Operadores que não cumprirem 80% dos critérios de avaliação não serão licenciados

ECONOMIA
  • Imede Falume lança um aviso à navegação
  • DINAF vai interditar emissão de licenças e formalizar banimento de operadores paralisados na avaliação de 2021 e nos anos anteriores
  • Governo acaba com autorização que permitia circulação ilegal do Nkula

O sector de florestas está a passar por um importante processo de reforma legislativa e tecnológica que cauciona maior segurança na gestão de recursos faunísticos. Uma das inovações é o Sistema de Informação Florestal (SIF), uma ferramenta que, segundo o director Nacional de Florestas, Imede Falume, permite centralizar a informação florestal de modo a permitir aos gestores do sector a tomada de decisão de forma consolidada e precisa. Embora reconheça o atraso no desembolso do valor dos 20% que anualmente deve ser alocado às comunidades nativas, Falume nega que esse factor contribua para que as comunidades cooperem com operadores furtivos na devastação das florestas. Na entrevista que se segue, o nosso interlocutor revelou que o governo interditou a recolha de madeira supostamente abandonada, que facilitava a circulação da espécie Nkula de forma ilegal. Nas entrelinhas, revela que, a partir do próximo ano, os operadores que não cumprirem 80% dos critérios de avaliação não serão licenciados para a actividade.

Duarte Sitoe

Evidências – Visando reduzir a circulação de documentos falsos na exploração dos recursos florestais no país, o Ministério da Terra e Ambiente, através da Direcção Nacional de Florestas (DNAF), lançou, em Março do ano em curso, o Sistema de Informação Florestal (SIF). Qual é a avaliação que faz dos primeiros meses deste instrumento?

Imede Falume – O Sistema de Informação Florestal (SIF) é uma ferramenta de tecnologia de informação que integra todos os processos administrativos vinculados ao sector florestal, possibilitando a gestão mais transparente em todos os níveis de funcionamento. Os objetivos específicos da ferramenta são de assegurar e garantir a uniformização e alinhamento dos processos operativos de gestão florestal, promover a garantia no cumprimento da legislação e centralizar a informação florestal de modo a permitir aos gestores do sector a tomada de decisão de forma consolidada e precisa.

A campanha florestal iniciou recentemente, praticamente já temos o sistema instalado em todas províncias e já foram emitidas as primeiras licenças de exploração utilizando o sistema.

Um dos grandes calcanhares de Aquiles do sector das florestas é o contrabando. Até que ponto o Sistema de Informação Florestal (SIF) pode reduzir este fenómeno?

Toda informação de gestão florestal estará registada no SIF, desde o licenciamento da madeira até a exportação, passando pelo processamento. Isto vai permitir que os técnicos do sector possam consultar informação em tempo real sobre a exploração, transporte e mesmo sobre a exportação.

O SIF cria um centro de dados nacional sobre o patrimônio florestal moçambicano e sua gestão nos regimes previstos na legislação vigente. Este sistema permite ao sector uma interação mais ágil entre a gestão administrativa central, sob o mandato do Ministério da Terra e Ambiente através da Direcção Nacional de Florestas, e as províncias. Os usuários provinciais abrangem os Departamentos de Florestas e Plantações Agroflorestais dos Serviços Provinciais do Ambiente, incluindo usuários da Agência de Controlo de Qualidade Ambiental (AQUA), com funcionalidades até o nível da mais alta autoridade de governação. 

Em que consistiu a avaliação dos operadores florestais realizada em 2021?

– O Governo, através do Projecto Moz Fip, realizou, em 2021, a terceira Avaliação dos Operadores Florestais e a avaliação da Governação Florestal na província da Zambézia. O trabalho foi realizado pelo Ministério da Terra e Ambiente, em colaboração com o apoio do FNDS, Banco Mundial, WWF e o Fórum Nacional de Florestas.

O trabalho de campo decorreu entre os dias 19 e 29 de Novembro e incluiu a consulta dos arquivos dos DFPAF; visitas a sede da empresa, do parque industrial e a floresta, o que permitiu recolha de dados e evidências relativas a exploração florestal, silvicultura e comunidades locais, para além de registo de coordenadas nas áreas de corte e em outros locais relevantes. Foram elaboradas fichas de avaliação digital e introduzida a componente de georeferenciamento. Participaram 46 equipas de avaliação, num total de 115 pessoas, das quais 56% provenientes do Estado, 27% das ONGs, 16% dos Mídias e 1 % da academia.

A partir do próximo ano só serão licenciados operadores com mais 80% na avaliação

Alguns operadores florestais fecharam portas à avaliação, enquanto outros simplesmente não cumprem com as regras de maneio. O que será feito destes?

O relatório da avaliação dos operadores recomenda o seguinte: o cumprimento dos critérios de avaliação estabelecidos no quadro legal; apoiar e incentivar os operadores com pontuação igual ou superior a 80 pontos a atingirem a classificação máxima de 100 pontos; e os operadores com classificação entre 50 e 80 pontos a atingirem pontuação maior que 80 pontos dentro de um ano, prestando maior atenção aos critérios de Silvicultura, Processamento de madeira e Força de trabalho e às províncias de Niassa, Cabo Delgado e Inhambane por terem observado a pontuação mais baixa.

Vamos igualmente estabelecer o cumprimento de pelo menos 80% dos critérios de avaliação como condição para o licenciamento dos operadores no próximo ano e passar paulatinamente essa exigência para 100% nos anos subsequentes, analisar as razões que levam os operadores a um alto grau de incumprimento de boas práticas florestais (pontuação inferior a 50) e em função dos resultados da análise, interditar a emissão de licença ou cancelar os seus contratos e formalizar o cancelamento de contrato de operadores paralisados na avaliação de 2021 e nos anos anteriores, observando a questão dos direitos adquiridos pelos operadores, onde for aplicável.

Um dos grandes constrangimentos tem sido o fraco maneio florestal. Neste momento, em que estágio se encontra o Programa Nacional de Reflorestamento?

IF – Com o programa Nacional de reflorestamento foram reflorestados cerca de 17.020 hectares, com perspectiva de atingir a cifra de um milhão de hectares, que foi o compromisso assumido pelo país no AFR100. Esta é a contribuição das comunidades locais, escolas e empresas madeireiras, que têm estado a reflorestar maioritariamente com espécies nativas.

As empresas florestais e alguns singulares que usam apenas espécies exóticas para o reflorestamento, contribuíram com 51.758,43 hectares plantados. As actividades de reflorestamento continuam em coordenação com organizações não governamentais, comunidades e outros parceiros. A aquisição e distribuição dos insumos para o reflorestamento está dependente de desembolso de fundo dos projectos ao nível das províncias.

Governo acaba com autorização que permitia circulação ilegal do Nkula

Houve suspensão da tramitação de pedidos em novas áreas para a exploração florestal. O que se pode esperar?

Na verdade, o Diploma 25/2020 de 5 de Maio suspende a tramitação de novos pedidos de área por um período de dois anos, para permitir a reorganização do sector.

Há espécies de madeira consideradas de primeira classe que estão sob pressão e com ameaça de extinção que continuam a ser abatidas. Quais são os mecanismos levados a cabo para proteger estas espécies?

Há muito que está a ser feito. O Diploma 10/2016 de 7 de Janeiro interdita a exploração de Pau-ferro por um período de cinco anos, e temos estado a intensificar a fiscalização e frustrar as intenções dos prevaricadores.

Ademais, a espécie Nkula foi classificada como preciosa e foi interdita a sua exploração, uma vez que, de acordo com o último inventário florestal realizado em 2017, não existem no país volumes que permitam uma exploração sustentável desta espécie. Paralelamente, a espécie passou a fazer parte da CITES. Foi também interdita a recolha de madeira supostamente abandonada, que na verdade facilitava a circulação de madeira ilegal.

Comunidades colaboram com furtivos devido a pobreza

O diploma Ministerial 93/2005 defende que a população deve receber de três em três meses a taxa dos 20%, mas há zonas que, desde 2019, reclamam o pagamento da taxa em alusão. Em que estágio se encontra o pagamento das taxas relativas aos anos de 2020 e 2021?

O atraso do recebimento dos valores dos 20% pode estar relacionado a diversos factores, dentre os quais a falta de identificação das comunidades e inexistência de fundos monetários para a legalização dos comités de gestão e posterior abertura de contas bancárias.

Há também casos de comités de gestão que têm contas encerradas por falta de valores mínimos para a manutenção das mesmas, bem como contas cativas por falta de movimentação das mesmas, pois há comunidades que retiram todo valor e não movimentam mais as contas ao longo do ano. Outro factor, não menos importante, é a disponibilização tardia dos valores por parte das finanças para posterior canalização.

A demora na canalização dos 20% não estará a contribuir para que as comunidades cooperem com operadores furtivos?

Tem havido, de facto, denúncias ou referências de casos desta cooperação das comunidades com os exploradores ilegais de madeira, contudo, não podemos associar este facto ao atraso da entrega dos valores dos 20%.

Existem outros factores que podem estar associados, tais como a pobreza generalizada das comunidades; falta de projectos de geração de rendimento, tanto com o valor dos 20%, bem como com apoio de outras fontes de financiamento; baixa capacidade de negociação com os investidores acerca do cumprimento das obrigações sociais por parte dos investidores.

Há também relatos de Comités de Gestão que facilitam o abate e contrabando de espécies florestais. Quais são os planos da DINAF para mitigar esse fenómeno?

Temos que continuar com as capacitações em matéria de gestão dos recursos naturais e campanhas de sensibilização das comunidades locais para que percebam a importância da conservação e uso sustentável dos recursos naturais, devendo ser elas as primeiras fiscalizadoras da exploração dos seus recursos.

O que está sendo feito para mobilizar os mesmos a serem os olhos do Governo e denunciarem abates descontrolados das árvores?

O Sector de Florestas desenhou projectos de restauração florestal cujo objectivo é de capacitar as comunidades locais a produzirem o mel e combustível lenhoso de forma sustentável, para além da produção de mudas, para que possam conservar a floresta e ao mesmo tempo aumentar a receita familiar. Os projectos foram submetidos aos doadores e aguardam pela disponibilização dos fundos.

Um estudo recente aponta que urge a formação das comunidades sobre matérias de gestão de recursos naturais. Quais são as acções levadas a cabo para formar a população em matérias de gestão?

Temos levado a cabo cursos e capacitação em matérias de legislações ligadas à gestão dos recursos naturais, Cursos de gestão de pequenos projectos de geração de renda, que culmina com a formação de grupos de interesse; Visitas de trocas de experiência entre as comunidades, de forma a acolherem as boas práticas; Encontros de negociação com os bancos para facilitação de abertura e manutenção das contas bancárias; Coordenação com os serviços de identificação civil para facilitação da obtenção dos B.I. na zona de residência das comunidades e Revisão da legislação relativa ao Decreto 93/2005 sobre os mecanismos de canalização dos 20% às comunidades locais.

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