- Aviso à navegação: Depois do ANC perder Pretória, MPLA perde em Luanda
- Eneas Comiche não correspondeu às expectativas e a Frelimo pode perder a capital
- MPLA perdeu vergonhosamente em Luanda para a UNITA
- Eleitorado de Luanda e Maputo tem as mesmas características. Jovem e exigente
As eleições da semana finda em Angola confirmaram, mais uma vez, a crise a que se encontram mergulhados os movimentos de libertação ao nível do continente africano. Apesar da vitória, segundo dados oficiais, o MPLA teve os piores resultados da sua história, perdendo por isso a maioria qualificada na Assembleia Nacional, passando dos actuais 150 deputados para 124, enquanto a coligação Frente Patriótica Unida, liderada pela UNITA, que na presente legislatura tem apenas 51 deputados, ganha mais de 40, prevê-se que venha a ter mais de 90 mandatários. Mas, a maior derrota para o MPLA foi em Luanda, capital do país, onde pela primeira vez o partido no poder perdeu com 26% por cento, contra 62% da UNITA. De resto, ao nível da região, não é a primeira capital de um país onde o partido governamental não ganha uma eleição, tendo se registado o mesmo na África do Sul, onde o ANC não ganha em Pretória desde 2016, o que faz soar os alarmes na cidade de Maputo, numa altura em que é quase consensual que a aposta em Eneas Comiche, em 2018, com uma governação completamente apagada, foi um erro de casting, que pode penalizar a Frelimo nas autárquicas de 2023.
Reginaldo Tchambule
A Angola encontra-se mergulhada numa crise pós-eleitoral, na sequência da contestação dos resultados por parte do maior partido da oposição, apoiado por movimentos cívicos que se tem manifestado de diversas formas, depois que a Comissão Nacional de Eleições (CNE) divulgou, na última quinta-feira, resultados provisórios que revelaram uma apertada vitória para o MPLA, com apenas 51% dos votos, enquanto a UNITA seguia com 44,05% dos votos, quando estavam escrutinadas 97,3% das mesas de voto.
Com os resultados até aqui projectados, o MPLA vai eleger 124 deputados, menos 26 que os actuais 150, ou seja, vai perder a maioria classificada de dois terços na Assembleia Nacional. Por sua vez, a UNITA ganha cerca de 40 assentos parlamentares, passando dos actuais 51 para mais de 90 deputados.
Ainda não há data para a divulgação dos resultados definitivos, estando neste momento aquele país irmão a enfrentar uma tensão pós-eleitoral, na sequência da contestação da UNITA, que alega ser o vencedor do escrutínio.
Este Domingo, o líder da UNITA, Adalberto Costa Júnior, garantiu terem já sido submetidas reclamações junto das Comissões Provinciais de Eleições, dias depois da Comissão Nacional de Eleições ter admitido que é possível os resultados eleitorais serem alterados após a averiguação das reclamações do maior partido na oposição.
Mas a maior derrota para o MPLA foi ter perdido pela primeira vez na capital Luanda, onde não foi para além de 33 por cento dos votos, enquanto a UNITA foi arrasadora, até nas zonas onde vive a elite do partido no poder, contando até a última actualização com mais de 62 por cento de votos.
Um sério aviso à Maputo depois de Luanda e Pretória

Com a vitória na cidade de Luanda, a UNITA elege três deputados naquele círculo eleitoral, mais um que o MPLA elege somente dois, o que representa uma vitória histórica da oposição na capital do país numa altura em que está em cima da mesa uma proposta de implantação de autarquias pela primeira vez em Angola.
Equivale isso dizer que se por acaso o projecto de implantação de autarquias municipais a partir do próximo ano, como prometeu no seu primeiro mandato o presidente João Lourenço, tendo havido, inclusive, consultas e troca de experiência com Moçambique, há fortes probabilidades da UNITA ganhar as eleições e formar o primeiro governo municipal da capital angolana.

Para além da Capital, a UNITA leva também vantagem em Zaire e em Cabinda, um enclave onde está instalada a indústria petrolífera, que é a par dos diamantes o coração da economia angolana.
Esta não é a primeira vez que um partido da oposição ganha de forma convincente as eleições na capital do país, ao nível da região austral de África. Em Agosto de 2016, o partido governamental na África do Sul sofreu uma derrota histórica ao perdeu pela primeira vez desde o fim do apartheid a maioria absoluta e o controlo da autarquia de Pretória a favor da Aliança Democrática.
No município de Tshwane, que engloba Pretória, a Aliança Democrática obteve naquele ano 43,1% dos votos, contra 41,2% para o ANC, que até agora tinha maioria absoluta na cidade.
A Pretória juntou-se a outras metrópoles daquele país, como Joanesburgo (capital económica), Cidade do Cabo e Porto Elizabeth, agora governadas por presidentes de municípios oriundos da oposição. Até então, o ANC tinha ganhado todos os sufrágios por maioria absoluta, desde as primeiras eleições democráticas do país, em 1994.
No Zimbabwe, em 2018, o partido governamental, ZANU-PF e seu candidato Emmerson Mnangagwa, registou uma derrota histórica na capital económica daquele país vizinho, Blantyre e em Março deste ano, as eleições intercalares foram um verdadeiro pesadelo para O ZANU-PF, que foi suplantado pelo partido Coligação de Cidadãos para a Mudança (CCC), de Nelson Chamisa, que venceu em 19 dos 28 círculos eleitorais em disputa. O CCC também conquistou 61% dos votos nas eleições para os governos locais em vários municípios urbanos e rurais.
Eneas Comiche: Um erro de casting que pode custar caro à Frelimo na Cidade de Maputo
A derrota do MPLA, que vem confirmar a onda de resultados favoráveis à oposição nos grandes centros urbanos, com particular destaque para as capitais, revela uma nova tendência eleitoral que faz soar os alarmes na cidade de Maputo, numa altura em que é quase consensual que a aposta em Eneas Comiche, em 2018, que está a ter uma governação completamente apagada até agora, foi um erro de casting, que pode penalizar a Frelimo nas autárquicas de 2023.
Faltam pouco menos de 14 meses para as eleições autárquicas agendadas para 11 de Outubro de 2023 e as atenções dos moçambicanos e do mundo estarão centradas na cidade de Maputo, que tem praticamente as mesmas características dos eleitores de Luanda, que, na semana passada, decidiram penalizar o MPLA nas urnas pela má governação.
É que neste momento reina uma onda de descontentamento generalizado dos munícipes da capital do país com o executivo do já octogenário edil Eneas Comiche, que vendeu a ilusão de que voltava para Txunar Maputo, mas parece estar perdido em combate, sobretudo no que diz respeito à guerra contra os buracos, pois a pouco mais de um ano para o fim do mandato contam-se com os dedos de uma palma de mão as vias com asfalto em condições.
Neste momento, Comiche aposta pessoal de Filipe Nyusi nas eleições internas de 2018, que abriram feridas profundas no seio da família Frelimo, depois do afastamento estranho de Samora Machel Júnior da corrida, não só não está a conseguir Txunar Maputo, como também está a perder todas as guerras que prometeu lutar, a começar pela falhada retirada dos vendedores nos passeios da baixa da cidade.
Na tomada de posse, Eneas Comiche, que tinha antes governado a cidade de Maputo entre 2003 e 2008, prometeu melhorar as condições de vida nos bairros, abrindo mais acessos, expandido a iluminação pública e a rede de abastecimento de água e organizando a prática do comércio informal.
No terreno, nada disso está a ocorrer e as zonas de expansão como Ka-Tembe, por exemplo, os problemas de ordenamento territorial são gritantes, ao mesmo tempo em que ainda persistem problemas de acesso à água potável, energia eléctrica ou iluminação pública, muito por conta da fraca ou inexistente infra-estruturação dos bairros, grande parte dos quais não estão parcelados e não tem ruas devidamente abertas.
Como se tal não bastasse, a edilidade, no tempo de Eneas Comiche, só entregou até o momento 750 metros de estrada, na Rua de São Paulo, a qual vai se juntar dentro de dias o troço passagem de nível – Praça dos Combatentes, na Rua da Linha, um projecto iniciado no consulado de David Simango e que há anos estava encalhado.
Mas as promessas não cumpridas não param por aí. De quando em vez, o governo municipal tem nos brindado com algumas promessas, algumas algo inusitadas, como é o caso do Sistema de Transporte Suspenso, designado FUTRAN, cujas obras, o executivo de Comiche havia prometido que deveriam ter iniciado em Setembro de 2021, mas até hoje não há nenhum sinal das referidas obras.
Outra promessa que continua por cumprir é a implantação de infra-estruturas urbanas, precisamente para a construção do aterro sanitário, previsto para KA-Tembe, e desactivação da Lixeira de Hulene; para além da requalificação do Distrito Municipal de KaTembe, que neste momento está a ser talhado de forma informal. Até o momento, nada justifica a aplicação do pacote de 100 milhões de dólares desembolsados pelo Banco Mundial para esta rubrica.
Esta extensa lista de pecados de Eneas Comiche, que até agora, a um ano e dois meses do fim do mandato não conseguiu Txunar Maputo e acabou se tornando na maior desilusão de sempre para os munícipes, poderá penalizar grandemente a Frelimo e seu candidato nas urnas nas próximas eleições autárquicas, agendadas para 11 de Outubro de 2023.
No entanto, como bóia de salvação, o município de Maputo acaba de receber um financiamento de 250 milhões de dólares do Banco Mundial para a concretização do sistema de mobilidade urbana denominado BRT, um velho calcanhar de Aquiles da edilidade desde o primeiro mandato de David Simango, o que poderá ser usado para a campanha eleitoral.

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