- Solução proposta por Nyusi divide Comissão Política e outra não foi acolhida pelo CE
- Após governação fracassada, Nyusi tem menos de 30 dias para cumprir promessa de estabilidade
- Todas as propostas apresentadas no partido e no Governo encontram resistência interna
- Por mais bem intencionadas são rejeitadas por medo do fantasma do terceiro mandato
O Conselho do Estado, um órgão de consulta do Presidente da República que, dentre várias competências, tem a obrigatoriedade de se pronunciar sobre a declaração de guerra, do Estado de sítio ou do Estado de Emergência, se, reuniu semana passada para analisar a situação de segurança no território nacional, com enfoque para o Teatro Operacional Norte e nas manifestações no período pós-eleitoral. Filipe Nyusi colocou na mesa a possibilidade de se declarar Estado de Sítio, proposta que foi de imediato rejeitada pelos presentes, recorrendo a argumentos de que não se pode generalizar os focos de instabilidade. Aquela não foi a primeira reunião que Nyusi colocou na mesa a declaração de Estado de Sítio ou de Emergência, um recurso constitucional que limita as liberdades fundamentais. A pretensão já foi partilhada com a Comissão Política, como parte das soluções. Ainda nesta segunda, a Comissão Política esteve reunida e Nyusi criticou, de forma irônica, a postura deste órgão, que sem apresentar soluções, limita-se em não acolher suas soluções, um posicionamento raro e que sugere isolamento.
Evidências
Nyusi ocupou-se, quase toda a semana, em auscultar vários sectores relevantes da sociedade sobre os possíveis caminhos de saída da crise pós-eleitoral, uma abordagem que diverge com o estilo que o caracterizou durante os seus 10 anos de governação, em que fechou-se na presidência e colocou perto de si aduladores, enquanto expurga para longe os que não o bajulam ou questionam.
No dia 11 passado, decorreu a VII Reunião do Conselho de Estado, um órgão de consulta do Presidente da República que tem as competências de pronunciar-se, obrigatoriamente, sobre a dissolução da Assembleia da República; b) declaração de guerra, do estado de sítio ou do estado de emergência; c) realização de referendo, nos termos da alínea c) do artigo 159 da Constituição da República; e d) convocação de eleições gerais.
Ao que Evidências apurou, Nyusi quis ouvir este órgão, que contou com a presença dos antigos Presidentes da República, Joaquim Chissano e Armando Guebuza, entre outras personalidades, sobre a possibilidade de declaração do Estado de Sitio e, em resposta, este órgão não se mostrou favorável.
Os argumentos levantados sugerem que o órgão pode estar a minimizar o caos resultante da crise pós-eleitoral, embora, no fim, sem fazer referência ao Estado de Sítio, tenha reconhecido que o país está instável por conta de partidarização dos órgãos eleitorais e sugerido uma saída futura que passe pela “despartidarização” e “profissionalização” dos órgãos eleitorais.
“O órgão considerou que a crise pós-eleitoral desafia o Estado moçambicano a levar a cabo reformas profundas como forma de evitar que, no futuro, tais actos voltem a suceder. Para o efeito, foi proposta a revisão atempada e inclusiva da lei eleitoral, devendo incidir sobre questões tais como a despartidarização e profissionalização dos órgãos de gestão eleitoral, bem como a adopção de medidas conducentes à promoção de transparência e credibilização dos processos eleitorais”, lê-se no comunicado do órgão, que não mostra nenhuma solução para a crise de hoje. Aliás, sugeriu no parágrafo seguinte que as Forças de Defesa e Segurança (FDS) devem recorrer a força apenas nos casos de necessidade, devendo privilegiar o dialogo.
Encurralado e isolado … Nyusi esculacha Comissão Política
Segundo apurou o jornal Evidências, o Conselho do Estado não foi o primeiro órgão para onde Filipe Nyusi colocou à mesa os seus ensaios de possíveis soluções para a crise pós-eleitoral, que encontrou no venancismo uma nova forma de pressão à Frelimo e seu governo, causando danos incalculáveis à sociedade em geral, tanto na economia na escalada macro, assim como na micro-economia, chegando a dimensão das famílias.
A Comissão Politica já foi abordada e não se mostrou favorável. Entre as razões, o jornal apurou de fontes do partido que o receio prende-se com o sempre presente fantasma de perpetuação do poder, mas Nyusi já disse que não está cansado e que não pretende continuar no poder. Aliás, voltou a reforçar este discurso no encontro que teve semana finda com jornalista onde de forma peremptória que “não quero”, assumindo que não seria em dois ou mais que conseguiria fazer o que não conseguiu em 10 anos.
Aliás, dentro deste órgão, de acordo com a nossa fonte, Nyusi explicou que seu desejo é criar condições para que o processo de transição ocorra sem agitação e deixar este fardo com Daniel Chapo, declarado vencedor pela Comissão Nacional das Eleições (CNE), e que continua a liderar essa posição na contagem do Conselho Constitucional (CC) que semana passada explicou ter essa prerrogativa de cruzar e rever os números mesmo com certas correntes sociais terem referido que este órgão não tem essa prerrogativa. A contagem do CC consiste na comparação dos editais da CNE com os de partidos políticos.
Receios do terceiro mandato minam toda e qualquer boa intenção do PR
A colocação de Nyusi foi debalde. Os receios de que ela possa recorrer a esta prerrogativa constitucional para perpetuar o seu consulado podem estar por detrás dessa rejeição da Comissão Politica, a nível do partido, e do Conselho do Estado.
Aos poucos, com a evolução da manifestação pacifica para violenta, com registos de entradas suspeitas sem verificação rigorosa nas fronteiras, num contexto de um Estado que enfrenta terrorismo mais a norte, incluindo, num outro campo, a morte de inocentes pelas mãos de policia e não só, os requisitos para declaração do Estado de Sitio vão sendo preenchidos.
Entre as soluções que, agora, não acolhem consenso no partido consta o dialogo com Venâncio Mondlane. Na sessão da Comissão Politica desta segunda-feira, Filipe Paunde e Maragarida Talapa não deram apoio a Nyusi quando colocou a prerrogativa de insistir e falar com Venâncio Mondlane, uma prerrogativa que fracassou quando foi colocada para um dialogo a quatro. O único que encorajou foi Aires Ali, mas Nyusi, com ares de desgaste, referiu que não a partilhar para ter aprovação. “Podia ter falado e vocês ver no jornal e me saudarem”, esculachou Nyusi.
Estado de Sítio abriria espaço para limitação de direitos
A luz da Constituição da República (CR), no artigo 282, estado de sítio ou o estado de emergência só podem ser declarados, no todo ou em parte do território, nos casos de agressão efectiva ou eminente, de grave ameaça ou de perturbação da ordem constitucional ou de calamidade pública. A declaração do estado do sítio ou de emergência é fundamentada e especifica as liberdades e garantias cujo exercício é suspenso ou limitado.
Adiante, na CR lê-se que a menor gravidade dos pressupostos da declaração determina a opção pelo estado de emergência, devendo, em todo o caso, respeitar-se o princípio da proporcionalidade e limitar-se, nomeadamente, quanto à extensão dos meios utilizados e quanto à duração, ao estritamente necessário ao pronto restabelecimento da normalidade constitucional.
No decurso de Estado de Emergência, que não deve exceder os trinta dias prorrogáveis por três vezes, pode “podem ser tomadas as seguintes medidas restritivas da liberdade das pessoas:
a) obrigação de permanência em local determinado; b) detenção; c) detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns; d) restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão. e) busca e apreensão em domicílio; f) suspensão de liberdade de reunião e manifestação; g) requisição de bens e serviços.
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