- Último informe confirma saída inglória e desespero pela busca de legado
- Nyusi deixa um país com uma insatisfação generalizada
- PR atirou a toalha ao chão: “Não resolvemos” (o problema de raptos)
O Presidente da República, Filipe Nyusi, foi, na última semana, ao Parlamento para fazer o balanço dos seus dois ciclos de governação. O empregado do povo, assim como se auto intitulou quando tomou posse para o primeiro mandato, disse que sua governação foi condicionada por quatro factos, nomeadamente tensão militar na zona centro, desastres naturais, pandemia e terrorismo. Enumerando as poucas realizações, Filipe Nyusi levantou o “peito” para referir que sai com missão de dever cumprido, visto que deixa o país em paz e reconciliado, sem sequer dar a mínima importância o caos institucional e o descontentamento social crescente gerados por sua governação desastrosa. No entanto, reconheceu que não conseguiu resolver os problemas de raptos. Por outro lado, para além de reduzir a pobreza, o Executivo de Nyusi não se mostrou capaz de criar soluções para os problemas na educação e na saúde.
Duarte Sitoe
Aquando da saída de Armando Guebuza da Ponta Vermelha, os moçambicanos festejaram efusivamente e olhavam para Filipe Nyusi como o homem certo para dirigir o país rumo ao tão almejado desenvolvimento.
Nas eleições de 2014, Nyusi foi eleito, mas sua vitória foi contestada por Afonso Dhlakama, o que levou a uma cadeia de acontecimentos que culminariam com dois atentados à sua vida entre Agosto e Setembro de 2015, facto que o levou a refugiar-se nas matas da Gorongosa, iniciando aquela que foi oficialmente a última vaga do conflito entre o Governo e a Renamo
Na tomada de posse, o terceiro Presidente da República fez um discurso na altura considerado histórico com um mar promessas aos moçambicanos desde o desenvolvimento até ao combate cerrado contra a corrupção, fenómeno que ano após ano continua a desviar avultados fundos dos cofres do Estado.
Sobre a paz, Nyusi esqueceu de dizer que foi ele quem começou a guerra
Ignorando que foi já sob seu comando, oito meses depois de tomar o poder, que as forças governamentais atentaram contra a vida do líder da perdiz levando a eclosão da última vaga do conflito entre o Governo e a Renamo, no seu último informa como Presidente da República na casa do Povo, Filipe Nyusi armou-se em “salvador”, ou seja, aquele que trouxe a paz e em nenhum momento fez menção que foi sob suas ordens que a guerra começou.
Com efeito, hasteou o acordo com a Renamo para a cessão das hostilidades na Zona Centro do país, assim como o Acordo de Paz como um dos maiores feitos (legado) do seu ciclo de governação de dois mandatos.
“Uma das principais apostas deste ciclo de governação foi criar e consolidar a paz e a reconciliação para dentro da nossa casa colectiva, para dentro de cada moçambicano. Curiosamente, ontem mesmo cumpriu-se o quinto aniversário da assinatura do Acordo de Maputo para Paz e Reconciliação”, disse Nyusi.
Prosseguindo, referiu que o compromisso com a paz não ficou apenas nas palavras ditas no seu discurso inaugural em 2015.
“Traduzimo-lo em acções concretas, encetando contactos directos com a liderança da Renamo. Primeiro em Maputo, mas depois, num gesto que muitos consideraram ousado, e até arriscado, escalamos a Serra da Gorongosa em busca da paz. A inquietação era justa porque os humanos vivem com desejo de ter certezas, paradoxalmente, vivemos num mundo incerto e probabilístico”, frisou.
Uma reconciliação aparente esvaziada pela penúria e caos social
Numa altura em que os moçambicanos enfrentam um caos social gerado pela má governação que levou a uma subida vertiginosa do custo de vida, degradando ainda mais a condição de pobreza.
Nos últimos 10 anos, de acordo com a Estratégia Nacional de Desenvolvimento 2025-2044, aprovada, recentemente, pelo Conselho de Ministros, o número de pessoas que vivem abaixo da linha da pobreza aumentou exponencialmente em Moçambique, ou seja, o exército de pobres foi reforçado nos dois ciclos de governação de Filipe Jacinto Nyusi.
Em 2015, 46,1% da população moçambicana estava em situação de incapacidade de aquisição de bens alimentares e não alimentares com o objectivo de satisfazer as necessidades básicas.
No entanto, olhando para os dados tornados públicos pela Estratégia Nacional de Desenvolvimento 2025-2044, nos últimos 10 anos, por sinal no ciclo de governação de Filipe Nyusi, o número de pobres subiu de 46,1% para 65%.
Na hora de dizer adeus aos moçambicanos, Nyusi declarou que a sua governação foi condicionada por quatro factores, nomeadamente, tensão militar na zona centro, desastres naturais, factores externos, pandemia e terrorismo.
No entanto, não tem dúvidas de que apesar das dificuldades encontradas ao longo dos últimos 10 anos, diz que vai sair da Ponta Vermelha com “Com profunda emoção e sentimento de dever cumprido” porque “entregamos o país totalmente reconciliado”.
Se por um lado, o Empregado do Povo é um homem realizado por ter conseguido o acordo com a Renamo por ter conseguido o acordo de cessação das hostilidades com a Renamo. Por outro, não conseguiu soluções para os problemas que preocupam os seus patrões.
Nyusi capitula perante os raptos e declara: “está longe de ser resolvido”
Os raptos continuam a tirar sono à sociedade moçambicana, sobretudo ao empresariado nacional. Em relação ao fenômeno que já precipitou a saída de mais de 150 empresários do país, Filipe Nyusi atirou a toalha ao chão, reconhecendo que “o problema dos raptos faz parte do que não foi feito”.
Aliás, em jeito de capitulação e assumindo uma postura que não sai bem na fotografia para um “comandante em chefe”, Nyusi chegou mesmo a referir num momento de improviso que o problema dos raptos “está longe de ser resolvido”.
Durante o seu Informe Anual, o Presidente da República criticou os empresários resgatados que não aceitam partilhar informações com as autoridades da lei e ordem, tendo reconhecido que apesar das medidas tomadas o problema está longe de ser resolvido.
“É um problema que temos que estudar e ver o que é que esta acontecer, porque é real. E as pessoas resgatadas depois não falam. Não dizem porque tem medo. Como vamos resolver se você tem medo de si próprio. Temos tomado medidas, mas não temos resolvido o problema”.
Relativamente a luta contra o terrorismo, o Chefe de Estado reconheceu o país ainda não foi capaz de erradicar definitivamente o terrorismo.
“Ainda não fomos capazes de eliminar total e definitivamente o terrorismo no norte de Moçambique (…), mas conseguimos conter e fazer recuar estas ações. Uma das razões que permitiu este sucesso foi o facto de termos combinado a resposta militar com soluções económicas que trouxeram esperança aos jovens (…) a outra foi o envolvimento combinado (…) das forças da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) e o Ruanda, numa experiência ímpar”, declarou Nyusi.
Agudizou o descontentamento na função no último ciclo de governação de Nyusi
Os sectores da saúde e da educação estão à beira do colapso, enquanto assiste-se a greves silenciosas nas duas magistraturas. No entanto, o Presidente da República destacou as realizações conseguidas ao longo do seu ciclo de governação nos dois pelouros apesar do descontentamento generalizado dos professores e profissionais de saúde que por diversas vezes paralisaram as actividades
No sector da saúde, Filipe Nyusi revelou que ao longo dos dois ciclos da sua governação houve um crescimento de 21% da rede sanitária, tendo destacado a construção e requalificação de diversos hospitais e centros de saúde em todo território nacional.
A pandemia da Covid-19 foi um verdadeiro teste de fogo para o Sistema Nacional de Saúde. De acordo com o Chefe de Estado, que referiu que nos últimos anos foram construídos oito laboratórios que foram imprescindíveis para a melhoria do armazenamento dos medicamentos, a Organização Mundial da Saúde reconheceu os esforços do país na gestão da pandemia da Covid-19 e, recentemente, no controlo da conjuntivite hemorrágica.
Erradicar a cólera e a malária continua no topo das prioridades das autoridades sanitárias. Durante o Informe Anual, Filipe Nyusi destacou que actualmente o país tem a taxa de mortalidade de menos 1% no que respeita a cólera, sendo que para casos de malária Moçambique registou uma melhoria de 20%.
Relativamente aos partos, Nyusi revelou que o país reduziu significativamente o índice da mortalidade materno-infantil.
Em Moçambique, a educação é vista como um meio indispensável na preparação do capital humano para o combate à pobreza, a promoção do desenvolvimento socioeconômico e o bem-estar do cidadão.
Falando dos avanços alcançados entre 2015 e 2024, o Presidente da República declarou, sem adiantar números, que o país registou redução da taxa de analfabetismo, tendo ainda destacado o facto da matrícula de primeira à nona classes ser grátis desde 2020.
Por outro, para além do aumento das salas de aulas, referiu que em cada 100 crianças 99 iniciam os estudos primários com idade desejada na primeira classe.
Apesar dos inúmeros problemas causados pela implementação da Tabela Salarial Única (TSU), Nyusi defendeu aquele que é para muitos tinha tudo para ser o seu legado, mas passou à margem disso e tornou-se num dos maiores fracassos da sua administração.
“Foi concebida para resolver manifestas discrepâncias de salários entre os funcionários e agentes de Estado com as mesmas qualificações, anos de serviço e responsabilidades, situação que caracterizou a nossa Administração Pública durante décadas”, disse, ignorando a crise de liquidez e os atrasos salariais causados pela má concepção da TSU.

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