População de Balama sente-se seduzida e abandonada pela empresa que explora grafite e também pelo governo

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  • Prometeram-nos muita coisa quando chegaram, mas não entendemos porque motivo lhes é difícil cumprir- Régulo de Balama, Mualia Issa
  • A mineradora só volta a operar depois de nos pagarem os 120 mil meticais por hectare de compensação pelas nossas terras” – Tobias António, representante das famílias que reivindicam compensação.

 

A população do distrito de Balama em Cabo Delgado, norte de Moçambique está visivelmente insatisfeita com a empresa TWIGG EXPLORATION AND MINING LIMITADA, subsidiária da SYRAH RESOURCES LIMITADA, que explora a mina de grafite na região. A população acredita que os investimentos em benefício da comunidade feitos pela empresa mineira, estão longe do que foi prometido aquando da chegada da empresa em 2011.A população sente-se defraudada. As suas expectativas eram maiores. O governo moçambicano também é alvo de críticas por parte da comunidade de Balama. O governo é acusado de posicionar-se do lado da empresa mineira e não defender os interesses da população.

Desde o mês de Setembro de 2024, a mina suspendeu as suas operações. A população não permite que a mesma opere normalmente, sem que antes as suas demandas sejam satisfeitas.

Membros da comunidade ouvidos em Balama pelo MOZTIMES, juram que a empresa que explora a mina de grafite não está a cumprir com o que prometeu fazer para as populações locais. Segundo um contrato assinado entre a TWIGG EXPLORATION AND MINING LIMITADA e o Governo moçambicano em 2018 a que o MOZTIMES teve acesso, a concessionária mineira comprometeu-se em investir USD 4 milhões de dólares no período de 5 anos em benefício da comunidade de Balama.  O contrato de concessão assinado entre o governo moçambicano e a empresa mineira tem a duração de 25 anos período em que se prevê que sejam investidos USD 15 milhões em benefício das comunidades locais. Segundo informação fornecida pela empresa mineira ao MOZTIMES, a mesma garante ter investido USD 4,1 milhões em várias iniciativas de desenvolvimento comunitário entre 2017 e 2024. A empresa diz ter reforçado meios de subsistência e de ter investido nas áreas de saúde, educação e infra-estruturas.

Contudo, ao que tudo indica, os investimentos em iniciativas comunitárias feitos pela empresa mineira estão longe de satisfazer as expectativas da comunidade de Balama.

Segundo o Régulo de Balama, Mualia Issa, a empresa mineira não está a cumprir com as promessas feitas a comunidade. “Prometeram-nos muita coisa quando chegaram, mas não entendemos porque motivo lhes é difícil cumprir até hoje”, disse o Régulo de Balama ao MOZTIMES.

O Régulo Mualia Issa recua no tempo até 2011, e lembra que os primeiros estrangeiros que estiveram no local para fazer o estudo da terra disseram que a população de Balama era abençoada por causa da grafite. “Uma brasileira e um australiano vieram levar amostras de grafite para testes de qualidade e disseram-nos que a nossa terra era abençoada”. disse cheio de nostalgia Mualia Issa. Mas a bênção não é vivida pela populão de Balama.

O Régulo Mualia Issa garante que a empresa mineira fez várias promessas a comunidade local que ainda não cumpriu. Segundo Mualia Issa, foi prometido a comunidade local a massificação da energia elétrica, a construção de escolas, de hospitais, de estradas e contratação de moradores locais pela empresa. Contudo, o Régulo de Balama disse ao MOZTIMES que, “desde 2018 a empresa só construiu três escolas primárias, pintou uma unidade sanitária, distribuiu viveiros de cajueiros aos camponeses, construiu uma estrada e uma barragem em Chipembe”. No entanto, Mualia Issa fez questão de lembrar que a referida barragem e a estrada que parte da Estrada Nacional Número 14 até ao local de extracção de grafite, foram construídas no interesse da mineradora visto que facilitam o escoamento da grafite.

Mas segundo informação disponibilizada pela empresa mineira ao MOZTIMES, a mesma  indica que no período entre 2017 e 2024 foram feitos investimentos em benefício da comunidade de Balama. A informação na nossa posse destaca a abertura de 17 furos de água subterrânea feitos e a expansão da linha elétrica na Localiade de  Ntete em 2018. Em 2020 a empresa mineira diz ter investido num programa avícola com mais de 400 pintos. Para o ano de 2023, a empresa mineira destaca as obras complementares do bloco cirúrgico do Hospital Distrital de Balama e do mercado central grossista.

De acordo com o Régulo Mualia Issa, os investimentos em benefício da comunidade  referenciados pela TWIGG, não foram executados correctamente  e alguns nem sequer foram finalizados. “Não vimos nenhuma construção de furos feita pela TWIGG aqui em Balama. A expansão da rede elétrica para Ntete não trouxe resultados, não há energia aqui nem mesmo no hospital da localidade.”, disse Issa.

 O líder comunitário garantiu que as obras do   bloco operatório do Hospital Distrital de Balama e do mercado central grossista ainda não estão terminadas. Como também disse não terem visto nenhum programa de criação de pintos proporcionado pela TWIGG.

O Régulo Mualia Issa, defende que a concessionária mineira devia investir mais no sector da Educação e Saúde. Segundo disse ao MOZTIMES, no distrito de Balama há poucos centros de saúde e os que existem estão em visível estado de degradação. Também lamentou o facto de o distrito ter só uma escola secundária.

 O Director interino da Escola Básica de Mpaca, Abílio Torres Manuel, disse ao MOZTIMES que na Localidade de Mpaca no distrito de Balama, existe apenas uma escola primária e que cada sala de aula comporta entre 130 a 150 alunos. “Temos falta de mais escolas e de salas de aula na nossa localidade. A Escola Básica de Mpaca é a única da localidade e as salas comportam entre 130 150 alunos por sala, mas por vezes esse número é ultrapassado”, referiu Abílio Manuel.

 Manuel lembrou que salas de aulas com número excessivo de alunos é uma realidade em quase todo o distrito.

Outro facto referenciado pelo director interino da Escola Básica de Mpaca, foi uma alegada relação entre o facto do distrito ter só uma escola secundária e o aumento de casamentos prematuros. “O nosso distrito tem apenas uma escola secundária, o que influencia no aumento de casos de casamentos prematuros porque a escola não está próxima para todos alunos no que leva a  desistências depois da passagem para o ensino secundário” afirmou o director Interino da Escola Básica de Mpaca.

De acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) de 2019-2023 publicado em junho de 2024, o distrito de Balama possui cerca de 210. 358 habitantes, tem 62 escolas primárias e uma escola secundária. A taxa de analfabetismo é 66,06%.

O mesmo relatório refere ainda, que o distrito tem apenas oito unidades hospitalares para mais 200 mil habitantes.

Gregório Ramadan Gustavo, ex-funcionário da TWIGG, residente na localidade de Ntete, distrito de Balama, também juntou a sua voz ao corro de lamentações pelas promessas não cumpridas pela empresa mineira. “No princípio dos nossos encontros com a empresa TWIGG, disseram que a nossa vida mudaria para o melhor, mas o que estamos a viver está distante do que foi prometido”, disse Gustavo a reportagem do MOZTIMES

Segundo Gregório Ramadam Gustavo, a empresa mineira prometeu prover de energia elétrica a unidade hospitar de Ntete mas até agora isso não foi feito. “A única coisa que se fez foi colocar um fio de média tensão para o acesso a energia no hospital, mas até hoje não há energia no hospital”, Gregório Gustavo.

Um cidadão que falou ao MOZTIMES na condição de anonimato, disse que no distrito de Balama não há capacidade para atender doentes em estado grave, nos casos em que o tratamento envolva procedimentos cirúrgicos, os doentes são transferidos para os distritos de Montepuez ou Namuno. O referido cidadão disse que depois de sofrer um acidente de motorizada, ficou três dias internado no Hospital Distrital de Balama a espera de uma ambulância para transportar para o Hospital Rural de Montepuez. Em Balama só estão disponíveis duas ambulâncias para os mais de 200 mil habitantes.

 No distrito de Balama, a reportagem do MOZTIMES também procurou saber do impacto na vida da comunidade dos fundos que legislação moçambicana estabelece que o governo deve transferir para as comunidades hospedeiras de concessões mineiras e petrolíferas. A Lei de Minas (lei nº 20/2014) no seu artigo 20 preconiza que 2,75% do imposto sobre a produção mineira e petrolífera deve ser destinado a programas de desenvolvimento das comunidades das áreas onde se localizam os respectivos empreendimentos.

No entanto, em Balama o impacto dos fundos transferidos pelo governo não é sentido pela população.

O líder da localidade de Nkwide disse ao MOZTIMES que a acção do governo limita-se a tentar persuadir a população a permitir que a empresa mineira explore a mina de grafite livremente.

O Relatório da Iniciativa de Transparência da Indústria Extractiva em Moçambique (ITIEM), publicado em Março de 2024, pelo Centro de Integridade Pública (CIP), refere que o governo transferiu para comunidade de Balama 2,30% dos fundos legalmente previstos, num processo que iniciou em 2021.  

Apesar dos esforços, a reportagem do MOZTIMES não conseguiu obter uma reacção das autoridades locais sobre o destino dado aos fundos transferidos pelo governo para a comunidade de Balama, ao abrigo da Lei de Minas.

 

 

 

 

 

Exigência de compensações justas leva ao encerramento da mina de grafite

Desde o mês de Setembro de 2024, que populares que exigem compensações justas pelas suas terras cedidas a empresa mineira paralisaram as actividades de mineração. Foi exactamente a 9 de Setembro, que membros de 800 famílias decidiram acampar junto a mineradora, em Nkwide, como forma de protesto contra o que consideram terem sido “compensações injustas pelas suas terras”. Este protesto levou ao encerramento das actividades da mineradora.

Entre 2014 e 2016, a empresa TWIGG Exploration and Mining Limitada, pagou a cada família 63 mil Meticais por hectare como compensação pela cedência de terras para a exploração de grafite no distrito. Segundo disse o Régulo de Balama, Mualia Issa, ao MOZTIMES, “entre 2014 e 2016 várias famílias das aldeias de Ntete, Pirira, Muapé em Ntete, no distrito de Balama, receberam o valor de 63 mil Meticais por um hectare de terra valor que consideram irrisório”.

No entanto, vale a pena lembrar que as reivindicações das referidas famílias têm suporte no facto de, segundo o Régulo de Balama, em 2022 outra parte dos camponeses ter recebido 240 mil Meticais por hectare como compensação pelas terras cedidas à mineradora. “É por causa desta diferença que as famílias estão aqui desde 9 de Setembro, exigindo que a empresa as pague um valor de 120mil Meticais por hectare a cada família” explicou ao MOZTIMES o Régulo de Balama.

Tobias António, representante dos camponeses que protestam disse a nossa reportagem que no grupo dos protestatários, também estão famílias que viram as suas terras ocupadas pela mineradora sem que tenham recebido a devida compensação. “Em 2022 a empresa vedou terras de alguns camponeses, mas não os compensou por isso”, disse Tobias António a reportagem do MOZTIMES.

Segundo Tobias António, a mineradora disse que precisa de operar pelo menos quatro meses para efectuar o pagamento das compensações exigidas pelas famílias.  “A empresa diz que não está em condições de pagar as famílias actualmente, porque não está a operar. Por isso, pediram-nos que operem quatro meses e depois irão pagar as compensações” explicou Tobias António.

Contudo, Tobias António, disse que as famílias camponesas não irão ceder a exigência da mineradora e só permitirão que a mesma recomece as operações depois que lhes forem pagos os valores das compensações.

No dia 15 de Abril, a Comissão Distrital de Reassentamento (CDR) notificou aos camponeses que protestam para indicassem representantes para a composição de uma equipe de negociação. A carta assinada pelo presidente da CDR, Ermelindo João Augusto, propõe uma “resolução definitiva das reclamações dos camponeses”.

No entanto, até agora o diferendo mantém-se e os camponeses apoiados por membros do grupo paramilitar denominado Naparamas, reforçaram as barricadas na sede da mineradora impedindo qualquer operação desta.

População exige readmissão de trabalhadores expulsos

Outra das reivindicações da população de Balama para que a mineradora volte a operar normalmente é a readmissão de trabalhadores locais, expulsos por supostamente reivindicarem melhores condições de trabalho. Os trabalhadores expulsos em 2022 por supostamente reivindicarem melhores condições de trabalho, relataram ao MOZTIMES situações de injustiça de que são vítimas os trabalhadores originários de Balama.  

Os antigos trabalhadores da empresa de exploração de grafite, TWIGG Exploration and Mining, no Distrito de Balama, Cabo Delgado, disseram ao MOZTIMES haver disparidade nos salários pagos pela mineradora, em claro prejuízo para os que são originários do distrito de Balama. Os trabalhadores recrutados localmente estão na cauda da tabela salarial vigente, muito baixo dos oriundos de outras regiões do país e dos expatriados.  

Segundo informações fornecidas à nossa reportagem, os trabalhadores locais auferem um salário mensal de 7 mil Meticais muito abaixo dos mais de 40 mil Meticais que a mineradora paga mensalmente aos oriundos de outras regiões e aos expatriados.

Bernaldito Bernado Luís, disse ao MOZTIMES que a maior parte trabalhadores recrutados em Balama são classificados como tendo somente o ensino elementar (7ª Classe), mesmo que tenham concluído o ensino médio (12º). “Apesar de alguns trabalhadores terem completado o ensino médio (12a), foram colocados na lista dos funcionários do ensino elementar por isso têm esse salário”, disse Bernaldito Luís.

O nosso interlocutor que disse ter sido expulso da mineradora em 2022 por fazer parte de um grupo de trabalhadores que, supostamente reivindicava melhores condições de trabalho, disse que apesar dos trabalhadores locais exercem a mesma actividade, correrem os mesmos riscos e terem a mesma carga horária, a diferença salarial é abismal.

Bernaldito Luís, também disse o MOZTIMES que os trabalhadores locais não contam com um plano de saúde, apesar de também estarem sujeitos aos mesmos riscos de saúde dos seus colegas oriundos de outras paragens.

“Estamos todos expostos aos mesmos perigos, às mesmas poeiras, aos mesmos riscos de saúde, mas só alguns têm plano de saúde. Isso não é justo”, acrescentou Bernaldito.

Tobias António, trabalhador local também expulso em 2022 e que actualmente representa os trabalhadores que reivindicam readmissão na mineradora, disse a nossa reportagem que depois de muito reivindicarem aos trabalhadores oriundos de Balama passou a ser atribuído regionais 1500 meticais mensalmente para despesas de saúde.

“Até agora os trabalhadores locais não têm um plano de saúde, mas por causa das reivindicações que fizemos em 2022 a empresa passou a pagar 1500 meticais mensalmente para cobrir as despesas de saúde” disse António que lembrou que o referido valor está muitos abaixo dos 200 mil Meticais anuais que a mineradora paga aos trabalhadores oriundos de outras regiões e estrangeiros pelo plano de saúde.

Contactada pelo MOZTIMES, a empresa TWIGG fez saber que mantém uma política de remuneração “estruturada, transparente e baseada no desempenho”. A mesma negou a os salários sejam estabelecidos com base na origem dos trabalhadores.

“A TWIGG possui uma política de remuneração objetiva, garantindo que os salários sejam estabelecidos com base na avaliação do mercado, nos requisitos do conjunto de competências e na complexidade do trabalho independentemente da origem, nacionalidade ou localização geográfica do colaborador.”, lê-se na nota enviada pela mineradora ao MOZTIMES.

A empresa acrescenta que realiza revisões salariais anuais com base em relatórios externos e promove igualdade de género nas remunerações.

No entanto, os dados constantes da folha salarial da TWIGG publicada pelo Ministério do Trabalho, Emprego e Segurança Social em 2018, parecem dar razão os trabalhadores locais e desmentir a mineradora. O documento confirma que a maioria dos trabalhadores locais recebe salário correspondendo ao ensino técnico elementar (ETE). Por outro lado, o mesmo documento confirma que trabalhadores oriundos de outras regiões e os expatriados recebem salários significativamente mais elevados.

 A TWIGG Exploration and Mining Limitada (“TWIGG”) desenvolve as suas operações de mineração na maior reserva mundial de Grafite. A implantação do projecto da Mina de Grafite de Balama, localizada na província de Cabo Delgado, distrito de Balama em Moçambique, foi concluída no final de 2017 e as operações iniciaram em 2018. A TWIGG Exploration & Mining é uma subsidiária integral da Syrah Resources Limitada, uma empresa listada na Bolsa de Valores da Austrália. (NM)

 

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