“Não há nenhuma reflexão que se pode fazer em torno das eleições distritais”

DESTAQUE POLÍTICA
  • Presidente da Renamo nega ser marionete de Nyusi
  • “Os que apareceram a minha frente e fizeram promessas são os doadores”
  • Momade assume que deu ordens para não se encerrar última base, porque algo não vai bem
  • “O Banco Mundial pode estar a alimentar corrupção, através do Sustenta”

O presidente da Renamo, Ossufo Momade, abriu-nos as portas da sua casa, semana passada, para uma conversa de hora e meia. Em discurso directo, começa por responder àqueles que alegam que foi cooptado pela Frelimo. “Não fui comprado”, garante, mas esclarece que chegou a receber propostas dos camaradas e não aceitou. Em relação aos que alegam que são quatro anos de um vazio de ideias, Momade diz que a única coisa que não fez é pegar nas armas. Numa altura em que o Presidente da República, Filipe Nyusi, tem insistido num projecto pessoal que visa o adiamento das eleições distritais em 2024, tendo já anunciado uma comissão que vai liderar uma reflexão nacional, Momade vinca com firmeza que “não há nenhuma reflexão que se pode fazer em torno das eleições distritais”, até porque a Renamo, enquanto actor relevante, nunca foi contactada, estando somente a ouvir rumores de uma pretensão que, para Ossufo Momade, é particular de Filipe Nyusi e não dos moçambicanos.

Nelson Mucandze e Reginaldo Tchambule

Nas entrelinhas, o presidente da perdiz diz que o ocidente não pode pensar que no mundo existam duas democracias e acusa a Frelimo de patrocinar Sandura Ambrósio, Vitano Singano e companhia para desestabilizarem o partido. Sobre a suspensão do DDR após a falha na desmobilização da última base, assume que deu ordens aos combatentes para que pudessem permanecer naquela base, “porque alguma coisa não está bem” e culpa a comunidade internacional por não estar a cumprir as promessas que fez durante as negociações. Pelo meio, denuncia que o Banco Mundial pode estar a alimentar a corrupção através do Sustenta. Acompanha, a seguir, os excertos mais importantes da entrevista em que passa um certificado de incompetência a Filipe Nyusi por aquilo que chama de “desgovernação” nos últimos oito anos.

São quatro anos a frente de uma formação política que sempre esteve associada à figura de um líder histórico. Pode nos falar dos desafios que encontrou e o que tem estado a fazer?

É um desafio estar em frente de um grande partido como a Renamo. Os desafios são vários na medida em que quem criou o partido já tinha por volta de 30 e tal anos e aparecer alguém que nem um dia de governação tinha, é muito difícil. Mas a primeira coisa que nós fizemos foi nos encontrarmos para reestruturar o próprio partido, fazer com que pudéssemos avançar juntos para as eleições autárquicas que estavam a nossa frente.

Podiam existir vozes e grupos, mas a nossa tendência nessa altura era de unir a família, trabalhamos na organização do próprio partido, porque nós queríamos ganhar as eleições autárquicas. Sabem que cada cidade e cada vila tem seus problemas.

Então tínhamos que fazer esse exercício, para que pudéssemos ter um manifesto eleitoral para cada autarquia, não foi fácil. Conseguimos através da criação dos gabinetes eleitorais e na altura tínhamos que preparar a formação dos fiscais para o recenseamento que estava à porta, preparar os delegados das candidaturas que estariam nas mesas de votação. Mas todos sabemos, em África, nem todos guardam na legalidade. Nós fizemos todo trabalho e esperávamos vencer em várias autarquias e a imprensa acompanhou devidamente a infracção que aconteceu no terreno. Nalguns municípios tínhamos vencido, mas pela força da Polícia da República de Moçambique e outras forças não conseguimos governar.

“Estávamos preparados para ganhar o maior número de autarquias”

Olhando para esse desafio concreto, conhecendo a realidade nossa, houve preparação do partido para contornar a máquina da fraude?

– Nós nos preparamos para aquilo que é a regra geral da democracia, mas quando outros aparecem usando as forças armadas, estou a falar das forças polícias, a regra do jogo muda. Se nós déssemos resposta, dentro daquilo que é a nossa capacidade e poderio militar, não teríamos esta paz que temos hoje. Talvez eles queriam que isso acontecesse, mas não caímos na armadilha deles. Vocês acompanharam tudo quanto aconteceu em Mutarara, Marromeu e Alto Molócuè. Já viu a polícia aparecer com sua viatura a carregar às urnas. Que resposta nós poderíamos dar nessa altura? Se nós usássemos as nossas forças não teríamos esta paz. Quando nós vamos as eleições não preparamos pessoas armadas, contamos com eleições livres e transparentes.

Está querer dizer que há outros que vão armados?

Sim. Para dizer que é um desafio, até ontem estava com o directora-geral do Instituto Democrático Nacional para a África  Austral e Ocidental e falamos sobre isso e ela disse que testemunhou em outros países africanos esse tipo de comportamento. Nós estávamos preparados para podermos ganhar o maior número em todas as autarquias.

Diante desse cenário que já é cíclico e tendo em conta que este ano vamos novamente a eleições autárquicas, de que forma a Renamo está a preparar-se para imprimir maior controlo em todas fases das eleições?

– A nossa primeira preocupação neste momento é nos organizarmos em termos de recursos. Neste momento temos recursos, embora o desafio agora seja cobrir 65 autarquias. É sabido que nas eleições autárquicas, o Estado não financia os partidos e isto é lamentável, na medida em que o partido no poder é um partido Estado e recorre aos recursos do Estado, resultantes dos nossos impostos. Por isso é que pedimos a sociedade civil e os parceiros da cooperação para que possam rever esta situação, porque não podemos ir a eleições enquanto estamos desequilibrados em termos orçamentais.

Segundo, já iniciamos a preparação dos fiscais do recenseamento e dos jovens para estarem nas mesas de votação, como delegado de candidatura, mas para isso precisamos de recursos. São 45 dias para o recenseamento das autarquias e nesses 45 dias os fiscais têm de que estar na mesa, tendo pequeno almoço, almoço e subsídio, para além de que tem que deixar alguma coisa para entregar aos seus familiares. Se o Estado estivesse a financiar essas eleições, nós teríamos recursos para colocar os nossos jovens fiscais nas mesas de votação e condições para o processo todo. Com todo descontentamento que estamos a viver no país, se as eleições forem livres e transparentes, a Renamo vai ter muitos municípios.

“O ocidente não pode pensar que no mundo exista m duas democracias”

Com essas limitações todas já referenciadas, acha que a Renamo estará em condições de assegurar o controlo de todo o processo eleitoral, desde o recenseamento até às urnas nas 65 autarquias?

– Em todos encontros que nós temos tido com os parceiros, sobretudo ocidentais, apelamos para não trazerem poucos observadores e estes não podem ficar na cidade da Beira, Maputo e Nampula, devem ir até aos confins, porque na cidade de Maputo a Frelimo nunca vai criar problemas, porque sabe que toda imprensa e todo corpo diplomático está sediada lá.

Devem ir lá em Marromeu, lá no Gurué onde a Frelimo vai faz e desfaz. Nós dizemos aos nossos irmãos que querem ajudar Moçambique que não podem pensar que no mundo existem duas democracias, ou seja, uma democracia para África e Democracia para Europa. A Democracia tem que ser global, para dizer que nunca podem aparecer em Moçambique e dizer que aquele problema não afecta o processo.

Foi anunciada recentemente a criação de novas autarquias, num momento em que as existentes mostram deficiência no seu funcionamento. Até que ponto é sustentável aumentar 12 novas autarquias?

– Eu penso que a descentralização é necessária e temos de avançar. É obrigação do Governo central alimentar esses municípios, para que tenham capacidade de poder resolver problemas dos seus munícipes.

Em algum momento, há um aproveitamento político, o Governo não manda dinheiro para depois mobilizar pessoas para fazer chantagens. Quem faz tumultos é a própria Frelimo. Fazem essas brincadeiras para desacreditar a governação da Renamo, mas à população moçambicana está atenta, porque eles estão a governar o país já há mais de 40 anos e não conseguiram resolver os problemas sociais, mas nesses municípios que nós estamos a governar, estamos a resolver aquilo que eles não conseguiram.

“Dizer que não fizemos nada, não é verdade… o que não fizemos é pegar nas armas”

Há, nalguns círculos, a percepção de que os quatro anos em que está a frente dos destinos da Renamo, foram de um total vazio de ideias, inclusive há um reputado jornal da praça que escreveu assim. O que acha dessas vozes? Quer aqui nos recordar de algumas das principais realizações?

– (Risos) Para dizer que desde 2018 até 2022 não fizemos nada é preciso serem pessoas que colocam trapo em sua frente e não conseguem ver o trabalho feito pela Renamo. Pessoas que tem vontade de ver verão esse trabalho. O partido nunca ficou parado e vocês tem visto eu a deixar a cidade de Maputo para ficar três meses nas províncias a formar politicamente os nossos quadros, formar politicamente os nossos jovens, a nossa liga da mulher, para saberem o que devem fazer dia após dia.

Temos estado a mobilizar a nossa população para ter uma visão diferente. Esse é um trabalho que estamos a fazer, portanto, apostar na reestruturação do partido e capacitação dos quadros. Isso é muito essencial nesse momento.

Em termos concretos, o que pode se avançar de palpável?

– Nós quando assumimos a liderança, encontramos uma situação em que tínhamos bases militares. A negociação, quem iniciou não foi Ossufo Momade, foi o presidente Dhlakama. Por duas vezes que Nyusi foi a serra reunir com Dhlakama. Para dizer que esse processo que está a acontecer foi o presidente Dhlakama que iniciou, ele dizia na altura que já não queria mais guerra, não havia necessidade de fazer a guerra, porque já tínhamos feito para ter a democracia e o sistema multipartidário. Quando voltou para a serra não foi para fazer a guerra, mas o próprio regime militar lhe atacou e não tinha como, tinha que responder. Então para dizer que nós realizamos o nosso projecto, a liga da mulher está a trabalhar, recentemente estava em Cabo Delgado e Nampula.

A liga da juventude está na África do Sul numa conferência regional, já realizamos conselhos nacionais, conferências províncias e nacionais da juventude. Os que estão a dirigir a juventude não são os que dirigiam antes, não porque foi feita uma retaliação, é a vontade de todos órgãos do partido. Temos a liga da mulher, também está a fazer as suas actividades. Na frente diplomática, nós temos trabalhado e temos tido encontros com os embaixadores acreditados em  Moçambique e outros organismos internacionais. Metade deles já reuní com eles nesta sala.

Portanto, dizer que não fizemos nada, não é verdade, o que não fizemos é pegar nas armas. Há muitos que tem esse princípio de que fazer política é disparar. No meu caso, eu tenho dado exemplo de Angola, Cabo Verde e São Tomé, que depois de terem realizado a guerra civil, não precisaram mais de armas. Se nós entrarmos nesse jogo, vão dizer “ahaaa porque aqueles só sabem disparar, etc, etc”. Mas a nossa população está cansada, se nós queremos encontrar um caminho que possamos avançar todos é uma reconciliação. Nós sabemos que há provocações do outro lado para voltarmos a guerra, mas preferimos aguentar o que estamos a passar, para que possamos avançar.

Ossufo Momade acusa Frelimo de patrocinar Sandura Ambrósio e companhia

Desde que assumiu a liderança do partido tem se multiplicado movimentos internos de contestação a sua figura. Como é que o líder consegue gerir esse descontentamento?

– Essas vozes nunca vão parar. Hoje como ontem, apareceram essas vozes. A Junta de Salvação Nacional não foi no tempo de Ossufo Momade. Quando foi criado o PDD, quando foi criado o MDM, não foi no tempo de Ossufo Momade. Foi no tempo do presidente  Dhlakama, portanto, sempre vão existir essas vozes. Nalgum momento é o próprio regime da Frelimo que cria essas condições. Hoje, estamos a acompanhar aquele da Beira … Quem é? Sandura nem? A dizerem que “ahah temos que realizar congresso”, mas nós realizamos congresso e ainda não temos cinco anos, como é que vamos realizar um congresso antes de completar o nosso mandato? E ele que fez congresso é da Renamo?

Eles identificam-se como sendo da Renamo.

– Não é identificar-se, o que está em causa é que não pode aparecer uma mulher e dizer que é tua mulher, enquanto nunca estiveram juntos. Até pode ter estado contigo e depois ela viu que não dá certo, foi arranjar outro marido, vai continuar com ela?

Claro que não.

– Foi isso que aconteceu com ele, ele estava connosco, criou aquele problema na Beira, quando ele queria ser delegado a força. O problema é que as pessoas não vão atrás dos nossos estatutos, ficam em casa e começam a desenhar aquilo que pensam que pode ser. Quando realizamos o congresso, fizemos estatutos e temos que respeitar. Se alguém quer uma coisa, que espere que o congresso seja realizado para mudar aquilo que achar pertinente.

Este grupo aparece nas vésperas das eleições, colocando em causa a liderança da Renamo, naquilo que chamamos de ritual de autoflagelação. Como líder da Renamo, já tentou sentar  com essas vozes e saber qual é o seu descontentamento e ver se dá para gerir ou não ?

– Mas como é que eu vou reunir com alguém que não é da Renamo? Vou procurar o quê da parte dele? Eu vou reunir com Vitano que já foi do PDD, do MDM e aparece hoje e diz que as coisas não estão bem. Ele já não é da Renamo. Diziam que o Ossufo não podia ir à montanha, arranjaram um argumento de que Ossufo foi amarrado, eles estavam connosco? Em que momento eu fui amarrado?

Ossufo assume que deu ordens para não se encerrar última base, porque algo não vai bem

Afinal o que aconteceu realmente naquele dia?

Festejamos até amanhecer com nossos guerrilheiros. Na entrada da montanha, encontramos aquela população que nos recebeu. Eu não fui lá porque alguém me mandou, fui lá para persuadir os meus combatentes para que pudessem permanecer naquela base, porque alguma coisa não estava bem (no DDR), agora quem podia me amarrar? Há uma coisa que alguns não sabem. Aqueles combatentes que estão lá, alguns saíram das minhas mãos, estiveram comigo durante anos. Eu dirigi aqui na zona sul. A minha base aqui se chamava Lundo. Dirigi na província de Manica e Nampula.

Quem fez a abertura da Frente de Nampula fui eu em 1983 no dia 3 de Maio. Agora quando eles dizem os generais me amarraram, é possível um general amarrar um outro general? É aquilo que eu disse, outra vez, numa entrevista que eu fiz com a Media Mais TV, que o Nhongo nunca vai atacar a minha base, porque eu conheci Nhongo quando eu fui à província de Nampula. O Nhongo era um elemento simples, nem arma tinha, para ter arma automática foi através do nosso trabalho.

Para dizer que eu fui lá convencer e persuadir aqueles combatentes, não foram eles que me pediram para ir para lá. Nunca fui amarrado. Mas essas vozes vão continuar a acontecer porque comem à custa do regime, o regime não tem uma mensagem que pode convencer a população por isso procura comprar esses.

Falou aqui dalgumas acções para tornar os órgãos do partido mais fortes, é possível medir nesse momento esse trabalho? Porque para haver, nalgum momento, o triunfo desse movimento, há um terreno que está a ser explorado dentro da própria Renamo…

– Eu penso que o nosso trabalho tem grande valia, na medida em que nós colocamos as vitórias na nossa frente, sabe porquê? Quando nós visitamos um distrito, temos registado aquela aproximação da população que a Frelimo chama de massas. As pessoas vem de livre e espontânea vontade, não como aqueles que carregam pessoas de um lado para o outro para fingirem multidões. Nos nossos comícios, as pessoas não ficam ali porque podem receber refrescos.

As pessoas querem uma aproximação, por isso temos ficado pouco tempo aqui e muito tempo lá, porque é onde tem o nosso voto. Agora alguém que fica aqui só a falar, não tem nenhum membro, eu de outra vez disse que queria desafiar o Yaqub Sibindy, que vamos lá para as províncias, cada um para de um lado para ver quem terá mais aglomerado na sua posição. Sibindy na prática não tem nada.

Quando o Vitano apareceu a dizer que eu fui preso na serra, estava acompanhado pelo secretário-geral do PIMO. Não acham estranha a coincidência de alguém que diz que tem um partido e depois aparece com um secretário-geral de um partido? É sinal de que comungam e desenharam juntos estratégias para destruir a Renamo. Esse plano para destruir a Renamo não está a começar hoje, desde o tempo do presidente Dhlakama. O Sibindy intitula-se sobrinho de Dhlakama, mas nunca colaborou com o Presidente Dhlakama, sempre tentou criar problemas nessa altura e esse problema continua, para dizer que ele é um agente SISE.

“Não é governação é desgovernação”

Como é que olha para a governação do Presidente Nyusi nestes últimos anos?

– Não é governação é desgovernação, na medida em que a sociedade está desgastada, todo mundo está revoltado, o custo de vida está insuportável e não há poder de compra. Não temos saúde, os hospitais têm que ter medicamentos, bom atendimento e camas. O cidadão quando entra lá deve ter uma assistência condigna. Não temos estradas, podemos falar da EN1, mas outro dia vi patos a nadarem. Isso espelha este desgoverno. O povo gostaria de ter água potável, há uma semana aqui mesmo na cidade de Maputo não havia água e até hoje acompanhei os citadinos a reclamarem em relação a água turva que não dá para o consumo, temos a situação da TSU que está a contrariar as expectativas que o Governo deu aos moçambicanos. Isso tudo mostra como o Governo falhou.

Nós sabemos que na função pública todos esperavam que a TSU fosse resolver os seus problemas e ficaram frustrados, sobretudo porque iniciaram a receber novos salários, o que levou as pessoas a irem aos bancos para pedirem empréstimos e, no meio da caminhada, recebem uma machadada. Este mês passam a receber os salários que recebiam antes. Isto está a revoltar os funcionários do aparelho do Estado. Para dizer que estão a desgovernar e não há nenhuma informação clara em relação a aquilo que está acontecer.

Eles colocaram uma lei na AR e a lei foi aprovada e quando pensaram em reduzir os salários não foram a AR, e temos a questão das Assembleias Provinciais, a AR aprovou para que pudessem ter salários, mis recentemente acompanhei pelo Conselho de Ministros que não podiam ter salários porque recebem por recebem via senha de presença, isso é uma grande violação.

E isso e viola um dos acordos com a Renamo no âmbito da descentralização…

– Claramente. A Assembleia Provincial não vai ter salário, mas a Assembleia Municipal vai ter salário. Para dizer que são situações que desanimam a nossa população. Está aí o Sustenta, está a sustentar o regime e não a população. Eu já viajei a Niassa, Nampula, Zambézia, na altura procurava saber quem havia recebido os tractores e ninguém apareceu ou estamos a repetir o erro dos 7 milhões e são os próprios camaradas que recebem. Por isso nós vamos atrás do Banco Mundial, porque está a alimentar a corrupção, porque tendo facilidade de poder fiscalizar, está a fazer vista grossa.

“Não há nenhuma reflexão que se pode fazer em torno das eleições distritais”

O Presidente da República, numa iniciativa pessoal, tem insistido numa reflexão sobre a revisão da Constituição para o adiamento das eleições distritais. Como é que olha para a preocupação particular do Presidente Nyusi em mudar algo que foi acordado com a Renamo?

– Não há nenhuma reflexão que se pode fazer em torno disto. Isto foi um acordo. Temos que avançar com isto, não há nenhum partido que pode vir criar condições de nós recuarmos e nós como parte nunca fomos contactados, estamos a acompanhar estes comentários, mas ninguém veio ter connosco. O nosso posicionamento é que temos que avançar porque é que isto que vem na Constituição.

O que nos agrada é que dentro da FRELIMO aparecem vozes a dizerem que não há razão para isso. Esse é um projecto pessoal do próprio Nyusi e não é dos moçambicanos. Diz que isto não é sustentável, quando formos para o referendo, o referendo não vai gastar dinheiro?

E quando eles criaram os secretários de Estado era sustentável? Porquê numa única província há dois dirigentes? Para dizer que não há razão para recuarmos. Esta é a descentralização. Queremos o administrador com seus poderes, não administrador nomeado, aquele que vai prestar as contas a sua governação.

Há alguns meses foi denunciado um alegado desvio de 12 milhões nas verbas alocadas ao seu gabinete. Confirma este saque? Já houve responsabilização?

– Eu próprio não sei se alguma vez aconteceu esse desvio. Em nome de Allah nunca acompanhei. Eu vi no jornal e eu desprezei. Nós apresentamos as contas ao Ministério das Finanças é nunca recebemos uma notificação de estarmos a faltar com a apresentação das contas. O que acontece é, eu nomeio alguém para cumprir uma certa actividade, o cessei e indiquei um outro chefe para que pudesse dirigir. Em nenhum momento foi porque desviou fundos do partido.

Acompanhei pelo jornal e foram pessoas de má fé que querem ver a liderança da Renamo fragilizada. Não é uma pessoa alheia que pode saber o que está acontecer dentro da nossa casa, porque se tivesse acontecido seríamos nós que havíamos de anunciar esse roubo. Quem é o quadro do partido que veio a público dizer que houve um roubo? São especulações. É uma desinformação só para nos desacreditar, porque uns dizem 12 e outros dizem 8, 19. Nós não temos esses 12 milhões.

“Os que apareceram a minha frente e fizeram promessas são os doadores”

Presidente, afinal o que foi acordado e o que está a falhar no processo de DDR?

– Nós quando estávamos na serra da Gorongosa, recebemos vários diplomatas e eles prometiam criar condições para aqueles que fossem desmobilizados pudessem encontrar base de sustentabilidade nas suas aldeias. Trouxeram uma proposta que cada um tinha que escolher a área que queria explorar quando fosse a vida civil.

Há uns que escolheram ser pescadores, agricultores, mecânicos, comerciantes, entre outros. Cada um escolhia aquilo que pensava que havia de ajudar quando fosse a vida dele. E também disseram que cada desmobilizado teria a sua pensão. Nós concordamos com isso e ficamos com aquela expectativa que o nosso combatente quando fosse a vida civil teria a sua situação resolvida. Mas não é o que aconteceu hoje.

Nós conseguimos desmobilizar 16 bases. Essa é a boa vontade que temos, para não pensarem que queremos a guerra. A pensar que um dia iam resolver aquilo que prometeram, que um dia ia se materializar tudo aquilo que deixaram lá como promessa. Estavam todos lá, o Mirko Manzoni está. Ele é que é a pessoa que está a frente dessas promessas. Por isso no ano passado dissemos que a última base não seria desmobilizada porque queremos que eles cumpram com as promessas que estavam lá no terreno.

Está a culpar principalmente os doadores. E da parte do Governo?

– Eu é que me esqueci de dizer, os diplomatas, são esses doadores.

Estamos a dizer que quem tem maior responsabilidade nesse processo neste momento são os diplomatas e não o Governo?

OM – Não sei se estou a fazer entender, mas os que apareceram a minha frente e fizeram promessas são doadores, mas a responsabilidade daquelas pensões é do governo. Como acompanharam noutros anúncios a dizer que eles tinha na mente que tinha grande responsabilidade de resolver este problema. Não são doadores que vão pagar as pensões, é o Estado moçambicano e é sua obrigação pagar.

Onde vão buscar nós não sabemos, mas é obrigação deles resolver os problemas daqueles desmobilizados.

Em Dezembro, o Presidente da República trouxe um novo desafio que tem a ver com a sustentabilidade. Nas conversas que tem com Presidente da República tem sentido o mesmo compromisso de quando se estava para assinar os acordos?

– O Governo nunca tem sustentabilidade para resolver qualquer problema do país. Sempre recorre aos parceiros de cooperação. Nós pensamos que para este assunto eles vão fazer o mesmo. Há possibilidade, desde que haja boa vontade do governo. As portas estão abertas para que possam dar alguma coisa. Eu tenho esperança que um dia vai acontecer. No último encontro que eu tive com o Mirko Manzoni, representante do secretário-geral das Nações Unidas, ele dizia que quando estava na Suíça recebeu um telefonema do Presidente da República para que pudessem avançar e havia possibilidade de dentro de dias aprovar-se o decreto das pensões. Isto para mim é um alívio porque nós queremos que este assunto termine. É um ano eleitoral e nós queremos virar a nossa atenção ao censo eleitoral.

Neste processo do DDR chegou-se a falar de algum nepotismo e viciação das listas. Quer comentar um pouco sobre esta acusação de que podem ter sido incluídas nas listas pessoas que não faziam das mesmas?

Isso não é verdade, são mentiras na medida em que não foi Maputo que fez as listas. As entrevistas foram feitas nas bases elo Estado Maior General. Nem eu como comandante em chefe fiz parte.

Talvez podemos mudar um pouco a questão. A Renamo, a nível central, terá ouvido algumas queixas ou relatos vindos das províncias?

– Estou a dizer que a responsabilidade de entrevista em relação ao DDR  foi a partir do Estado Maior. Há um episódio que aconteceu em Mocuba em que quando estávamos a desmobilizar chegou-me a informação que há um sujeito que estava lá mas imediatamente a tentar jogadas e nós não permitimos que aquilo acontecesse. Nós não permitimos, porque nós somos sérios.

Se eu fosse oportunista havia de usufruir porque eu fiquei lá um um ano e três meses, mas não. Ninguém na minha família está no DDR. A minha mulher vinha até lá ficava comigo dois a três meses, podia também reivindicar isso, mas nós não queremos envolver a corrupção no nosso ser.

Muitos foram desmobilizados e mandados voltar às suas zonas de origem e ao não terem as devidas pensões e assistência não terão alguns desses desmobilizados regressado as fileiras? Qual é o estado de espírito dos desmobilizados neste momento?

– Meu irmão, os nossos desmobilizados tem disciplina. Eles sabem o que estamos a fazer. Pode aparecer alguém com seus interesses e pensar que os desmobilizados vão virar as costas a nossa liderança, não é verdade. Eles sabem que nós estamos a trabalhar para que possamos resolver os seus problemas. Eles sabem que dia e noite estamos a trabalhar com a comunidade internacional para que possamos resolver esta situação. Fui até a serra de Gorongosa para mostrar que nós estamos juntos com eles.

Dizem que Ossufo foi comprado. Eu não fui comprado, na é hoje que sou presidente do partido que a Frelimo vai me comprar. Sabe, os primeiros homens que chegaram em Maputo depois do Acordo Geral de Paz fomos nós: Raul Domingos, Ngonhamo, Ossufo Momade e José de Castro. Saí daqui e fui viver na minha terra natal Nampula, sem subsídio, sem nada naquela altura. E porquê que eu não fui comprado naquela altura?

A Frelimo não precisava comprar Ossufo? Um general de três estrelas. Mas nunca aconteceu. Apareceram alguns da FRELIMO a tentar me convencer que todos tenentes-generais já estavam no parlamento e eu estava a ser excluído. Aquele que veio ter comigo eu perguntei se a FRELIMO já estava toda ela no parlamento? Para dizer que não é hoje que dirijo o partido e quero ser Presidente da República que vou aceitar comer migalhas e deixar de comer na mesa. Isso é covardia.

“Eu não fui me encontrar com os partidos para criar coligação”

Saindo um pouco do assunto do DDR, vamos falar um pouco das bases que lançou sobre a coligação. Em que fase está este processo? Pensa em avançar ou ainda está na fase de auscultação?

Meu irmão, eu não fui me encontrar com os partidos para criar coligação, mas sim como o líder da oposição a minha obrigação é de aproximar dos partidos da oposição, ouvir deles qual é o pensamento em relação ao País e encorajar a eles para que possamos avançar. Depois fui ter com o presidente do MDM. Para a coligação é um processo longo.

O que orientou a escolha de somente 18 extraparlamentares?

Eles mostraram vontade, mas também vamos realizar para mais partidos.

O que pensa enquanto líder face à crítica de que a oposição não se faz sentir em Moçambique e não é séria?

– Eu já ia falar deste ponto. Pensam que alguns não estão a fazer nada porque estão habituados ao passado. No dia que eu vier ao público com aquele discurso incendiário outros vão gostar, mas outros não vão gostar. Não é porque nós somos não estamos a fazer nada. A oposição não é só o presidente do partido são vários quadros, assim como na Assembleia da República, como é que dizem que não estamos a fazer nada, enquanto quando há uma revelação de um algum aspecto negativo nós aparecemos a dizer que isto não é assim, a sociedade tem que entender isso, fazer política não é pegar arma.

Há mais de 50 partidos e só um grupo pequeno de partidos é que aparece…

– Não vou falar dos outros, vou falar do meu partido, nunca vou falar de um partido que não sei porquê foi criado, mas o meu partido faz aquilo que é o papel da oposição. Se estamos na oposição é porque fomos roubados, senão, estaríamos a governar.

E a Renamo está confiante na vitória?

Está sim, sabemos que a Renamo vai vencer a partir daqui da cidade de Maputo, Matola e isto aconteceu no passado e por conta das fraudes não podemos governar estas autarquias.

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