Tribunal Supremo mantém sentença do assassino de Valentina Guebuza

POLÍTICA
  • Quatro anos depois de recurso, última instância desperta do profundo sono 
  • Zófimo Armando Muiuane deve cumprir a pena máxima

Zófimo Muiane foi condenado pela 10 secção Criminal do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo a uma pena de 24 anos de prisão e 50 milhões de meticais de indemnização pelo assassinato da esposa, Valentina Guebuza, filha do ex-Presidente, Armando Guebuza, em Dezembro de 2016. A sentença foi proferida em 2018, e não satisfeito, Muiuane recorreu ao Tribunal Superior de Recurso de Maputo (TSRM), onde, sem alteração de pena unitária, veio a ser reduzida a multa indemnizatória de 50 milhões para 250 mil meticais. E mais uma vez inconformado, recorreu ao Tribunal Supremo (TS), que veio a confirmar o decidido pelo TSRM e condena “o arguido Zófimo Armando Muiuane (…) na pena unitária de 22 anos de prisão e 2,7 milhões meticais de indemnização a herdeira preferencial da vítima”.

Evidências

Foi no Tribunal Judicial de Maputo, em 2018, que a juíza do processo 145/2018, Flávia Mondlane, afirmou que ficou provado durante o julgamento que Zófimo Muiane, 44 anos, matou deliberadamente a esposa (Valentina Guebuza), na altura com 36 anos, com um tiro no tórax e outro no abdómen, no quarto da residência do casal, no bairro da Polana Cimento, coração da capital moçambicana.

Além de homicídio qualificado, o réu foi condenado por violência psicológica, falsificação de documentos de identificação e uso indevido de arma de fogo.

Na altura, o Tribunal excluiu a hipótese de acidente, quando Zófimo Muiane declarou-se sempre inocente, alegando que Valentina Guebuza perdeu a vida durante uma disputa pela pistola que a vítima terá arrancado da cintura do marido para o expulsar de casa sob ameaça. “Tudo o que disseram é fabricação”, afirmou Muiane na última sessão.

O tribunal apontou como situações agravantes o facto de o arguido não demonstrar arrependimento durante o julgamento e não ter colaborado com a Justiça.

Depois da sentença, Muiane recorreu ao Tribunal Superior do Recurso de Maputo, onde viu reduzida e multa indemnizatória de 50 milhões para 250 mil meticais, e ainda alterada a qualificação jurídica do crime de falsificação do documento autêntico ou que fazem prova plena para o crime de falsificação de documentos particulares, modificando a pena para dois anos e um ano de multa à taxa diária de 5 % do salário mínimo, mantendo, todavia, a pena unitária de 24 anos de prisão maior.

Não se contentando, recorreu ao Tribunal Supremo, que veio a responder quatro anos depois.

No seu acórdão, o TS ratifica que o recorrente arguido (Zófimo Muiane) cometeu o crime de homicídio qualificado, sustentando esta tese, em primeiro lugar, com as declarações prestadas pela ajudante de campo, de nome Raquel João Martins Alves, e pela babá da filha do casal, de nome Regina Alexandre Mucavele, pois a primeira disse ao Tribunal que quando questionou ao réu pelos motivos que o levaram a proceder daquela forma, segundo ela, este limitou-se a responder “já fiz, já fiz”, e quando questionada pela segunda, esta disse que o aqui recorrido respondeu “me ofendeu muito, em frente dos padrinhos”.

O Tribunal Supremo refere, por outro lado, que, em primeiro lugar, “há que perceber que estas são apenas declarantes, não são testemunhas, não estiveram e nem presenciaram os factos que ditaram a morte da vítima, tendo apenas aparecido pouco tempo depois dos factos terem ocorrido e juram ao Tribunal que ouviram o recorrente confessar os factos”, apontando que, em segundo lugar, “há que interpretar esses factos ditos naquela emoção perante o sofrimento de um cônjuge e desespero do próprio aqui recorrente, quantas vezes por misericórdia ou por puro desespero nos responsabilizamos por algo que não somos completamente culpados”.

Em relação a confissão, o TS aponta que no regime da confissão do Recorrente arguido a Lei despreza quando esta não é acompanhada de outros elementos de prova. Aliás, o TS lembra que os declarantes eram subordinados à vítima e não se podia dar relevância aos depoimentos dos mesmos.

“Ademais, os declarantes se encontram no regime de simples apreciação de prova, o que quer dizer que o tribunal pode ou não se vincular ao que eles dizem, mas no caso em concreto, ainda que provado este facto, o tribunal, na sua livre apreciação de prova, não devia dar relevância a estas declarações feitas em momentos de excitação e emoção, no âmbito da livre apreciação de prova e de pessoas que eram muito chegadas a vítima, aliás, ainda que trabalhassem para o casal, elas estavam completamente subordinadas à vítima”.

O Tribunal Supremo lembra ainda que os argumentos aduzidos em relação às declarações da ajudante de campo e da babá, assim como dos agentes da PRM, não podem ser usadas como provas, tendo explicado que “o Tribunal, ao ajuizar um caso concreto, deve fazer uma crítica em relação aos elementos que colhe do processo, pois como se explica que, não passando muito tempo depois da ocorrência dos factos, alguns polícias se recordam exactamente das declarações do aqui Recorrente e outros não só se recordam, como não o ouviram dizer nada”.

Apreciadas estas e outras matérias que constam do acórdão de 39 páginas, o TS decidiu “revogar o acórdão recorrido no referente à condenação do arguido como autor do crime de falsificação do documento”, porém “manteve a pena parcelar do crime de homicídio e de armas proibidas para 22 e 10 anos, respectivamente”, e “condena o arguido Armando Muiuane, já identificado nos autos, a pena unitária de 22 anos e em 2.7 milhões de meticais de indemnização a herdeira preferencial da vítima”.

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