- Não foi só uma saraivada de perguntas, havia recortes de lives e discursos
- Já foi constituído arguido, ficou apenas de saber da sua acusação
- O seu assessor e braço direito, Dinis Tivane, é ouvido esta quarta-feira e tudo pode acontecer
Com cabelo levantado como se tivesse visto um fantasma e cercado de homens grandes com coletes à prova de balas pretos, com a inscrição PGR ou polícia, Venâncio Mondlane, dava nas vistas, 10 horas depois de ter entrado pela portaprincipal da Procuradoria-Geral da República. Com a mesma tranquilidade que o caracteriza, mesmo diante de situações difíceis, o ex-candidato presidencial anunciou duas notícias, ou seja, que lhe foi administrado um Termo de Identidade e Residência como medida de coacção e que, afinal, o Ministério Público (MP) aceitou receber as suas denúncias e queixas submetidas contra personalidades e instituições a que acusa de violação dos direitos humanos e crimes eleitorais. Só não disse que, afinal, antes daquilo que chamou de saraivada de perguntas foi colocado a assistir aos vídeos com os seus próprios pronunciamentos, nos quais era solicitado a responder ao que queria, essencialmente, dizer
Evidências
Depois de muita especulação sobre a possibilidade de ter fugido do País, o ex-candidato Venâncio Mondlane apresentou-se, na passada terça-feira, para uma exaustiva sessão de perguntas e respostas na Procuradoria-Geral da República (PGR), acompanhado dos seus seguranças e assessores.
Sereno e brincalhão, Mondlane colocou-se à disposição da imprensa e ao seu estilo deixou claro que estava tranquilo. Mal pós os pés dentro do edifício da procuradoria, submeteu uma queixa-crime, em jeito de contra-ataque contra Daniel Chapo, a quem acusa de estar a incitar a violência, com o seu famoso discurso sobre “jorrar sangue” que, a seu ver, está a ser materializado na onda de assassinatos que se registam um pouco por todo o País.
Já no interior da sala do interrogatório, Venâncio Mondlane foi informado pela PGR que tinha sido constituído arguido. No entanto, estranhamente, não foram indicados os crimes de que é acusado, violando, assim, um direito que assiste a qualquer arguido.
Aparentemente, a PGR optou estrategicamente por não lhe dizer a razão pela qual estava a ser constituído arguido, para tentar encontrar algumas fragilidades no seu próprio discurso de modo a incriminá-lo ainda mais.
Evidências sabe, porém, que Venâncio Mondlane, através dos seus advogados, no fim protestou por escrito a este facto e pediu para que seu protesto fosse anexo aos autos, pois a lei obriga que o arguido conheça a acusação de forma a se defender.
Sem conhecer a acusação, o interrogatório foi conduzido de forma indiscriminada. Para além da famosa “saraivada de perguntas” como Venâncio Mondlane caracterizou o ambiente na sala durante 10 horas, Evidências sabe que o ex-candidato presidencial foi colocado a assistir a recortes de vídeos de suas lives e discursos públicos, antes de ser questionado sobre o que efectivamente queria dizer.
Entre os recortes que lhe fizeram assistir, consta um em que mobilizava as pessoas para se manifestarem pacificamente junto das CDE/STAE locais e ordenava o encerramento das sedes da Frelimo, o que viria a originar os incêndios a estes locais.
Foi-lhe perguntado sobre o que pretendia quando disse “se o CC não decidir sobre a verdade eleitoral, o país irá ao precipício”. A seguir vieram perguntas sobre as vandalizações de lojas e armazéns, como se o Ministério Público ainda estivesse a tentar consolidar a sua convicção sobre os crimes de desobediência civil, instigação à violência, entre outros, o que poderá se tornar num longo e tortuoso processo.
Uma saraivada de perguntas e vídeos que duraram quase 10 horas
O interrogatório durou quase 10 horas, porém, na saída o ex-candidato presidencial referiu que ainda desconhece os crimes pelos quais é acusado. Observadores em Maputo suspeitam que a PGR não tem o processo completamente formado e, que como estratégia, fez perguntas para o colocar num circo apertado.
“Foi um encontro normal. O único problema é que, curiosamente, não vos posso responder é o crime de que sou acusado. Infelizmente, ficámos todas essas horas e não consegui dizer qual o crime que me é imputado, mas me fizeram uma saraivada de perguntas que justificou esse tempo todo. Basicamente, são perguntas relacionadas às manifestações, incitação à violência, prejuízos à economia e todo tipo de distúrbio que teria sido causado pelas manifestações”, explicou, para depois revelar que deve comunicar às autoridades os seus movimentos dentro ou para fora do País.
“Foi-me aplicada uma medida sancionatória ou de limitação, que é o Termo de Identidade e Residência, o que significa que eu não me posso deslocar sem avisar a Procuradoria. Não posso ficar mais de cinco dias fora da minha própria casa”, revelou que apareceu mais serenado, ladeado por homens grandes da SERNIC, com máscaras e coletes à prova de bala pretos.
A vez de Dinis Tivane
Esta quarta-feira, o assessor e braço direito de Venâncio Mondlane, Dinis Tivane, é ouvido na Procuradoria-Geral da República, no Gabinete de Combate à Criminalidade Organizada e Transnacional GCCOT e tudo pode acontecer.
Conhecido pela forma agressiva com que lida com os processos e dossiers, Tivane está no radar na Procuradoria-Geral da República. A sua notificação foi recebida em mãos bem no dia em que Venâncio Mondlane estava a ser ouvido. Ele tinha ido à procuradoria acompanhar o seu “chefe”.
Inicialmente, a audição estava marcada para a passada sexta-feira, mas devido a viagem para Angola, em que acabou sendo impedido de entrar, juntamente com Venâncio Mondlane, acabou solicitando o seu adiamento para esta quarta-feira.
Não está claro de que crimes é acusado e se tem relação com o processo de seu “chefe”, contudo, vai responder no Gabinete Central de Combate à Criminalidade Organizada e Transnacional (GCCCOT).
Trata-se de um órgão subordinado do Ministério Público (MP) que exerce acção penal contra crimes relacionados com terrorismo, branqueamento de capitais, raptos, imigração ilegal, entre outros crimes relacionados com a segurança do Estado.

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