Um governo “falhado’’ e inoperante

OPINIÃO

Edmilson Mate

Nos últimos dias, o nosso País tem vivido uma crescente instabilidade social. As manifestações têm sido constantes no país, refletindo um mal-estar generalizado e uma insatisfação com o governo, de forma particular com os órgãos de administração Eleitoral (CNE & STAE). No entanto, o tratamento indiferente por parte do governo a essas manifestações tem sido preocupante, chegando até rotular os manifestantes de “bandidos”, “vândalos”, “marginais”, e outros termos pejorativos, muitos deles desproporcionais e cruéis. Tais atitudes não apenas estigmatizam a população, mas também ignoram as reais causas que motivam o descontentamento popular. A resposta do governo tem sido, em grande parte, autoritária e repressiva, uma solução que parece afastar ainda mais o Estado das necessidades reais do povo.

O governo, ao tratar seus cidadãos com desprezo e violência, falha em reconhecer uma verdade fundamental: as manifestações não surgem do nada. Elas são, quase sempre, respostas a uma série de problemas estruturais e crônicos que afetam a vida cotidiana da população. Antes de rotular os manifestantes de forma simplista e demonizadora, o governo deveria fazer uma análise mais profunda: por que a população está se manifestando? O que leva tantos cidadãos a sair às ruas em protesto? É importante compreender que nenhuma subversão popular acontece sem motivo, e ignorar essa realidade é uma falha grave na gestão do Estado.

As manifestações no País têm uma série de causas profundas, muitas das quais são frutos de uma gestão falhada e da incapacidade do governo de atender às necessidades mais básicas da população. O alto custo de vida, o desemprego em níveis alarmantes, a corrupção endêmica, o nepotismo, o favoritismo e a partidarização do estado. são apenas algumas das razões que têm levado os cidadãos a se manifestar. Esses problemas não são novos, mas têm se agravado dia pós dia,  sem que haja uma resposta eficaz por parte das autoridades.

O custo de vida, por exemplo, tem se tornado um fardo cada vez mais pesado para as famílias moçambicanas. A inflação alta e os preços exorbitantes dos bens essenciais, como alimentos e combustíveis, têm levado muitos a uma situação de pobreza extrema. A pobreza no país afeta mais da metade da população, tendo aumentado 87% nos últimos 10 anos, essa subversão popular não é taxativamente devido aos resultados eleitorais, mas sim, devido as condições de vida do povo moçambicano, não existem políticas públicas eficazes para combater o desemprego, especialmente entre os jovens, e isso gera uma sensação de frustração generalizada. O nepotismo e o favoritismo na distribuição de recursos e oportunidades também criam uma sensação de injustiça, enquanto a violência por parte da PRM, com o uso excessivo da força para reprimir manifestações, agrava ainda mais a crise.

Quando o governo não consegue atender a essas questões estruturais, a população recorre ao único meio de protesto que ainda tem: as manifestações nas ruas. Estas são, em última instância, uma forma de exigir justiça, de cobrar a melhoria das condições de vida e de reivindicar que as promessas feitas pelos governo sejam cumpridas. Nesse contexto, as manifestações são uma expressão legítima e constitucional da cidadania. Elas são uma forma de o povo se fazer ouvir em um cenário em que os canais tradicionais de diálogo e representação parecem falhar ou ser insuficientes.

É crucial compreender que a manifestação não é um ato criminoso. Ao contrário, ela é uma das formas mais fundamentais de exercício da democracia. A Constituição de Moçambique garante aos cidadãos o direito de se manifestar pacificamente, como uma forma de expressão da sua vontade e insatisfação. Quando o governo criminaliza manifestações pacíficas e recorre à repressão violenta, está não só violando os direitos constitucionais, mas também ignorando a função do Estado em uma democracia: ouvir a população, dialogar e buscar soluções para os problemas que a afligem.

A violência por parte do Estado, tem se intensificado nos últimos dias, é um reflexo da incapacidade do governo de lidar com a pressão popular de maneira civilizada. Em vez de buscar resolver os problemas que motivam as manifestações, o governo prefere silenciar os cidadãos à força. Isso é particularmente preocupante porque, além de causar mortes e ferimentos, a repressão só serve para alimentar ainda mais a desconfiança e o ressentimento entre a população e o Governo. A morte de jovens, crianças e cidadãos em protestos pacíficos não é apenas uma violação dos direitos humanos, mas uma violação do próprio princípio democrático.

Ao invés de enfrentar os problemas de forma construtiva, o governo opta por uma estratégia de repressão, tentando suprimir as manifestações através da força. Essa abordagem, além de ser falhada, acaba gerando um ciclo vicioso: quanto mais o governo reprime, mais as manifestações se intensificam. O uso excessivo da força não resolve os problemas, mas apenas cria mais tensões e divide ainda mais o país. Em uma democracia saudável, o papel do governo não é combater o protesto, mas ouvir as demandas da população e trabalhar para melhorar as condições de vida.

O verdadeiro desafio para o nosso País, não está na repressão das manifestações, mas na adoção de políticas públicas eficazes que atendam às necessidades da população. O governo deve encarar as manifestações como um sinal claro de que algo está errado e que a população está pedindo mudanças. Ignorar as causas que geram o descontentamento é um erro fatal para qualquer governo democrático. O diálogo é a chave para a resolução dos conflitos, e a violência nunca será a solução.

O Estado de Direito exige que os governantes respeitem os direitos dos cidadãos, incluindo o direito à manifestação. Quando o governo recorre à violência, está colocando em risco a estabilidade do país e comprometendo a própria base democrática sobre a qual a nação foi construída. O futuro de Moçambique depende de uma mudança de postura por parte das autoridades: é necessário que o governo, ao invés de rotular e reprimir os manifestantes, se envolva em um processo de diálogo genuíno com a sociedade civil, ouvindo suas demandas e adotando medidas concretas para solucionar os problemas do país.

Em conclusão, o tratamento das manifestações como um acto de “marginalidade” e o uso excessivo da força para reprimir o povo são sintomas de um governo falhado. Moçambique precisa de um governo que escuta o seu povo, que compreenda as causas profundas da insatisfação popular e que busque soluções pacíficas e justas para os problemas estruturais que afetam a vida dos cidadãos. Só assim será possível restaurar a confiança entre o Estado e a população, e assegurar que as manifestações se tornem um instrumento legítimo de construção democrática e não um campo de batalha violento.

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