- Veterano da luta de libertação na ANC lança um sério aviso a Frelimo
- O ANC já foi forte, mas já não é mais e todos reconhecemos isso no ANC”
- “Não devemos fazer joguinhos com o poder, perdê-lo-emos”, alerta Matheus Phosa
- “Amo a Frelimo e o ANC e temos de nos colocar perguntas difíceis: estamos a agir bem?”
O grosso dos partidos libertadores está a ser contestado na maior parte dos países do continente africano. Em Angola, nas últimas eleições gerais, a UNITA, maior partido da oposição daquele país banhado pelo oceano atlântico, alcançou resultados históricos, colocando o MPLA em sentido. Na África do Sul, as eleições autárquicas serviram de barómetro para medir a popularidade do Congresso Nacional Africano numa altura que a governação de Cyril Ramaphosa tem sido alvo de críticas, tendo os partidos da oposição conseguido resultados históricos. Tal como o ANC e MPLA, dois partidos com fortes ligações com o partido no poder em Moçambique, a governação da Frelimo e Filipe Nyusi tem sido alvo de condenações nos últimos anos. Baseando-se no actual contexto social e político do país, o veterano da luta de libertação do Congresso Nacional Africano (ANC), Mateus Phosa, lançou um sério aviso a Frelimo, tendo dado exemplo do partido no poder na África do Sul que no passado foi forte, mas no presente já não o é. Por outro lado, Phosa adverte os dois partidos libertadores para abandonarem os joguinhos de poder porque se arriscam a perder.
Duarte Sitoe
O Congresso Nacional Africano, a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) e o Movimento Popular de Libertação de Angola governam os seus respectivos países desde a proclamação da independência. Entretanto, nos últimos anos, viram a onda de indignação aumentar devido aos seus modelos de governação.
Em Angola, nas eleições gerais realizadas em Agosto de 2022, os angolanos mostraram o seu descontentamento nas urnas. João Lourenço foi reeleito para o segundo mandato com 51,1% dos votos, mais 7,22% que Adalberto Costa da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA). No que as eleições legislativas diz respeito, o MPLA elegeu 124 deputados contra 90 da UNITA.
As últimas eleições gerais em Angola foram, diga-se, históricas. Se por um lado, o partido no poder viu a sua popularidade a reduzir drasticamente, visto que foi a primeira vez que não conseguiu alcançar a fasquia dos 60% no novo milênio. Por outro, a UNITA conseguiu bater o recorde do número de deputados na Assembleia da República e conseguiu, pela primeira vez, granjear a simpatia de mais de 40% dos eleitores, ou seja, 43,95%.
Quem também sofreu um retrocesso histórico nas últimas eleições autárquicas na África do Sul foi o Congresso Nacional Africano (ANC). Pela primeira vez, aquele partido que governa a África do Sul desde a queda do regime do Apartheid não conseguiu receber a simpatia de mais de 50% dos eleitores nas eleições autárquicas realizadas em 2021.
Depois de 27 anos de maioria absoluta, o partido de Nelson Mandela, apesar de ter terminado o escrutínio na primeira posição do pódio, teve uma derrota histórica simbólica, uma vez que obteve apenas 46,04% dos votos e viu a oposição conquistar a capital, Pretória, e a capital económica, Joanesburgo.
Estes resultados, associados à contestação de um eleitorado cada vez mais jovem e exigente, fazem os alarmes soarem sobre o nível de influência dos partidos libertadores e a sua continuidade no poder.
“Se não respondes às massas que te colocam no poder, vão virar-se contra ti”
Quando se caminha a passos largos das eleições autárquicas, o veterano da luta de libertação do Congresso Nacional Africano (ANC) na África do Sul, Matheus Phosa, esteve, na última semana, em Maputo para dar uma aula de sapiência sobre a democracia e o neocolonialismo na Universidade Wutivi.
À margem daquele evento, olhando para o actual contexto político nacional e sul – africano, Phosa refere que a Frelimo deve observar os erros dos outros partidos libertadores no continente africano, com destaque para o ANC, para não perder a força que sempre o caracterizou.
“Vejam que, na nossa democracia, o ANC já foi forte, mas não mais. Cuidado, Frelimo! Estamos num período difícil, onde as pessoas perderam confiança no meu partido e todos reconhecemos isso no ANC; as pessoas estão a perder confiança. Se verificarmos, é o crime, corrupção e a própria prestação do serviço. As pessoas criticam-nos nesses assuntos”, avisou o veterano da luta de libertação do Congresso Nacional Africano para posteriormente referir que a Frelimo deve cumprir com as promessas que faz durante a campanha eleitoral
“A Frelimo não deve seguir essa via, deve continuar conectada às massas, deve responder às necessidades das massas, porque se não respondes às massas que te colocam no poder, vão virar-se contra ti, por isso, digo, cuidado! Cuidado, ANC, cuidado, Frelimo, cuidem das massas”.
Nas entrelinhas, Matheus Phosa, que fez juras de amor ao Congresso Nacional Africano e a Frente de Libertação de Moçambique, deu exemplo de Moçambique e Zimbabwe que, apesar do potencial na agricultura e mineração, o exército de pobres continua a aumentar a cada ano que passa, tendo, uma vez mais, alertado ao ANC e a Frelimo para colocarem um ponto final nos joguinhos do poder.
“Lamento que eu esteja a tornar isto difícil, mas estes são meus partidos. Amo a Frelimo e o ANC e temos de nos colocar perguntas difíceis: estamos a agir bem? Por que é que as pessoas estão a perder fé em nós e como podemos restaurar a fé das massas nos dois partidos? Não devemos fazer joguinhos com o poder, perdê-lo-emos”, alertou
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