Não há como escapar da criminalidade do Estado

DESTAQUE EDITORIAL

A má reputação na administração pública está sendo normalizada e por isso está cada vez mais a encontrar terreno fértil para se reproduzir, o que denuncia que o comportamento das autoridades públicas está longe de se basear em princípios éticos, e isto ocorre devido a falta de preparo dos funcionários, cultura equivocada e, especialmente, por falta de mecanismos de controlo. A justificação coloca-nos sempre como vítimas e nunca como cúmplices, afinal queremos ser servidos sem comparticipar na reconstrução de uma sociedade justa, só porque tememos sacrifícios e quaisquer outras mudanças.

Somos, de facto, vítimas de um sistema construído em nome de um colectivo, mas conduzido por pessoas sem consciência de responsabilidade colectiva e bem comum. E agora é assustador porque, se antes estas pessoas assistiam o povo a sucumbir sempre que se solicitava um serviço público, agora saíram à rua para nos saquear, mostrando que, afinal, não há receita para contornar a criminalidade do Estado. É uma declaração em voz alta, para que todos saibam que a criminalidade que prospera nas zonas periféricas só consegue porque tem o apadrinhamento de quem devia combatê-la, replicando o que se assiste na Administração pública a nível mais alto.

Quando não são os funcionários a roubar o material de trabalho, como se viu na UP, são os membros do SERNIC envolvidos em raptos ou são os membros da PRM surpreendidos a roubar gado e enterrados vivos na Manhiça, e daqui da base seguem os exemplos que não deixam de ser replicados no topo, ou vice-versa.

Afinal, quais seriam as motivações? A cultura do roubo? O custo de vida que aumentou em mais de 100% e o salário em 5%? A máxima de que o cabrito come onde está amarrado? Ou simplesmente reflexo de uma sociedade distorcida e sem mínima vontade de resgatar os seus valores, como se viu recentemente na educação, quando a própria ministra, que devia ser a primeira a se demitir, renova as forças e aparece às câmaras para sacrificar os bodes expiatórios?

Mas, se já não constitui um crime moral ser representado por um Chefe de Estado associado a crimes que lesaram a pátria e nem com isso se incomoda, quando seu homólogo na África do Sul, na primeira oportunidade que é associado com a corrupção despe-se do poder e entrega-se para explicar qualquer acusação, o que vamos esperar da polícia, da ministra ou daquele enfermeiro que assiste, insensível, às mulheres que aos gritos dão a luz num corredor implorando por uma assistência que nunca chega.

Não seria tolerância a pessoas de um perfil como este, uma normalização explícita de ser conduzidos por pessoas sem ética pública?

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