- Depois de ser informado sobre falta de transparência na contagem e tabulação dos votos
- “Os EUA instam as partes a respeitarem os direitos humanos e promoverem o diálogo”
- “O povo moçambicano merece saber que seus votos foram contados correctamente”
Moçambique vive um clima de tensão política devido a contestação dos resultados que, vezes sem conta, resvalou em episódios violentos, na sequência da repressão policial com balas reais e gás lacrimogénio, acabando por resultar em dezenas de mortos e quase mil feridos. Numa altura em que se aguarda pela validação e proclamação dos resultados eleitorais pelo Conselho Constitucional, que, a princípio, vai ser feita na terceira semana de Dezembro, o Governo dos EUA diz estar atento e continua a acompanhar de perto o processo eleitoral de Moçambique, tendo recolhido relatos de muitos observadores independentes, tanto moçambicanos, quanto internacionais, que criticaram a falta de transparência na contagem e tabulação dos votos. Numa entrevista exclusiva ao Evidências, a porta-voz em português do Departamento de Estado norte-americano, Amanda Roberson, diz que vê os novos desenvolvimentos em Moçambique com alguma preocupação, ao mesmo tempo que pede calma e contenção em Moçambique, e insta todas as partes interessadas a se absterem de violência, respeitando os direitos humanos. Na entrevista que se segue, conseguida à margem da reunião do G20 que teve lugar, recentemente, no Brasil, a nossa entrevistada diz que a administração norte-americana está comprometida em promover soluções pacíficas para conflitos e aliviar tensões em países africanos. Acompanha os excertos mais importantes.
Reginaldo Tchambule
Jornal Evidências: Como é que a administração norte-americana olha para a crise política pós-eleitoral em Moçambique e que caminhos acha que podem levar à estabilização do país?
Amanda Roberson – Os Estados Unidos pedem calma e contenção em Moçambique e instam todas as partes interessadas a se absterem de violência, respeitarem os direitos humanos e promoverem um diálogo pacífico, aberto e honesto.
O povo moçambicano exerceu pacificamente o seu direito de votar e merece saber que seus votos foram contados correctamente. As instituições eleitorais devem conduzir investigações completas, confiáveis e transparentes sobre denúncias de fraude eleitoral.
Parte considerável dos países do G20, incluindo os EUA, é unânime em condenar a fraude eleitoral e a violência das autoridades na Venezuela. Por que não se vê o mesmo movimento de condenação em relação ao caso de Moçambique e outros países africanos, apesar de haver provas públicas?
– O Governo dos EUA continua a acompanhar de perto o processo eleitoral de Moçambique. Compartilhamos a aspiração do povo moçambicano por eleições democráticas e transparentes que sejam conduzidas por meio de um processo eleitoral pacífico, conforme consagrado na constituição e nas leis eleitorais de Moçambique. Muitos observadores independentes, tanto moçambicanos quanto internacionais, criticaram a falta de transparência na contagem e tabulação dos votos. Alguns observadores também expressaram preocupações sobre o que pareciam ser folhas de contagem de resultados manipuladas em algumas secções eleitorais. Compartilhamos essas preocupações — o povo moçambicano que exerceu pacificamente seu direito de votar merece saber que seus votos foram contados e tabulados adequadamente.
Qual é visão dos principais países do G20 em relação à crescente instabilidade política em África, ancorada às tensões geopolíticas das grandes potências globais?
– Para os Estados Unidos, a estabilidade regional na África e ao redor do mundo é uma das nossas principais prioridades. Entendemos que não podemos ter um mundo democrático e próspero sem que as pessoas se sintam seguras contra a violência e os danos. É por isso que nos envolvemos com parceiros no governo, sector privado e sociedade civil ao redor do mundo para promover soluções pacíficas para conflitos e aliviar tensões. Um bom exemplo é o nosso trabalho com Angola no conflito entre Congo e Ruanda. Estamos felizes em ver Angola desempenhando um papel de liderança na mediação e monitoramento de um cessar-fogo entre as partes envolvidas. As pessoas na região merecem viver em paz.
G20 quer acabar com baixa tributação das corporações nos países pobres
Como os Estados do G20 pensam em ajudar a África, por exemplo, a combater os seus desafios económicos e sociais? Como encontrar o equilíbrio entre a necessidade de desenvolvimento de África, a emergência da crise energética global e o combate às mudanças climáticas?
– Por meio do G20, o governo Biden-Harris apresentou um acordo histórico com o objectivo de interromper o nivelamento por baixo no que se refere à tributação corporativa; lançou um novo fundo a fim de lidar com ameaças de pandemias; e ajudou a desbloquear centenas de bilhões de dólares em recursos nas instituições financeiras internacionais visando promover o progresso do desenvolvimento e enfrentar desafios globais.
Na Cúpula do Rio, o presidente Biden continuou esse legado de liderança ao reunir seus colegas líderes para desbloquear espaço a fim de que países em desenvolvimento invistam em seu futuro, acelerem a transição global rumo à energia limpa, enfrentem ameaças globais à saúde e defendam uma transformação digital inclusiva. Ele também deu continuidade à liderança de longa data dos Estados Unidos em segurança alimentar ao se juntar à Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza.
Na sua declaração final, os países do G20 apelaram pela Paz, pelo fim da fome, da pobreza e desigualdades sociais. Em termos práticos, esta é a imagem de África e de Moçambique em particular. Qual é a visão dos Estados Unidos para os próximos anos em relação a estes aspectos e até que ponto a mudança de administração pode ou não comprometer o engajamento norte-americano na ajuda aos países como Moçambique?
– Entendemos que somente trabalhando com parceiros africanos seremos capazes de abordar nossos desafios globais compartilhados. Há muitas oportunidades de trabalhar com países em toda a região em iniciativas que incluem energia verde, tecnologias emergentes e defesa da democracia, entre outras questões cruciais. Os laços entre os Estados Unidos e os países africanos vão além de nossos governos para incluir o sector privado e laços entre os nossos povos. Esperamos que essas colaborações continuem apenas à medida que nossos relacionamentos se desenvolvam nos próximos anos.
“EUA apoiam reforma de instituições globais para dar mais voz a África”
O G20 apoia ou não a inclusão da África como Membro Permanente e com poder de veto no Conselho de Segurança da ONU?
– Os Estados Unidos apoiaram fortemente a inclusão da União Africana como membro do G20, e ficamos felizes em trabalhar ao lado dos membros da União Africana na Cúpula no Rio de Janeiro na semana passada. Também apoiamos a inclusão da União Africana no Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Passado um ano depois da histórica decisão de incluir a União Africana como membro permanente do G20, como é que a administração norte-americana olha para a participação do continente neste grande fórum mundial?
– A fim de enfrentar com eficácia os maiores desafios de hoje — desigualdade económica, segurança alimentar, mudanças climáticas — é necessário reformar instituições globais para que reflitam melhor o mundo de hoje, e não o mundo de 80 anos atrás. Os países Africanos, em especial, devem ter mais voz no sistema multilateral.
Continuaremos trabalhando lado a lado com nossos parceiros africanos em fóruns internacionais como o G20 e as Nações Unidas para trabalhar em soluções para esses problemas e construir um mundo melhor para os povos de nossos países.
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