Nyusi ganha um empurrãozinho de um grupo de cidadãos no seu plano de ficar no poder através do partido

DESTAQUE POLÍTICA
  • CC só irá se pronunciar sobre o assunto próximo ano
  • Grupo de 14 cidadãos submeteu petição ao CC para impedir que PR exerça funções privadas
  • Timing em que é feita petição levanta suspeitas de tratar-se de expediente para ajudar Nyusi
  • CC está concentrado no contencioso eleitoral e só será analisado próximo ano
  • Sendo analisado em Janeiro ou Fevereiro, Nyusi continuaria presidente da Frelimo até 2026

Na mesma semana que o Evidências denunciou a existência de um plano do grupo actualmente no poder para garantir que Filipe Nyusi continue a dirigir os destinos do país mesmo depois de cessar funções como Presidente da República, em Janeiro de 2025, por via do partido, um grupo de 14 cidadãos, aparentemente desprovidos de qualquer condão político, deu uma “ajudinha” que pode ser crucial para Nyusi manter-se como presidente da Frelimo até 2027, mesmo que Daniel Chapo, candidato da Frelimo, seja eleito Presidente da República, a 09 de Outubro. A petição encabeçada pelo procurador Flávio Chongola está a ser alvo de suspeição por chegar no período que antecede a formação de um novo governo. Fonte ligada ao Conselho Constitucional disse ao Evidências que muito provavelmente o órgão só irá deliberar sobre o assunto entre Janeiro e Fevereiro do próximo ano, por estar neste momento exclusivamente concentrado a gerir questões ligadas ao contencioso eleitoral. Se tal acontecer, na eventualidade do vencedor das eleições ser o candidato da Frelimo, Daniel Chapo seria impedido de desempenhar simultaneamente o cargo do Presidente do seu partido, abrindo espaço para que Filipe Nyusi continue no cargo até acabar o seu mandato.

Um grupo de cidadãos apresentou uma queixa no Conselho Constitucional contra Filipe Nyusi, por alegada incompatibilidade de funções como chefe de Estado e presidente da FRELIMO, Frente de Libertação de Moçambique. Os subscritores da queixa alegam a violação do artigo 148 da Constituição do país, que determina que em caso algum o Presidente da República deve exercer qualquer função privada.

Flávio Chongola, magistrado do Ministério Público, é um dos 14 subscritores da petição e considera que o que está em causa é uma incompatibilidade que consta da Constituição da República no seu artigo 148.

“Tem a ver com a defesa do Estado de direito democrática, devido a uma incompatibilidade prevista na Constituição da República, bastante falada e até assumida por diversas esferas de posicionamento e pensamento. É a incompatibilidade do Presidente da República não poder exercer quaisquer funções privadas”, defende o magistrado, destacando que o exercício da função de Chefe do Estado é incompatível com a de Presidente do partido Frelimo.

Com a acção, os peticionários pretendem que o Conselho Constitucional obrigue ao Presidente da República, que tem mandato válido como presidente da Frelimo até 2027, a renunciar um dos cargos.

Decisão só pode sair no próximo ano

No entanto, fonte do Evidências no Conselho Constitucional considera remota a possibilidade deste processo ser julgado em tempo útil, ou seja, este ano, devido ao facto do órgão estar exclusivamente concentrado na apreciação e deliberação sobre vários assuntos ligados ao processo eleitoral em curso.

Segundo a referida fonte, o mais provável é que o acórdão sobre a petição dos jovens que pedem a declaração de incompatibilidade de funções de Chefe de Estado e simultaneamente presidente da Frelimo só saia no princípio do próximo ano, provavelmente entre Janeiro ou Fevereiro.

Se assim for, a petição do procurador Flávio Chongola, Armando Nenane e outros 12 cidadãos servirá de um empurrãozinho para Filipe Nyusi manter-se na liderança da Frelimo, mesmo se Daniel Chapo ganhar as eleições. É que, se a decisão não acontecer antes do arranque do processo eleitoral, não produzirá efeitos sobre o mandato actual de Filipe Nyusi.

Tal como tem sido prática no partido Frelimo, o Presidente da República eleito assume a presidência do partido no Comité Central a seguir. Em caso do acórdão do CC sair só no ano que vem, mesmo que seja antes da tomada de posse, isso blindaria Filipe Nyusi que continuaria assim presidente da Frelimo.

A situação é de tal forma a favor de Filipe Nyusi que mesmo se a decisão for tomada este ano, porventura entre Novembro e Dezembro, a Frelimo podia evocar a necessidade de marcação de um Comité Central para poder pronunciar-se sobre o assunto.

Com isso ganharia tempo até a tomada de posse, e estando Filipe Nyusi dentro de um mandato em vigor até 2027, a sua continuidade nem sequer seria alvo de alguma contestação, o que legitima a ideia de que, pelo timing, a petição do procurador Flávio Chongola vai ser uma espécie de empurrãozinho para a pretensão de Filipe Nyusi de continuar a dirigir os destinos do país, através do partido, instituindo uma espécie de bicefalia do poder.

Nyusi quer transformar Chapo em mero boneco

Tal como revelou o Evidências, definitivamente, o Presidente da República, Filipe Nyusi, ainda não está preparado para deixar o poder e nem suficientemente convencido que “acabou”. Para tal, pretende testar a profundidade de rio com os dois pés, forçando a possibilidade de continuar presidente da Frelimo depois de terminar o mandato, tal como tentou Guebuza.

A vincar, seria a realização do velho desejo de um terceiro mandato, mantendo-se como presidente da Frelimo, e Daniel Chapo, caso seja eleito Presidente da República, ficaria apenas um “boneco”, apenas com poder executivo no Governo, mas sem o poder de decisão, pois este estaria centralizado no partido.

Só para se ter uma ideia, na actual configuração, os estatutos da Frelimo determinam que compete à Comissão Política, dentre várias atribuições, “coordenar e orientar a acção do Governo da FRELIMO e da sua Bancada Parlamentar na Assembleia da República”.

Quer isto dizer que Daniel Chapo (caso seja eleito) é impedido de assumir a presidência do partido, não passaria de um mero boneco de Filipe Nyusi, pois dependeria deste até para nomear os membros do executivo e coordenar as actividades do seu governo.

Embora ainda faltem cerca de oito meses para a tomada de posse do novo governo, a questão da probabilidade de uma bipolarização do poder mexe com a cabeça da maioria dos camaradas que já estão a afiar as lâminas para frustrar qualquer tentativa de Filipe Nyusi de se manter no poder.

Uma fonte sénior do partido confirmou ao Evidências a existência de um debate, ainda que em surdina, sobre uma provável manutenção de Nyusi no poder por via do partido, mas lembra que o Comité Central de Maio passado e as internas recentes mostraram que Filipe Nyusi já não tem poder ilimitado a frente do partido.

A fonte lembra que inicialmente o plano de Nyusi era colocar Roque Silva, a quem desesperadamente tentou impor ao Comité Central durante longos quatro dias, contudo, mas a estratégia acabou fracassando, naquela que foi a primeira afronta à sua liderança. A segunda afronta viria a se registar quando camaradas na Zambézia e Gaza se recusaram a aceitar a imposição de candidatos únicos.

Por essa razão, os camaradas acreditam que qualquer pretensão de Filipe Nyusi de continuar no poder depois de Janeiro de 2025 está condenada ao fracasso e seria um enorme erro de cálculo tentar insistir nesse plano.

Refira-se que a pretensão de Filipe Nyusi de manter-se no poder ou ter alguém que lhe seja leal após deixar o poder justifica-se com o desespero para proteger os seus interesses no período depois de deixar o poder.

A cooperação com o Ruanda tem sido polémica por ser baseada em acordos muitos deles ocultos. Um dos maiores receios de Nyusi é ver escrutinados os acordos que tem com Paul Kagame, que viabilizaram a vinda das tropas ruandesas, num processo pouco transparente e com contornos ocultos.

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