É NATAL..

OPINIÃO

Afonso Almeida Brandão

(Com amizade à pintora Leonor Veiga, cuja obra admiro e acompanho)

Percebemos que a vida tem mesmo graça quando mal abrimos os olhos pela manhã e nos lembramos de uma coisa que nos apetece imenso fazer. Dispensamos aquele período de “terra de ninguém”, em que ainda de olhos fechados tentamos perceber se está claro lá fora, se chove ou faz sol. Eis que saltamos da cama em dois segundos e logo pomo-nos a assobiar. Não interessa a natureza do programa — pode ser o dia em que vamos dar a volta ao Mundo ou simplesmente aquele em que temos a certeza que o carteiro nos vai trazer uma carta. Agora, nesta época de Natal, basta acreditar que um dos anjinhos do Pai Natal veio buscar o envelope que lhe deixamos ao pé da chaminé, na noite de 24 para 25. O importante é ter expectativas, acreditar que aquele dia vai ser diferente do anterior e, se possível, ainda melhor. Precisamos de expectativas, é a conclusão a que cheguei, e de surpresas — até porque para haver surpresas é preciso gente que nos saiba surpreender e isso é o melhor de tudo.

Tenho a memória (ou será só a sensação?) de que as notícias e os acontecimentos eram saboreados, um de cada vez — o primeiro dia de aulas de cada ano, a manhã em que o ratinho tinha deixado uma moeda por troca de um dos nossos dentes, a chegada de um primo, o primeiro dia de férias de natal, o natal, a manhã em que esperávamos que o feijão plantado no dia anterior já chegasse ao Céu, como o da história. Um casamento, preparativos e tudo, dava para mais dois meses… E mal “acabávamos” um acontecimento, começávamos a antecipar o próximo, marcado já no calendário. As coisas más também duravam muito mais — as separações, as brigas, a morte e o luto. Mas tudo isto foi há 60 anos.

Agora consumimos as sensações muito mais depressa. Só temos tempo para pensar no Natal, na véspera e se a nossa mãe não nos telefonar a lembrar esquecemo-nos dos nossos próprios anos. As semanas passam a correr e se a ida ao dentista já não nos dá noites a fio de pesadelo — graças às anestesias, é verdade, mas também ao facto de não podermos desperdiçar muito tempo a remoer no assunto — também a chegada de um amigo é “despachada” com um jantar apressado, porque amanhã toda a gente se tem de levantar cedo.

Tudo isto só significa um desafio à imaginação, temos de inventar mais surpresas por minuto — para nós próprios e para os outros — ou reinventar as antigas.

Não diga que não é capaz, porque basta ver o que faz a Publicidade. Sempre que julga que mais ninguém vai inventar uma maneira de o fazer tirar os olhos da estrada, das páginas de texto de uma Revista ou de um qualquer Jornal, do Livro que lê em frente da Televisão, há alguém que descobre uma maneira de o fazer olhar.

Basta transportar, para o dia-a-dia e para as relações com os outros, a imaginação dos criativos de marketing e vai ver que salta todos os dias da cama com outro entusiasmo. Se suspeitasse que na sua caixa de correio, em lugar daquela papelada toda a anunciar os preços nos supermercados, estava uma torrada feita só de partes do meio, com um bilhete apaixonado do seu namorado (ou do marido), ou ainda flores dos seus admiradores pela artista de eleição, que é a Amiga Leonor, ou simplesmente um exemplar de um Jornal ou de uma Revista de Arte, diga se não dispensava o despertador?

Em último caso, compre um daqueles calendários do Advento — até aí a imaginação dos designers gráficos chegou, e agora, por trás de cada janelinha, há um chocolate ou um brinquedo, porque já ninguém se levanta só para ver qual era o desenho desse dia.

Chegados aqui, só me resta terminar a desejar aos nossos leitores, aos nossos anunciantes, assinantes e prezados colegas de redacção e colaboradores efectivos, em geral, um Feliz Natal e um Ano Novo Próspero para 2022. E à pintora Leonor Veiga, igualmente, os meus votos de BOAS FESTAS!

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