Custo das viaturas está acima do permitido aos governadores e outros titulares de órgãos públicos

DESTAQUE POLÍTICA
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  • Gratidão aos mentores da eleição à 100 % chega em tempos de crises
  • Pode ser a preparação da marcha rumo ao cada vez certo terceiro mandato

A oferta de carros de luxo, com um custo acima do tecto permitido aos dirigentes e titulares de órgãos públicos e de soberania, para o secretariado do Comité Central, primeiros secretários do Comité Provincial e da Cidade de Maputo, está a gerar uma forte polémica e a expor a insensibilidade do Presidente da Frelimo, Filipe Nyusi, cujo governo vem justificar falta de recursos para acomodar as reivindicações das várias classes dos funcionários públicos que exigem melhor enquadramento na reforma em curso na função pública. Na semana passada, Nyusi procedeu a entrega de 17 viaturas, com um custo total de quase 200 milhões de meticais, justificando que foram as contribuições dos membros do partido.

Evidências

As luxuosas viaturas foram entregues aos seus beneficiários no último sábado, à margem do Seminário de Indução dos membros dos Secretariados dos Comités Central e Provinciais, que decorreu na Escola Central do partido Frelimo, no município da Matola, província de Maputo.

Enquanto a sociedade gere, com especial preocupação, as ameaças de greves dos professores, médicos, enfermeiros, juízes e outras classes dos funcionários do Estado, que se queixam de salários de fome após injustiça no enquadramento da Tabela Salarial Única, a Frelimo, o partido que suporta o Governo e se confunde com Estado e se serve do mesmo (Estado, óbvio), presenteou, através do seu Presidente, que é simultaneamente da República, Filipe Nyusi, os primeiros secretários provinciais do partido no poder, o seu secretário-geral, os membros do Secretariado do Comité Central e a secretária do Comité de Verificação do Comité Central, com viaturas luxuosas de alta cilindrada, cujo custo supera de longe o tecto definido para os órgãos do Estado.

São 11 viaturas da Marca Toyota, modelo Land Cruiser Prado VX, avaliadas, cada, em mais de nove milhões de meticais, oferecidas aos primeiros secretários provinciais, e seis viaturas da marca Nissan, modelo Patrol V8, avaliadas, cada, em quase nove milhões, oferecidas aos membros do Secretariado do Comité Central.

As viaturas da marca Nissan Patrol V8 foram entregues a Roque Silva (Secretário-Geral), Ana Comoana (Secretária do Comité de Verificação do Comité Central), Ludmila Maguni (porta-voz do partido), Iasalde das Neves, João Muchine e Sónia Macuvele. Já as da marca Toyota Land Cruiser Prado VX foram entregues a Artur Nanlicha-Muchopa (Niassa), José Kalime (Cabo Delgado), Luciano de Castro (Nampula), Paulino Lenço (Zambézia), Gonçalves Gemusse (Tete), Tomás Chitlango (Manica), Luís Nhanzonzo (Sofala), Daniel Matavele (Gaza), Avelino Muchine (Maputo Província) e Razaque Manhique (Maputo Cidade).

Frelimo mostra quem manda nas províncias

Em matemática, a Frelimo investiu um total de 155.100.000,00 Meticais para a aquisição daqueles meios circulantes, um valor suficiente para pagar uma média de 17.709,5 salários mínimos na Administração Pública, ou dar dois passos no fracassado projecto um distrito – um hospital, uma promessa cuja simulação de materialização foi feita na Ponta do Ouro, em 2019, mas que bastou ganhar as eleições não mais lembrou de dar seguimento.

A ostentação que hasteia o poderio financeiro do partido, que não raras vezes suga das contas do Estado e de empresas participadas dirigido por quadros que inundam as televisões com discursos de falta de dinheiro, é feito num momento em que o Estado se queixa de falta de recursos para viabilizar projectos essenciais que são parte das suas promessas governativas.

E foi com a desculpa de falta de dinheiro que, em 2017, simulou uma política de austeridade, que estipulava, de acordo com 7 do Decreto n.º 75/2017, de 27 de Dezembro, que define que os Limites Máximos de Valores para Aquisição de Viaturas Protocolares, um tecto de 2.500.000,00.Mt.

Para outros titulares fora dos arrolados no decreto acima, o tecto está abaixo de seis milhões. Mas o mesmo não se assiste com os membros da Frelimo, que com a nova dignidade parecem estar acima dos titulares públicos. Mas há quem acredita que estas oferendas estejam inseridas no âmbito do tão propalado golpe do terceiro mandato, que parece estar a ser ensaiado pela ala Nyusi.

Numa província, por exemplo, ficará evidente o fosso entre os governadores e secretários de Estado. É como se a Frelimo estivesse a mandar, por exemplo, a mensagem de quem manda nas Províncias.

Nyusi justificou que os meios resultam do esforço dos membros e simpatizantes do partido, mas há quem suspeita que resultem do saque aos cofres públicos e empresas participadas pelo Estado, como tem sido apanágio.

Durante a entrega, apelou aos beneficiários a fazer bom uso deles, centrados na busca de crescimento quantitativo e qualitativo do Partido, guiados na base de uma visão de sustentabilidade política, económica e financeira do Partido.

Garantiu que, no futuro, o projecto irá abranger também os primeiros Secretários Distritais e os Secretários-Gerais das organizações sociais do partido, naquilo que é tido como compra de consciências.

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