Sucessão na Frelimo: último grito dos libertadores está ameaçado

DESTAQUE POLÍTICA

O processo em curso de sucessão de Filipe Nyusi na Frelimo, envolto ao silêncio e incógnitas, é provavelmente o último, em que “os libertadores”, ou seja, a geração de 25 de Setembro, estará com vigor para influenciar na conservação da utopia que norteou a independência. Em meio século (49 anos) da governação da Frelimo, este grupo encontra agora a resistência dos jovens, que pode ser consequência do seu erro em 2014, afinal, limitou os critérios do perfil para sucessor de Guebuza, a mero regionalismo e indicação de um filho de combatente, preterindo outros juízos para o conteúdo do cargo, o que é visto, em sectores conservadores, como o primeiro fracasso da tentativa da mudança geracional na Frelimo.

A idade não perdoa e os novos actores políticos também não. Se o tempo não permite que os veteranos tenham uma próxima vez para endossar ou influenciar a indicação de um candidato que lhes transmite conforto, os actuais donos do poder querem a todo custo evitar a influencia destes, relegando-os a um papel marginal. Em termos numéricos, os libertadores são relevantes para endossar, mas a sobrevivência dos candidatos no crivo dos membros do Comité Central, já não é determinada por estes, mas sim pelos mais jovens que tem um sentido de voto mais comercial e clientelista, ou seja, direcionado muitas vezes a quem pode pagar e não ao mais competente.

Por exemplo, a ACLIN, tem um peso de menos de 20% no Comité Central, mas, ao mesmo tempo, dependendo da dinâmica dos acontecimentos, estes assumem uma posição de força que, em tempos idos, já chegou a ser determinante neste tipo de processos, afinal, não se brinca com generais.

Como que a limitar a participação e influencia destes, os actuais donos da situação procuram contornar os históricos. A discussão tardia da sucessão na Frelimo comprimiu os espaços de debate sobre o perfil do candidato e reduziu a participação dos veteranos neste processo.

Lembre-se que na 19ª Sessão ordinária da Comissão Política, em Fevereiro, Alberto Chipande foi advertido que o tema não estava na agenda quando queria trazer a discussão da sucessão. Aquela não seria a primeira vez a Administração da Frelimo a relegar a estes veteranos um papel marginal, ao mesmo tempo que Nyusi impõe que o processo de escolha do seu sucessor decorra em “alinhamento com a direcção do partido”. O isolamento os veteranos, tidos como ala conservadora, se viu igualmente quando pediram a criação de um Conselho de Anciões no Congresso, que poderia servir de reserva moral tal como acontece no ANC e noutros movimentos políticos congéneres.

As consultas sobre as tendências, não significam participação, quando não permitem debate do tema. O Executivo de Nyusi foi marcado pelo abandono destes da vida política, alguns mesmo para não se misturarem a uma governação atabalhoada. O caso mais ilustrativo, foi a renúncia de Graça Machel do assento do CC, no XII Congresso, por não se identificar com a tendência dos valores da nova Frelimo.

Nesta quinta-feira, na reunião da ACLIN, a administração Nyusi tenciona trazer o debate da sucessão a porta fechada, que irá envolver apenas os velhos combatentes, sem incluir os filhos destes. Mas o debate chega tarde, e isto abriu espaço para proliferação dos candidatos, uma consequência da dispersão do tema e da banalização do cargo do Chefe do Estado.

Para uma geração que sempre esteve na linha de frente para influenciar tanto nas políticas publicas e principalmente nos processos de Administração da Frelimo, o isolamento representa marginalização e “angústia”, disse um veterano, advertindo-nos que “só valemos quando temos opiniões válidas, não por dever histórico. Mas quem ouve essas opiniões?”.

O silêncio ou silenciamento dos “madalas” agudiza-se num contexto em que a governação foi marcada de perseguição aos que pensam diferente e fechamos dos espaços de debate de temas candentes.

Num contexto de uma oposição sem expressão política para beliscar o poder da Frelimo na presidência, é seguro afirmar que o sucessor de Nyusi representa a última esperança para os poucos veteranos libertadores, ainda em vida, com a idade na orbita dos 70 a 80 anos dar o último grito. Não haverá mais uma década, nem um outro processo de sucessão onde estes terão o poder de dizer agora é a minha vez, como se viu com Alberto Chipande a dez anos atrás. Ou com Feliciano Gundane, que cogitou reivindicar a sua vez depois de Filipe Nyusi, mas questões de saúde não lhe permitem participar activamente do processo ora em curso.

Nem Alberto Chissano, Mariamo Matsinhe, Graça Machel, Guebuza, Óscar Monteiro, Rebelo, Gundane, Pachinuapa, Chipande (os últimos três em constantes queixas de saúde) entre outros nomes que configuram na lista dos antigos combatentes na primeira pessoa, terão o vigor e força física de influenciar na Frelimo um candidato revestido dos valores que constituem a base que a Frelimo foi perdendo.

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