Velhos problemas, mesmos líderes 

EDITORIAL

As cheias eram previsíveis. E a comunidade em geral foi comunicada para ficar em alerta, mas tudo indica que o Instituto Nacional de Gestão e Redução do Risco de Desastres (INGD) esteve à leste desta comunicação e agiu como quem foi encontrado em contrapé. Reuniu-se à última hora, em meio a prantos de famílias desesperadas, para saber como responder e acolher as vítimas das inundações. Uma ilustração cristalina de que fora dos períodos de emergência o INGD não existe e que a prontidão que sempre propala não passa de um discurso vazio.

 

Na sexta-feira, quando passavam na televisão e nas redes sociais imagens arrepiantes de famílias que tomavam a refeição numa residência inundada de água até a cintura, noutra casa uma corrente de água misturada com fezes a sair da sanita para outros compartimentos, misturando-se a das ruas onde se lavam inocentes crianças e adolescentes sem noção do perigo, sem falar das imagens de isolamento de comunidades no Sul da província de Maputo, o INGD sentava, pela primeira vez, para discutir as necessidades que o colocariam em condições de assistir as vítimas das inundações.

 

Nessa altura, apenas a boa vontade de pessoas de bem que se mobilizaram com os seus barcos a motor e motos de água para salvar as pessoas é que fazia diferença. Aliás, até hoje, a mão firme do INGD não é vista no terreno, onde iniciativas variadas de voluntariado garantem e asseguram a assistência necessária às vítimas das intempéries.

 

No final, como se de uma surpresa se tratasse, constatou que não tinha meios suficientes, uma resposta que chegou depois de vários voluntários se juntarem. Até sábado, a informação oficial era de que foram salvas 15 mil pessoas, mas que existia mais lugares a serem verificados, porém a falta de meios aéreos limitava o braço acolhedor do INGD. O INGD de hoje é incapaz de mobilizar meios aéreos? É o “INGC” de ontem era capaz de chegar em qualquer ponto do País para prover ajuda às pessoas em situação de emergência.

 

Esta é uma outra faceta que traz à luz os crónicos problemas deste País. A pergunta que não quer calar é o quê afinal está a ser bem feito nosso País no que diz respeito a gestão que se entende como a capacidade de antecipar soluções? Estamos a questionar a nível micro a resposta dada às vítimas das inundações, mas podíamos discutir a nível macro o que teria sido feito para garantir que as cíclicas chuvas nessa época não causam tremendos estragos.

 

É que, no município da Matola por exemplo, apesar de todo o barulho e dos danos que pequenas chuvas causam, as estradas que estão a ser construídas continuam a ser feitas nos mesmos moldes em que eram há 20 anos, sem drenagens e com qualidade de resistência ainda pior. Os locais sinalizados impróprios por constituir passagem de água são depois vendidos para projectos milionários. As poucas drenagens que existem, até na cidade de Maputo, servem de lixeiras e nem quando se aproxima o período chuvoso alguém pensa em limpar para não obstruir a circulação de água. É como se as lideranças criassem todas condições necessárias para ampliar danos, mas para quê? Comover doadores?

 

Muitos dos nossos problemas não são resolvidos pelo simples facto de falta de vontade política. A incompetência de parte dos nossos dirigentes é palpável. Não se procura num dirigente a versatilidade de dominar tudo, apenas a sensibilidade e a capacidade de não ser ladeado por bajulardes, mas de bons profissionais nos diferentes sectores.

 

Há sim sectores que precisamos criar, renovar e pensar mais acima da média para trazer uma resposta inteiramente moderna, mas para os desafios estruturais que actualmente se colocam como o calcanhar de Aquiles para nossa sociedade, o caminho da sua solução já foi feito, no passado e actualmente noutros países. Só precisamos importar como temos feito com as nossas leis. Precisamos importar a cultura de responsabilizar os maus gestores e são muitos.

 

A aprovação das massas, que são o povo, não só deve funcionar nas urnas. Um ministro de Transportes e Comunicações cuja exoneração foi aplaudida pela opinião pública retorna para ser acomodado numa empresa pública.

 

Uma ministra da Educação que conseguiu acumular todos os escândalos inaceitáveis num sector tão sensível como a gestão do saber é mantida porque tem um conforto político forte. A culpa pode não ser dela, mas a continuidade dos erros e outros escândalos são indicador de que é incapaz de lhe dar com os culpados. Responsabilização não é colocar na cadeia. No INGD temos a vergonha que temos e ninguém diz nada. Até os doadores já denunciaram a corrupção, mas não há responsabilização política porque judicialmente se conseguiu exibir bodes expiatórios. Nas dívidas ocultas, foi mais do mesmo. Até em Cabo Delgado, deixaram impunes os que prometeram acabar com o terrorismo em três dias, transformando o Estado num mentiroso. Enquanto a justiça condenava em massa, o terrorismo só aumentou.

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