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- Valor gasto é superior ao que o Estado pagou a 1.760 funcionários públicos em 2023
Numa altura que enfrenta dificuldades na tesouraria, o Estado Moçambicano gasta anualmente 185 milhões de meticais para pagar salários de membros não-executivos nas empresas do Sector Empresarial do Estado (SEE). A Silos e Terminal Graneleiro da Matola (STEMA), Aeroportos de Moçambique (ADM), Linhas Aéreas de Moçambique, Portos e Caminhos de Ferro de Moçambique, EMOSE, entre outras, constam do rol das empresas participadas pelo Estado que pagam salários “chorudos” a membros não-executivos indicados a dedo pelo partido no poder. O Centro de Integridade Púbica (CIP), para além de defender o reforço os mecanismos de transparência nos processos de selecção e nomeação, de modo a que as nomeações para os órgãos sociais obedeçam a critérios de mérito e interesse público, recomenda ao Ministério da Finanças para um regulamento geral que estabeleça critérios claros para salários e benefícios no SEE e ao IGEPE para adoptar processos de selecção mais transparentes como concursos públicos, bem como estabelecer contratos-programa públicos, nos quais estará descrito o trabalho a ser realizado pelos membros não-executivos
Duarte Sitoe
A designação de membros não-executivos nas empresas do SEE, administradores não-executivos, membros do conselho fiscal, membros da assembleia-geral e da comissão de remunerações, está consagrada na Lei n.º 3/2018, de 19 de Junho, e no Decreto nº 10/2019 de 26 de Fevereiro, ambos que estabelecem os princípios e as regras aplicáveis ao SEE em Moçambique.
O Centro de Integridade Pública (CIP) reconhece que a existência dos membros não-executivos justifica-se por razões ligadas à fiscalização e supervisão da gestão executiva, garantindo-se que seja feita em conformidade com os interesses da sociedade e dos accionistas, e ao conhecimento e a experiência destes membros em outras áreas de Negócios, como Contabilidade e Auditoria, Gestão de Empresas e área jurídica, que podem revelar-se úteis para a empresa, ajudando na resolução de problemas.
No entanto, observa que algumas empresas acumulam prejuízos recorrentes devido aos elevados salários dos membros não-executivos nomeados que são, regra geral, figuras proeminentes do partido FRELIMO, que servem como uma espécie de olheiros e representantes dos interesses daquela formação política.
“A existência de figuras próximas ao partido no poder, Frelimo, nos órgãos não-executivos das empresas do SEE reforça as suspeitas de que o partido se tem servido do IGEPE para acomodar os seus interesses e dos seus membros e para reforçar o controlo e a influência sobre as empresas públicas (…) As nomeações de figuras políticas para os órgãos sociais das empresas do SEE além de ser um indicador de falta de transparência, representa riscos de financiamento político ilícito e deterioração das empresas, especialmente em períodos eleitorais, quando interesses políticos podem influenciar decisões administrativas e financeiras, afectando a governança e a sustentabilidade dessas empresas” , refere o Centro de Integridade Pública no seu mais recente relatório.
Os rostos da grande farra: Desde Mavie a Roque Silva
A título de exemplo, a Silos e Terminal Graneleiro da Matola (STEMA), que gastou 21.5 milhões de meticais em salários, até Dezembro de 2022 tinha cinco membros não-executivos, nomeadamente: Mariazinha Niquice – antiga secretária-geral da Organização da Mulher Moçambicana (OMM) e Gustavo Mavie – presidente da Comissão Central de Ética Pública (CCEP), proposto pelo partido Frelimo – como administradores não-executivos; Manuel Ribeiro Formiga – antigo presidente do Conselho Nacional da Juventude (CNJ) e membro do Comité Central da Frelimo, Alfredo Gabriel Luís Caetano Dias – membro do Conselho Superior da Magistratura Judicial eleito pela bancada da Frelimo e Guilherme Luís Mavila – antigo Ministro do Trabalho – como secretário da assembleia-geral, presidente da assembleia geral e presidente do conselho fiscal, respectivamente.
Por sua vez, a Hidroeléctrica de Cahora de Bassa (HCB), até ao final do exercício económico referente ao ano 2023, para além do saudoso Manuel Tomé, pagava salários de Roque Silva, antigo secretário-geral da Frelimo, como membro não-executivo, tendo desembolsado mais de 77 milhões de meticais em salários dos membros não-executivos.
O relatório e contas de 2023 dos Portos e Caminhos-de-Ferro de Moçambique, empresa que gastou 27,9 milhões de meticais em salários de membros não-executivos, aponta que o antigo Director da Coordenação Institucional e Marketing do Ministério da Economia e Finanças (MEF), Rogério Nkomo, ocupa o cargo de administrador não-executivo.
Na EMOSE, de acordo com o CIP, até finais de 2023 existiam cinco (05) membros não-executivos, nomeadamente dois (02) membros da assembleia-geral e três (03) membros do conselho fiscal. Víctor Bernardo, antigo Vice-Ministro da Planificação e Desenvolvimento do primeiro Governo de Armando Guebuza, e uma das figuras envolvidas no escândalo das dívidas ocultas ocupava o cargo de Presidente do Conselho Fiscal.
“A utilização de fundos públicos para subsidiar despesas de empresas pode significar um desvio de recursos que poderiam ser aplicados em sectores prioritários, como saúde e educação. A título de exemplo, parte dos montantes usados em subsídios empresariais em 2022 e 2023 teria sido suficiente para cobrir a dívida de 3,3 bilhões de meticais, relacionada ao pagamento de horas-extras aos professores, referentes aos anos de 2022 e 2023”, alerta o CIP.
Para além de defender o reforço os mecanismos de transparência nos processos de selecção e nomeação, de modo a que as nomeações para os órgãos sociais obedeçam a critérios de mérito e interesse público, aquela organização da sociedade civil recomenda ao Ministério da Finanças para um regulamento geral que estabeleça critérios claros para salários e benefícios no SEE e IGEPE para adoptar processos de selecção mais transparentes, como concursos públicos bem como estabelecer contratos-programa públicos nos quais estará descrito o trabalho a ser realizado pelos membros não-executivos.

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