Sentença do Reino Unido pode ajudar na recuperação da credibilidade no mercado Internacional  – analistas

DESTAQUE POLÍTICA
  • Moçambique ganhou processo contra Privinvest e depois?
  • Privinvest condenada a pagar 3.1 mil milhões de dólares de indemnização
  • Borges Nhamire diz que permitirá que o país tenha acesso aos mercados internacionais
  • “Moçambique pode ser mais atractivo ao Investimento Directo Estrangeiro” – Egas Daniel

O Tribunal Comercial de Londres decidiu, esta segunda-feira, 29 de Julho, a favor do Estado moçambicano no julgamento das “Dívidas Ocultas”. O Tribunal daquele país do velho continente condenou o grupo Privinvest pagar uma compensação de 1,9 mil milhões de meticais ao Estado moçambicano, e juros a serem quantificados. Grupo Naval já prometeu recorrer da decisão o que vai adiar certamente a abertura de champanhes, mas para o analista e pesquisador Borges Nhamire, apesar de não compensar todos os danos, a decisão do juiz Robin Knowles é grandiosa para Moçambique, uma vez que vai permitir que o país tenha acesso aos mercados internacionais, enquanto o economista Egas Daniel entende que a decisão poderá ser importante para a redução do stock da dívida pública e, sobretudo, tornar o país atractivo ao Investimento Directo Estrangeiro.

Duarte Sitoe

Nos meados de Julho em curso, o Governo celebrou mais um acordo extrajudicial com parte dos credores das “dívidas ocultas”. O acordo, por sinal o segundo, foi assinado com os credores da MAM (Mozambique Asset Management), uma das empresas beneficiadas pelos empréstimos ilegais, contraídos entre 2013 e 2014, no valor total de 2.2 mil milhões de dólares.

Ainda no corrente mês de Julho, concretamente no dia 29, o Executivo teve mais um motivo para festejar, uma vez que viu o Tribunal Comercial de Londres a decidir a seu favor e obrigou a Previnvest a pagar uma compensação de 1,9 mil milhões de meticais.

A valor da compensação não “cheira” a quantia de 3,9 mil milhões de meticais que era exigida pelo Executivo, mas é um duro golpe para as aspirações da empresa naval sediada no Líbano.

Na hora de tomar a decisão, Robin Knowles, Juiz do Tribunal Comercial de Londres, recusou os testemunhos do proprietário do grupo, Iskandar e de Jean Boustani que juravam de pês juntos que a Privinvest não pagaria subornos.

“Estou convencido de que o senhor Safa e o Grupo Privinvest estavam dispostos a prometer ou a pagar a quem quer que fosse, e especificamente ao ministro Chang. E foi isso que fizeram”, lê-se na sentença.

Reagindo a decisão do Juiz Robin Knowles, a Procuradoria-Geral da República explicou que a compensação de 1,9 mil milhões de dólares “traduz o montante que o Estado já pagou ao abrigo das garantias, incluindo capitais, juros, taxas dos Eurobonds, após a assunção da EMATUM, bem como dos acordos de transacção que a Estado alcançou, inicialmente com o Credit Suisse e outros bancos e instituições financeiras e, mais recentemente, com o VTBC e BCP”.

A PGR refere, por outro lado, que a Privinvest foi condenada, ainda, a pagar juros a serem quantificados, estimativamente, em milhões de dólares e garante que o Estado moçambicano prossegue com diligências visando a atenção do reembolso de todas as despesas judiciais que incorreu com o processo.

Em comunicado disponibilizado na tarde desta segunda-feira, a Privinvest já prometeu recorrer da decisão por entender que a decisão do juiz Robin Knowles, resulta de um julgamento “estranho”, pois no seu entender os advogados de Moçambique não disponibilizaram todos os documentos.

Mais do que recorrer daquilo que considerou ser uma estratégia de ocultação intencional de documentos, a Privinvest promete continuar a arrastar Filipe Nyusi para o processo. Curiosamente, o julgamento do recurso poderá acontecer num momento em que Filipe Nyusi não terá mais poder.

Nhamire diz que sentença não repara os danos sócioeconómicos

Para o investigador e analista do Centro de Integridade Pública, Borges Nhamire, a sentença proferida pelo Tribunal Comercial de Londres não vai reparar os danos sociais e econômicos, mas é uma boa decisão para Moçambique.

“A Sentença significa que a Privinvest vai pagar a Moçambique os danos que Moçambique incorreu das dívidas ocultas, ou seja, o dinheiro que o país gastou para pagar no âmbito dos acordos, incluindo as despesas com os advogados. É uma sentença grandiosa para Moçambique, mas não é final porque a Privinvest pode e vai recorrer. Certamente que não repara os danos sociais, há pelo menos dois milhões de pessoas que foram empurrados para a pobreza por causa das dívidas ocultas. O regime ficou mais autoritário, os funcionários públicos perderam a ajuda médica e medicamentosa. A ajuda internacional que ia para as pessoas necessitadas foi retirada por causa das dívidas”, declarou.

Depois que foram despoletadas as dívidas ocultas, o custo de vida subiu exponencialmente em todo o território nacional. Questionado sobre o impacto da sentença do Tribunal na economia nacional, o pesquisador do Centro de Integridade Pública destacou a melhoria da imagem do Estado Moçambique o que, de certa forma, vai abrir mais portas nos mercados internacionais.

“A sentença vai permitir que, primeiro, a reputação do Estado moçambicano seja melhor. Não vai recuperar totalmente, mas vai recuperar de alguma forma porque a sentença prova que houve fraude, prova que os funcionários do Estado moçambicano foram subornados para assinarem garantias, isto melhora a imagem do Estado moçambicano. Por outro, permite que o país tenha acesso aos mercados isso combinado com os acordos que foram muito importantes”, subscreve.

Moçambique pode ser mais atractivo ao Investimento Directo Estrangeiro – observa Egas Daniel

No entender do economista Egas Daniel, a sentença proferida pelo Tribunal Comercial de Londres vinca a divisão de responsabilidades, ou seja, que o escândalo das dívidas ocultas não foi maquinado intramuros.

“Nota-se que foi um esquema fraudulento arquitetado por instituições internacionais que de alguma forma cientes da incapacidade óbvia da rentabilidade destas empresas e do Estado moçambicano de fazer face o pagamento destas dívidas, mesmo assim concederam dívidas, isso em si mostra que de facto há responsabilidade compartilhadas dos Bancos que cederam esses investimentos e que se provou que foi por meio de subornos”, disse Egas Daniel, para seguidamente referir que a decisão do Juiz Robin Knowles reduz a responsabilidade unilateral e coloca Moçambique na rota de aumentar a sua credibilidade no mercado internacional.

“Agora as pessoas percebem que os bancos foram coniventes e talvez Moçambique pode ter sido vítima também neste processo. A minha expectativa é que seja um final rumo à recuperação da credibilidade do país perante os parceiros internacionais como segmento do que assistimos em parte do julgamento das dívidas ocultas, ou seja, o Estado moçambicano está a mostrar que não está conformado com o que aconteceu face às consequências que assistimos. Não só o julgamento dos actores como também submeteu um processo contra as entidades internacionais envolvidas. A sentença dando razão ao recurso fortalece a posição do Estado de defender os interesses dos moçambicanos. Estamos a caminhar pouco rumo à melhoria da credibilidade do Estado moçambicano nos parceiros internacionais”.

Egas Daniel defende ainda na sua explanação que a sentença proferida no Tribunal Comercial de Londres poderá ser importante para o país reduzir o stock da dívida que o país tem a honrar, mas adverte que é preciso gerir as expectativas a compensação não é um valor que virá de uma única vez.

“Com esta confirmação de indemnização com os alívios anteriores a conjugação destes esforços culminando com a redução do stock da dívida, ou seja, o total da dívida sobre o PIB significa que melhora os indicadores de sustentabilidade. Se tínhamos um stock da dívida avaliado em 80% sobre o PIB quando se retira esses valores que perfazem uma boa parte do stock da dívida é provável que reduza. Ficamos com indicadores mais sustentáveis. Se antes o valor da dívida sobre o PIB estava acima do limiar da sustentabilidade, então pouco a pouco vai reduzindo para se aproximar aos níveis mais sustentáveis. É aí onde decorre a melhoria da avaliação ou da percepção do risco do país perante as notações de rating internacional porque os indicadores estarão a melhorar”, sublinhou.

“Não vislumbro melhorias da nossa economia depois desta decisão”

Por sua vez, o economista Rui Mendes observou que a sentença proferida na segunda-feira, 29 de Julho, vai constar no rol das realizações do actual Governo que caminha a passos largos de terminar o último de governação sobre um mar de críticas e lamentações.

“Em primeiro lugar, tenho que reconhecer que esta decisão é uma chapada de luva branca para os que pensavam que Moçambique iria sair com mãos a abanar no Tribunal de Comercial de Londres. É uma decisão muito valiosa para os moçambicanos e, sobretudo, para o Governo. É uma das poucas vitórias do actual Governo e acredito que vai constar no rol das realizações do actual Presidente da República, Filipe Nyusi”, disse Rui Mendes.

Os doadores fecharam as torneiras na sequência da descoberta das dívidas ocultas o que, de certa forma, empurrou um país “dependente” para a lama. No entender de Mendes a sentença proferida no Tribunal Comercial de Londres não terá impacto significativo na economia nacional.

“Todo moçambicano gostaria que esta decisão tivesse um impacto positivo na economia nacional. No entanto, não vislumbro melhorias da nossa economia depois desta decisão a médio prazo. Pode vir a impactar positivamente no futuro, uma vez que o país recuperou a sua reputação junto dos doadores e, sobretudo, nos mercados internacionais. Não sei para onde serão destinados os 1,9 milhões de dólares, mas o Estado vai recuperar o valor astronômico que gastou com todas as despesas judiciais”, destacou.

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