Projecto de fábrica de cimento em Chibabava suscita dúvidas sobre legalidade e viabilidade

DESTAQUE POLÍTICA
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  • Shun Xin Yuan Africa Investment avança com lançamento de um empreendimento sem licenças
  • Governantes arrastados a participar em iniciativas estratégicas”, porém sem a devida validação técnica

 O distrito de Chibabava, na província de Sofala, prepara-se para acolher, esta quinta-feira, 9 de Outubro, uma cerimónia oficial de lançamento da primeira pedra de uma alegada fábrica de cimento, promovida pela empresa Shun Xin Yuan Africa Investment, Lda. O evento contará com a presença de autoridades governamentais, incluindo membros do Executivo central, num acto que tem sido apresentado como um marco estratégico para o desenvolvimento industrial da região. No entanto, informações recolhidas junto de fontes locais e familiarizadas com o projecto denunciam que o envolvimento de altos dirigentes estatais é parte de uma estratégia de conferir legitimidade institucional a empreendimentos que ainda não têm bases sólidas para avançar, criando a percepção de progresso e de confiança perante potenciais investidores e a opinião pública. Afinal, até aqui a empresa ainda não tem “validação técnica, licenciamento legal ou garantias de investimento reais”, estando ainda com conflito com as comunidades que acolhem o projecto.

 Evidências

A iniciativa, apresentada como um investimento industrial destinado a impulsionar o desenvolvimento económico de Chibabava, contrasta com a legalidade que devia acompanhar o processo. Diferentes fontes indicam que a empresa promotora não dispõe, até ao momento, de licença ambiental, concessão mineira ou plano de reassentamento para as famílias que vivem na área identificada para a implantação da unidade fabril — requisitos legais indispensáveis para projectos deste tipo em Moçambique.

A inexistência de uma licença ambiental emitida pela Agência Nacional para o Controlo da Qualidade Ambiental (AQUA) ou de uma autorização de exploração mineira compromete a legalidade do projecto desde a sua origem. Essas licenças são obrigatórias antes do início de qualquer actividade industrial que envolva a extracção e transformação de recursos naturais, como é o caso da produção de cimento.

Além disso, a falta de um plano de reassentamento, documento que deve garantir compensações e condições dignas às famílias afectadas, coloca em causa os direitos das comunidades locais. Em Nhango e Casa Nova, localidades abrangidas pelo projecto, moradores relatam que foram informados informalmente de que teriam de abandonar as suas machambas, sem qualquer explicação detalhada ou garantia de compensação.

“Vieram apenas dizer que teremos de sair porque vai haver uma fábrica. Não sabemos quando, nem para onde iremos, nem quanto nos será pago”, contou um residente local.

Fontes próximas ao processo indicam que a Shun Xin Yuan Africa Investment, Lda não teria, até ao momento, apresentado provas de capacidade financeira para sustentar o investimento. O projecto, segundo as mesmas fontes, não conta com garantias bancárias, estudos técnicos validados ou parceiros de financiamento identificados.

A mesma fonte alerta que, nestas circunstâncias, o risco de especulação é elevado. Em alguns casos, projectos anunciados sem base técnica ou financeira acabam por servir como instrumentos de valorização artificial de activos, usados posteriormente para negociar ou revender participações a investidores externos.

“É essencial que qualquer investimento de grande escala seja acompanhado de estudos de viabilidade, garantias financeiras e respeito pelas normas ambientais e sociais. Caso contrário, corremos o risco de transformar cerimónias públicas em meras encenações de investimento”, observou a fonte que denuncia interesses ocultos por detrás do lançamento.

Governantes arrastados para lançar uma empresa “fantasma”?

Segundo fontes próximas do processo, os promotores do projecto não têm capital, nem estudos técnicos, nem garantias de financiamento. O verdadeiro objectivo seria simular um investimento industrial para criar a ilusão de um negócio promissor e, em seguida, tentar vender o projecto a investidores reais.

“Tudo não passa de um exercício de marketing fraudulento. Eles querem as fotografias, os discursos e as manchetes para depois negociar o projecto no mercado como se fosse um investimento já em curso”, revelou uma fonte ligada ao sector empresarial.

Apesar das irregularidades apontadas, a fonte garante que o evento em Chibabava deverá contar com a presença de várias figuras do Governo, incluindo o ministro da Economia, Basílio Muhate, o que levanta preocupações sobre o nível de verificação prévio realizado antes da mobilização das entidades públicas.

O episódio, de acordo com a fonte, revela falhas nos mecanismos de verificação institucional e controlo de projectos privados, num contexto em que o Estado é frequentemente chamado a participar em iniciativas apresentadas como estratégicas, sem a devida validação técnica.

“Quando o Estado é envolvido em projectos que não cumprem a lei, a credibilidade institucional é posta em causa. É fundamental assegurar que a participação pública se baseie em informação verificada e transparente”, explicou a fonte.

Enquanto isso, as comunidades de Nhango e Casa Nova aguardam esclarecimentos sobre o futuro das suas terras e das suas casas. Para já, permanece a incerteza sobre se a prometida fábrica de cimento representa um passo real para o desenvolvimento industrial de Chibabava, ou apenas mais um episódio de promessas não concretizadas.

Shun Xin Yuan Africa Investment, Lda é uma empresa com mais de dez anos de presença no mercado nacional, com registo de actuação sobretudo no sector mineiro e em iniciativas pontuais de prospecção de recursos. Apesar do tempo de existência, a empresa não é conhecida por possuir investimentos de grande dimensão ou projectos industriais concluídos no país. O empreendimento anunciado para o distrito de Chibabava, uma alegada fábrica de cimento, surge, por isso, como o primeiro projecto de envergadura associado ao seu nome, levantando expectativas, mas também dúvidas quanto à sua real capacidade técnica e financeira para concretizar uma iniciativa dessa escala.

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