O erro de nomeações por confiança política

OPINIÃO

Alexandre Chiure

Numa conversa com os directores e editores dos órgãos de informação, decorrida na Presidência da República, uma das poucas havidas com profissionais da área, perguntámos ao Presidente Joaquim Chissano, entre várias questões abordadas, com que base nomeava pessoas para assumirem pastas ministeriais.

Em resposta, disse-nos que era na base de confiança política porque a técnica pode ser alugada ou comprada. O que faltou perguntar a ele, como insistência, foi o significado de alguém ser de confiança política.

Ninguém lembrou-se, igualmente, de questionar ao presidente sobre até que ponto é que a técnica, uma vez alugada ou comprada, pode emprestar ao nomeado a competência desejada para a direcção eficaz de um ministério ou de qualquer que seja organismo de Estado.

Numa análise terra a terra significa que não importa se a pessoa é competente ou não. Se está em altura de exercer um determinado cargo público ou não. O facto é que alguém pode tornar-se ministro, vice-ministro, secretário de Estado, administrador de distrito ou assumir outras posições, bastando para isso ser de confiança política.

O Presidente Chissano está fora do poder há 20 anos, mas o modelo, que parecia sua criação, continua a dominar as nomeações, quer para membros do governo, quer para os diferentes postos, nomeadamente de PCAs de empresas públicas, directores-gerais e outros.

Por via desse critério, todos nós somos testemunhas de casos de pessoas incompetentes e, por isso, sem meritocracia, que foram designados para certos cargos e mantiveram-se por muito tempo nesses mesmos postos por confiança política.

Estamos a falar de indivíduos sem capacidade técnica ou qualificações para assumirem altos cargos no Estado mas que foram nomeadas por confiança política e permaneceram nos postos por muito tempo sem serem mexidos.

Há exemplos, neste e noutros governos, de ministros, como da Educação e Desenvolvimento Humano, que deviam ter pedido demissão, por iniciativa própria, perante a incompetência demonstrada no exercício das suas actividades ou demitidos por quem lhes nomeou, mas nada feito.

Reporta-se o caso de um ministro que dirigiu, de uma forma desastrosa. Provou por A mais B que não entendia nada do que fazia à frente de um sector estratégico como dos Transportes e Comunicações, que acabou demitido por pressão do público ao não conseguir oferecer soluções para a crise de transporte de passageiros. De PCAs que fizeram uma gestão danosa. Todos de confiança política.

Vimos figuras de confiança partidária a serem nomeadas para exercer cargos de administradores, administradores-delegados  de empresas públicas, directores-gerais de instituições tuteladas pelo Estado que mais não fizeram do que dilapidar esses mesmos sectores.

Indicar pessoas por confiança política transmite a ideia de que todos quantos queiram ascender a cargos públicos devem ter cartão vermelho. Os que não militam em nenhum partido político, em particular na Frelimo, não terão essa oportunidade, mesmo que sejam pessoas com qualificações para o efeito. É uma percepção.

Tem que passar a ser cultura no país as nomeações para cargos públicos atenderem a questões de competência e meritocracia. O Estado deve ser feito de pessoas com qualificações desejadas para ocuparem algumas funções de responsabilidade.

Depois é aquela confusão de sempre que se faz de confundir o partido com o governo e o governo, com o  Estado. No fim do dia, os três polos de poder transformam-se num único: o partido que manda em tudo. Decide quem deve ser nomeado ou exonerado, promovido ou despromovido entre os portadores do vermelhão.

Os quadros que o país tem, ao serviço do Estado, são considerados como sendo da Frelimo, um partido que se acha no direito de usá-los como bem entender. As ordens superiores são cumpridas à moda de monopartidarismo, mesmo que elas sejam ilegais.

Quando é para abandonar o trabalho no Estado e participar nas actividades partidárias, não se discute. Não importa se os serviços vão ficar afectados ou não. Basta estar bem com o partido e garantir o pão de cada dia, pronto, é tudo.

Com a campanha eleitoral, os gabinetes estão vazios. Há muitas clareiras nos sectores. Os técnicos estão na política. Não se trabalha, contrariando o slogan do próprio partido que promove o trabalho. “Vamos Trabalhar”. Quase todo o mundo está nas jornadas de “caça” ao voto, incluindo os que têm que tomar decisões para as coisas andarem. A vida é assim. Há murmúrios, mas, logo a seguir, tudo passa.

São poucos, mas muito poucos, os funcionários com a coragem do professor Adão, de Filosofia, em Inhambane, que preferiu dar o peito às balas ao recusar fazer campanha eleitoral para continuar a dar aulas aos seus alunos, contra todos os riscos que isso representa na sua vida profissional.

Contam-se aos dedos de uma mão funcionários como Alírio João, agente alfandegário, em Nampula, que preferiu mais ser preso do que obedecer a ordens ilegais dadas por um governante local. Se todos os funcionários afectos aos MMVs e não só, de entre professores e outros, fossem como este paramilitar, não haveria fraude no país. Não aceitariam comprometer um processo eleitoral inteiro para satisfazer interesses políticos de um partido.

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