INATRO continua preso no sistema analógico, favorecendo práticas corruptas

DESTAQUE POLÍTICA
  • Longas filas, corrupção e queixas de mau atendimento
  • Tratar Carta de Condução tem sido um autêntico martírio no INATRO da Matola
  • Utentes reclamam da morosidade dos processos naquela instituição chancelada pelo MTC
  • INATRO promete se pronunciar sobre o assunto

Numa altura em que o grosso das instituições públicas apostam na inovação para evitar longas filas na prestação de serviços, o Instituto Nacional dos Transportes Rodoviários (INATRO), sobretudo a delegação da província de Maputo, prefere assobiar para o lado. Os moçambicanos que se fazem à delegação provincial do INATRO, na Matola, estão agastados com o modus operandi daquela instituição chancelada pelo Ministério dos Transportes e Comunicações devido a morosidade nos processos, o que de certa forma acaba provocando enormes filas, em meio a queixas de mau atendimento, corrupção e favorecimento de estrangeiros. Contactada pelo Evidências, a instituição responsável pela emissão de Cartas de Condução em Moçambique prometeu se pronunciar sobre o assunto nesta segunda-feira, 07 de Novembro, no entanto, até ao fecho desta edição, a instituição não cumpriu com a sua palavra.

Duarte Sitoe 

Em plena era digital, o Instituto Nacional dos Transportes Rodoviários continua aconchegado na era analógica, apesar dos enormes investimentos que têm sido anunciados para modernização do seu sistema.

Os utentes que se fazem àquela instituição ao nível da Província de Maputo queixam-se de maus tratos, obrigados a cumprir enormes filas para no final de tudo receberem a mensagem “volta amanhã ou na próxima semana”.

O modus operandi daquela instituição subordinada ao Instituto Nacional dos Transportes e Comunicações inquieta sobremaneira os utentes que, por sua vez, entendem que o Governo deve urgentemente criar inovações para melhorar os serviços prestados por aquela instituição.

Marcelo Muianga, residente do bairro Djuba, no posto administrativo da Matola Rio, teve êxito nos exames teórico e prático, mas quando chegou a vez de tratar a Carta de Condução deparou-se com uma fila enorme e precisou de mais de uma semana de idas e voltas sem sucesso. Agastado com o modus operandi no INATRO ao nível da Província de Maputo, a fonte aponta que o Governo deve urgentemente reformar o sector dos transportes para o bem do cidadão.

“É lamentável o que está a acontecer nesta instituição. A pandemia da Covid-19 trouxe uma série de inovações que foram abraçadas por algumas instituições públicas e privadas, mas o Instituto Nacional dos Transportes Rodoviários preferiu continuar parado no tempo. É inadmissível o que está a acontecer nesta instituição, são longas filas, mas no final de tudo inventam desculpas sem nexo para não nos prestar serviços”, declarou Muianga.

A fonte fala de uma série de irregularidades que acontecem naquela instituição subordinada ao Ministério dos Transportes e Comunicações, dentre as quais mau atendimento, para que uma vez cansados os utentes adiram a um esquema de extorsão supostamente instalado naquela delegação.

“Fomos atribuídos referências para fazer depósito com vista a ter a Carta de Condução, mas quando vamos ao banco constatamos que o sistema atribuiu o mesmo número de referência a mais de duas pessoas. Para além disso, pode-se perceber que o grosso dos funcionários daquela instituição faz de tudo para extorquir o cidadão que se faz àquela instituição para tratar aquele documento indispensável para circular ao volante nas estradas moçambicanas”.

Os estrangeiros são priorizados em detrimento dos nacionais 

Laura Marrengula, residente do Bairro de Matlemele, madrugou na esperança de ser uma das primeiras a ser atendida no Instituto Nacional dos Transportes Rodoviários da Matola, mas debalde as suas aspirações viram-se goradas, uma vez que só foi atendida depois do meio dia e a resposta que teve não foi satisfatória.

“Depois de ultrapassar o exame teórico, achava que não teria problemas para ter a Carta de Condução, mas quando cheguei ao INATRO percebi que estava enganada. Madruguei na esperança de ser a primeira a ser atendida e posteriormente ir ao trabalho, mas, infelizmente, fiquei até as 14H para receber a resposta de que devo voltar na próxima semana. Aquilo foi um balde de água fria para as minhas aspirações, porque esperava sair dali com a carta provisória. Mas tal não veio a acontecer por motivos que até hoje me custam entender. Pedimos a quem de direito para melhorar esta instituição, não podemos continuar na era analógica enquanto os outros estão a inovar”, lamentou.

Uma outra situação que inquieta os cidadãos que se fazem ao Instituto Nacional dos Transportes Rodoviários é a priorização dos estrangeiros, sobretudo de cor branca, em detrimento dos nascidos na Pérola do Índico, supostamente devido a um esquema de facilitação em troca de dinheiro.

Mas também, geralmente estes vêm com angariadores já conhecidos na instituição, que chegam, entram e conversam com funcionários coniventes e em pouco tempo os estrangeiros cuja regularidade da sua permanência no país é até duvidosa são atendidos.

Quem não esconde a frustração por ver os estrangeiros “furarem” a fila é Fabião Langa, que no dia em que a nossa equipa de reportagem esteve no local foi uma das primeiras pessoas a chegar ao INATRO da Matola.

Debaixo de um calor intenso, com a testa a brilhar e os poros completamente fundidos pelo suor que lhe escorre pelo corpo todo, Fabião diz que ficou agastado quando viu um cidadão asiático e um português, recém-chegados, a serem atendidos antes dele.

“Continuamos a ser escravizados na nossa própria terra. Vencemos o colonialismo com a proclamação da independência nacional, mas o colono continua a reinar no nosso país. Fomos os primeiros a chegar, mas os estrangeiros são os primeiros a serem atendidos. Não levam nem sequer 30 minutos. Os nossos irmãos que trabalham nas instituições públicas devem perceber que essa terra é de cada moçambicano. Não se justifica ignorar o dono da terra e priorizar o estrangeiro, porque já não estamos na época do colonialismo”, desabafou.

Na opinião de Langa, ao invés de agravar as taxas, o Governo devia se preocupar em melhorar os serviços prestados pelo Instituto Nacional dos Transportes Rodoviários.

“A taxa de emissão e renovação da Carta de Condução subiu de 500 para 2500 meticais, mas até aqui não vimos nenhuma melhoria. O Governo deve urgentemente melhorar os serviços prestados pelo INATRO. O Registo Criminal adoptou uma série de inovações para satisfazer o utente, mas quando olhamos para o sector dos transportes percebemos que estamos a regredir. Temos que, urgentemente, mudar de paradigmas”, disparou.

Provedor da Justiça defende uso de TICs para reduzir aglomerados 

A preocupação dos utentes é já do conhecimento do provedor da Justiça, Isac Chande, que durante o seu informe anual ao parlamento avançou que há uma necessidade de se potenciar as tecnologias de informação com vista a evitar grandes aglomerações que ainda se fazem sentir na emissão daquele serviço.

Chande considera que o Instituto Nacional dos Transportes Terrestres deve urgentemente seguir os passos da Direcção Nacional de Identificação Civil, que aumentou a capacidade na produção de Bilhetes de Identidade e expandiu os serviços para os distritos, o que de certa forma permitiu a redução de tempo de espera. Por essa razão, o provedor da Justiça ambiciona ver inovações no INATRO nos próximos dias.

“No que diz respeito à emissão das cartas de condução e livretes, auguramos melhores dias, com as inovações em curso no Instituto Nacional dos Transportes Rodoviários (INATRO). I.P, nomeadamente: a descentralização dos serviços de captação de dados biométricos, renovação e emissão da carta de condução para os seguintes pontos: Cidade de Maputo (Jardim Tunduru, Bairro Zimpeto e Centro de Inspecções Obrigatórias de Zimpeto”, declarou o Provedor da Justiça.

Antes de ser exonerado do cago de Ministro dos Transportes e Comunicações, Janfar Abdulai declarou que “estamos a trabalhar para resolver o problema da demora na emissão das cartas de condução. Os exames feitos nas escolas de condução poderão refletir-se directamente ao nível do INATRO, igualmente a primeira marcação de dados poderá ocorrer nas escolas de condução”, contudo de lá a esta parte ao invés de mudar o cenário, segundo utentes, tende a piorar.

Refira-se que a Direção Nacional de Identificação Civil tem estado na dianteira na inovação. Para além da redução considerável do tempo de espera para o BI, o processo de obtenção do registo criminal tornou-se automatizado.

Hoje, para tratar o Registo Criminal, o utente só precisa entrar no sistema e fazer a marcação, sendo que o sistema oferece ao usuário possibilidade de fazer o pagamento imediato e escolher a hora de atendimento, uma realidade completamente diferente no caso da Carta de Condução, sua marcação continua refém da burocracia de mão em mão.

INATRO promete se pronunciar, mas “foge” no dia marcado

Contactada pelo Evidências, semana finda, para se pronunciar sobre as reclamações dos utentes, a porta-voz do Instituto Nacional dos Transportes Terrestres prometeu se pronunciar sobre o assunto esta segunda-feira (Ontem) às 10 horas, contudo, quando contactada no dia que se predispôs a falar, simplesmente ignorou a nossa equipa de reportagem.

Até ao fecho desta edição, no princípio da noite desta segunda-feira, não atendia às nossas ligações e nem se dignou a retornar às nossas correspondências. Mesmo assim, o Evidências irá envidar esforços para ouvir aquela instituição tutelada pelo Ministério dos Transportes e Comunicações.

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