Estado Islâmico reivindica primeiro ataque terrorista em Nampula

POLÍTICA
  • Novas incursões dos insurgentes mostram alguma mudança de estratégia
  • Ataque a Nangade durante a visita do Chefe do Estado

Os terroristas, que parecem estar a mudar de estratégia, alastrando as suas incursões para novos distritos da província de Cabo Delgado, voltaram, na semana finda, a gerar alguma preocupação ao atacar, pela primeira vez em cinco anos, a província de Nampula. O ataque que sugere que o grupo pode estar a dispersar as Forças de Defesa e Segurança (FDS) e seus aliados estrangeiros – que se encontram concentrados nas vilas que tradicionalmente tem registado ataques – ocorreu na vila de Lúrio, no distrito de Memba, no passado dia 17 de Junho, e foi reivindicado pelo Estado Islâmico através das suas redes sociais.

Evidências

Depois de no princípio deste ano terem gerado preocupação ao protagonizar uma série de ataques a algumas aldeias do distrito de Mecula, nordeste da província de Niassa, os terroristas voltaram a fazer soar os alarmes ao mudarem o seu foco para regiões que nunca antes haviam sido visada, dentro e fora de Cabo Delgado.

Na semana finda, concretamente no passado dia 17 de Junho, os insurgentes atravessaram, mais uma vez, as fronteiras de Cabo Delgado e atacaram pela primeira vez a província moçambicana de Nampula.

A porta de entrada foi a vila de Lúrio, no distrito de Memba, onde, ao seu estilo característico, decapitaram um civil e alvejaram um comerciante local que, de acordo com as últimas informações, continuava em franca recuperação.

Para além dos episódios de terror, os insurgentes, que entraram em Lúrio durante a madrugada, saquearam comida e outros bens de comerciantes e população local. As autoridades não confirmaram a acção.

No entanto, nos seus canais de redes sociais, o Estado Islâmico, ao qual o grupo tem declarado estar filiado, publicou uma declaração reivindicando a responsabilidade por decapitar um civil e roubar mercadorias.

A situação gera uma preocupação, numa altura em que as Forças de Defesa e Segurança, em conjunto com as tropas do Ruanda e SAMIM, se encontravam a flanquear os focos de guerrilha que se registam nalguns distritos a sul de Cabo Delgado.

Não se sabe se a incursão dos insurgentes em Nampula visa incluir aquela província no mapa do terror ou foi um episódio isolado do grupo que tem estado a ser empurrado do norte de Cabo Delgado. No entanto, nestes quatro anos, têm sido recorrente a invasão dos insurgentes a aldeias para saquearem comida e bens, tal como aconteceu em Memba.

Desde o início da insurgência, em Outubro de 2017, a grande maioria dos incidentes violentos está concentrada em Cabo Delgado. Em Dezembro de 2021, uma breve ofensiva insurgente em Niassa viu cinco pessoas mortas e várias sequestradas, mas desde Janeiro que não se registava um ataque fora de Cabo Delgado.

Ataque a Nangade e Ancuabe após visita do Presidente Nyusi

Em Cabo Delgado, segundo alguma imprensa, os insurgentes continuam a marchar rumo a sul, enquanto a temida força ruandesa consolida o controlo do eixo Mocímboa da Praia-Palma, epicentro dos maiores projectos de gás natural do país.

Na última semana, os insurgentes mostraram alguma ousadia ao atacarem o distrito de Nangade, precisamente no momento em que o Presidente da República, Filipe Nyusi, encontrava-se de visita àquele distrito para se inteirar dos esforços da força da SAMIM estacionada naquele ponto do país.

De acordo com a Zitamar News, enquanto Filipe Nyusi visitava Nangade, depois de ter passado por Ancuabe, Macomia, Mueda e Muidumbe, os terroristas mataram pelo menos cinco pessoas em vários ataques lançados perto da sede do distrito. Aliás, segundo fontes, ocuparam a aldeia de Ngangolo, na estrada Nangade-Mueda, pouco menos de 20 km ao sul da sede.

Já em Ancuabe, outro ponto escalado pelo Presidente da República, os terroristas atacaram, no último sábado, pela quarta e quinta vez, respectivamente, as aldeias Nanoa e Nikwita, a poucos quilómetros da sede do distrito de Ancuabe, segundo escreve o portal Carta de Moçambique.

Ministra assume existência de Polícias infiltrados que vazam informações aos terroristas

Já não surpreende o envolvimento dos membros da Polícia da República de Moçambique (PRM) nos roubos, sequestros e até assassinatos, mas a sua folha de serviço ao crime parece cada vez interminável.

Na semana passada, a ministra do Interior, Arsénia Massingue, confirmou o que já se suspeitava. Há agentes da polícia moçambicana que colaboram com os insurgentes, fornecendo-lhes informação sobre as posições das autoridades.

Arsénia Massingue, que falava à margem de uma visita àquela província martirizada desde 2017, não revelou nomes e nem entrou em detalhes, mas considera como sendo um comportamento e “práticas” que devem ser erradicadas.

“Os espinhos [do ofício] são esses que estamos a criar, quando temos desvios de comportamento, quando não temos sigilo profissional e saímos para informar o inimigo onde está a nossa força”, referiu a governante, durante uma parada policial realizada semana finda.

Na mesma ocasião, a ministra foi criticada em relação a inúmeros aspectos da actuação policial, face à gravidade da indisciplina dos agentes, sobretudo na capital provincial Pemba, por oposição aos que estão na frente de combate.

“Estão lá a dar o seu melhor, a dar o seu máximo, a sacrificarem as suas vidas por nós que estamos aqui a meter-nos em situações de indisciplina, a participar em casos de rapto, em desvios de comportamento totalmente contrários ao nosso juramento. Vamos deixar de ser corruptos, indisciplinados, preguiçosos e faltosos ao trabalho. Estas práticas devem morrer e ser sepultadas, não daqui a oito, nem trinta dias, é morrer e acabou. Não faz sentido”, sublinhou.

O apelo da ministra foi também dirigido a agentes da Unidade de Intervenção Rápida (UIR) que em pleno teatro operacional abandonam o posto para irem beber.

“Continuamos a falhar quando elementos da Unidade de Intervenção Rápida, que deviam estar no campo de batalha, no lugar de sacrificarem as suas vidas para combater o terrorismo, saem da linha e vão beber, viram bêbados. Não faz sentido que um membro da Unidade de Protecção de Altas Individualidades abandone o seu posto e permita que as residências dos dirigentes sejam assaltadas”, disse, ameaçando-os de expulsão.

Massingue criticou ainda a falta de recolha de informação em Cabo Delgado, permitindo “que um bandido se acomode nos bairros e planifique as suas incursões”, deixando, assim, as comunidades vulneráveis.

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