Será que temos sindicatos no País?*

OPINIÃO

Alexandre Chiure

Estava aqui a pensar se nós temos sindicatos ou não no País e, se sim, porque é que, ao fim de décadas da sua existência, não conseguem ter garras e unhas para caçar e dominar as suas presas.

As garras e as unhas são a agressividade que se espera de uma organização sindical, temida pelo Governo devido aos seus argumentos e posicionamentos na abordagem de assuntos de interesse dos trabalhadores.

Verdadeiros parceiros e de respeito quando se trata de discutir salários, condições de trabalho e de resolver casos de injustiças laborais.

As presas a que me refiro são batalhas ganhas em negociações ou com o governo ou com empregadores, diferentemente do que acontece hoje em que os sindicatos saem com uma mão cheia de nada.

Ao que parece, estes perderam o foco. Deixam-se dominar ou convencer pelos seus adversários e, acima de tudo, deixam cair facilmente as suas reivindicações porque não estão preparados para algum tipo de debate na mesa de conversações.

Já não se ouvem vozes de sindicalistas a exigir melhores condições de trabalho através da imprensa. Até parece que tudo está em ordem. Infelizmente, a sua insignificância está a tornar-se cada vez maior.

Esta é a realidade. Ora somos nós jornalistas que temos enormes dificuldades de nos espelhar no SNJ. Ora são trabalhadores de diversos ramos de actividade que não se sentem devidamente protegidos pelos respectivos sindicatos.

O mesmo acontece com os professores, uma das classes mal paga e cheia de problemas com barbas brancas, desde as péssimas condições de trabalho, incluindo dar aulas ao ar livre, ao atraso sistemático de pagamento de horas extraordinárias.

Isto para não falar do sindicato dos trabalhadores da função pública que o Estado não abre espaço para a sua criação.

Sem exagero, os sindicatos que o país tem equiparam-se a um cão que ladra muito, mas não morde a ninguém.

Durante o regime socialista que se seguiu à independência, tínhamos as ditas organizações democráticas de massas, caso da OMM e da OJM. Havia também as sócio-profissionais, nomeadamente a ONJ, hoje SNJ, ONP e OTM. As primeiras duas, transformaram-se, no actual cenário político do país, em ligas juvenil e feminino do partido Frelimo.

Os outros, casos de SNJ, OTM e ONP, estão ai a fazer de contas que trabalham, que lutam pelas melhores condições de vida dos seus associados. Há, por exemplo, dezenas de jornalistas que trabalham sem contratos assinados ou com precários, feitos na base de SMS e o SNJ não faz nada para mandar corrigir esta situação.

Há centenas de trabalhadores alvos de injustiças laborais em diferentes sectores de actividade e nenhum sindicato aparece em sua defesa. Operários que trabalham sem receber ou que são expulsos sem justa causa e nada feito.

Os sindicatos ficam calados o ano todo e para não parecer mal, mandam preparar cartazes para a manifestação de 1 de Maio com algumas reivindicações e sem impacto de espécie algum.

Quanto às direcções daquelas organizações, o sistema de selecção do presidente ou do secretário-geral, não mudou. Tem que ter, como condição essencial, o apoio político do partido no poder.

Gente com um discurso politicamente correcto de quem não se pode esperar, por exemplo, pela convocação de uma greve de trabalhadores para reivindicar qualquer que seja a situação.

É verdade que a OTM compara-se a COSATU, na África. Ambas confederações tem ligações com o regime do dia. A diferença que existe entre elas é que a sul-africana, apesar de tudo, é muito forte, coerente e actua com a independência e a imparcialidade exigidas. A OTM não consegue fazer isso. Quando necessário, a COSATU encosta o governo. O actual presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, já foi presidente da organização.

O opositor da COSATU é AMCU – Associação de Mineiros e Sindicato de Construção, também muito forte, a actuar especialmente na indústria em geral e na mineira, a explorar platina.

Infelizmente, as influências políticas do partido no poder em Moçambique estendem-se igualmente às ditas organizações sócio-profissionais, a ONJ/SNJ, ONP e Cia. Aliás, Rafael Magune, primeiro secretário-geral da ONJ, dado à sua orientação política, ficou, depois membro da Comissão Política e ministro da Informação.

O seu sucessor, Manuel Tomé, não só se tornou igualmente membro da Comissão Política, como foi eleito, mais tarde, secretário-geral do partido Frelimo. O resto, não fui eu que disse, mas tenho a certeza de que não há nada que se pode esperar, assim de especial, dos sindicatos enquanto funcionarem nestes moldes.

Vamos continuar a fazer de contas que estamos bem representados por eles e estes, a fazer de contas que estão a trabalhar para o nosso bem, mas no fim do dia todos sabemos qual é a realidade.

Nós só vamos ter sindicatos a sério neste País a defender com veemência os interesses da classe trabalhadora quando os seus dirigentes forem capazes de separar entre aquilo que são as suas inclinações políticas e o trabalho sindical.

*Em reposição

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