vai se encarregar da reflexão em torno da viabilidade das eleições distritais em 2024, no entanto, a Assembleia da República já agendou o debate do tema na presente sessão.

O assunto consta como a 25.º matéria agendada da sétima sessão ordinária da Assembleia da República, a arrancar no dia 22 até final de Maio. Caso a matéria seja realmente debatida, haverá meio caminho andado para por ditadura da maioria a Frelimo declarar inviável o processo.

A posição do Presidente Nyusi, cujos interesses são questionáveis, tem estado sob forte contestação da oposição e da sociedade civil, mas ao que tudo indica, a decisão caberá tão somente aos deputados da Frelimo, com maioria qualificada.

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