FNDS é um saco azul e chega a executar projectos sem aval do Banco Mundial

DESTAQUE POLÍTICA
  • Auditoria do TA confirma suspeita e penaliza gestores
  • PCA do FNDS, Cláudio Borges, condenado a devolver seis milhões de meticais
  • Enquanto o coordenador do projecto MOZBIO deve repor cinco milhões
  • Ao todo, TA quer que responsáveis do MOZBIO devolvam mais de 26 milhões

As suspeitas de que o Fundo Nacional de Desenvolvimento Sustentável (FNDS) é vaca leiteira de um grupo selecto, e que durante muito tempo funcionou sem prestar contas a ninguém para encobertar uma festança económica, podem estar agora confirmadas. O Tribunal Administrativo (TA) detectou, no exercício económico de 2021, irregularidades financeiras de várias ordens, desde a utilização e pagamentos indevidos, até adendas de contratos acima do limite estabelecido pelo doador sem o aval deste. O nosso Tribunal de Contas, como que a actuar com mão dura, decidiu “julgar irregulares”, as demonstrações financeiras do FNDS – Projecto de Áreas de Conservação para Biodiversidade e Desenvolvimento (MOZBIO), por consequência, sancionar os responsáveis, face às irregularidades de que as mesmas enfermam”. No acórdão 201/2022 que o Evidências teve acesso, o colectivo de juízes fixou valores que variam de dois e seis milhões de meticais, o valor que deve ser devolvido, curiosamente, cabe ao presidente do Conselho de Administração do FNDS, Claúdio Borges, a fatia mais alta.

Duarte Sitoe

De acordo com o relatório que descreve as actividades realizadas em 2021, que corresponde ao terceiro ano da sua implementação, o MozBio 2 teve uma execução de actividades planificadas de 58%, e uma execução financeira anual de 21 536 221 USD (correspondente a cerca de 80% do planificado para o ano), dos quais 6 139 341 USD foram executados pelo FNDS e 15 396 880 USD executados pela BIOFUND.

Entre 2019 e 2021 foram desembolsados 30 925 549 USD, o que representa uma execução de 43% do orçamento global do projecto. No entanto, segundo a auditória do Tribunal Administrativo (TA), o grosso deste valor foi usado, sendo que houve adenda de contratos.

Depois de examinar os documentos que compõem os autos e valorados os elementos da prova, o Tribunal Administrativo concluiu que os gestores do Fundo Nacional de Desenvolvimento Sustentável – Projecto de Áreas de Conservação para a Biodiversidade e Desenvolvimento (MOZBIO) cometeram infracção financeira.

Aliás, o TA refere que ficou cristalino que os gestores celebraram e executaram as adendas aos contratos sem observância dos ditames legais, ou seja, acima do limite estabelecido pelo doador (Banco Mundial) e sem o aval do mesmo, facto que torna os pagamentos indevidos, tendo, por isso, deliberado que os gestores devem fazer a reposição dos fundos desviados.

Porque os tribunais actuam os que executam e não os que politicamente comandam, a auditoria do Tribunal Administrativo confirmou irregularidades que até aqui eram tidas como suspeitas, e como resultado deliberou que os gestores do Fundo Nacional de Desenvolvimento Sustentável devem fazer reposições de valores que variam de dois milhões a seis milhões meticais.

Entre os autuados, para além do presidente do Conselho de administração do FNDS, Cláudio Borges, constam nomes de Madyo Couto, coordenador de projecto MozBio; Cheid Abubacar, administradora do Pelouro Financeiro; Ilídio Martins, gestor financeiro; Verônica Mople, assistente financeira, e Henriques Conceição, coordenador de Procurement.

Cláudio Borges, PCA do FNDS, tido como próximo do ministro Celso Correia, que tem estado a arrastar o fundo pelos ministérios por onde passa, deve devolver aos cofres cerca de seis milhões de meticais, enquanto Madyo Couto deve repor cerca de quatro milhões de meticais. O Tribunal Administrativo deliberou ainda que Cheid Abubacar e Ilídio Martins devem fazer a reposição de cinco milhões de meticais e quatro milhões de meticais, respectivamente, enquanto Verônica Mople deve repor dois milhões de meticais.

Multas penalizadoras para Borges e companhia

Apoiando-se no estatuído nos n°s 3 e 5 do artigo 114 da lei n° 14/2014, na redação dada pela lei n° 8/2015, de 6 de Outubro, pelo cometimento das infracções, os Juízes Conselheiros da subsecção de Fiscalização Concomitante e Sucessiva a Secção de Contas Públicas no Tribunal Administrativo determinaram que os gestores do Fundo Nacional de Desenvolvimento devem pagar multas que variam dos 500 a 900 mil meticais.

Tal como aconteceu nas reposições, Carlos Borges voltou a ter a fatia mais alta, visto que deve pagar uma multa de 900 mil meticais. Madyo Couto e Cheid Abubacar foram condenados a pagar multas de 800 mil meticais, enquanto Ilídio Martins e Verônica Mople foram multados em 500 mil meticais.

Entre as causas, lê-se que houve “violação dos preceitos e procedimentos legalmente instituídos na gestão dos fundos públicos, pelos gestores do Fundo Nacional de Desenvolvimento (MOZBIO) em 2021”.

Por outro lado, existem mais de 15 milhões de meticais pagos sem aval do doador, no caso o Banco Mundial, o que viola o estabelecido na alínea c) do ponto 10.1 do Regulamento de Aquisições para Mutuários de Operações de Financiamento de Projectos de Investimentos e Bens, Obras, Serviços Técnicos e Serviços de Consultoria, de Julho de 2016, Regulamento de Aquisições do Banco Mundial que prescreve que “no casos dos contratos sujeitos a revisão prévia, o Mutuário providenciará a não objeção do Banco antes de concordar com c) qualquer solicitação de mudança ou alteração contratual (excepto em caso de extrema urgência), inclusive em razão de extensão de prazo que, de maneira isolada ou conjuntamente com todas as ordens de modificação ou alterações anteriores, aumente o valor do contrato original em mais de 15%”.

Em resposta, no âmbito de contraditório, aqueles gestores afirmaram que “Sobre a falta de No Objection do Banco Mundial para a celebração de adendas de contratos, cumpre-nos esclarecer segundo o Regulamento de Aquisições de Mutuários de Operações de Financiamento de Projectos de Investimentos de Bens, Obras, Serviços Técnicos de consultoria, datado de Novembro de 2020, nos casos de contratos sujeitos a revisão prévia, o Mutuário providenciará a não objeção do Banco antes de concordar com a extensão do prazo estipulado para a execução de um contrato que tenha impacto no cronograma planeado para a conclusão do projeto projecto ou modificações consideráveis no escopo das obras, bens, serviços técnicos ou serviços de consultoria ou mudanças significativas diversas nas cláusulas e condições do contrato ou qualquer solicitação de mudança de alteração contratual, inclusive em razão de extensão de prazo, que, de maneira isolada ou conjuntamente com todas as ordens de modificação ou alterações anteriores, aumente o valor do contrato original em mais de 15% e ainda a rescisão contratual proposta”.

O argumento não convenceu o auditor, que decidiu compilar todos os pagamentos pagos acima do tecto definido pelo doador sem o parecer deste. No total, são 26 805, 080,00 meticais, (vinte e seis milhões e oitocentos e cinco mil e oito meticais e oitenta centavos).

“Imputar responsabilidade financeira, traduzida no dever de reposição aos responsáveis do Fundo nacional de Desenvolvimento Sustentável – Projecto de Áreas de Conservação para a Biodiversidade e Desenvolvimento MOZBIO, em 2021, conforme o estatuído no n° 2 do 98 da Lei n° 14/2014, de 14 de Agosto, republicada pela lei n° 8/2015, de 6 de  Outubro, pelo cometimento da infração tipificada nos artigos 100 e 1001 da lei supracitada, por ter ficado provado o alcance e pagamentos indevidos, no valor total de 26,805,148, 80 meticais referentes a…”, lê-se no relatório.

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