- Colaboradores denunciam ambiente de intimidações e perseguições
- Medihealth escolhe a dedos funcionários que recebem horas extras
- Levaram muito tempo para denunciar a empresa por medo de perder emprego
A Medihealth, uma empresa que oferece planos de saúde e vocacionada em gerir carteira de clientes, distribuída por diversas Seguradoras e Empresas, com operações em Angola, Moçambique e Portugal, está a ser acusada pelos seus colaboradores de maus tratos e autoritarismo na Pérola do Índico. Para além de despedimentos sem justa causa, os queixosos denunciam que são alvo de intimidações protagonizadas pelo patronato. Por outro lado, naquela empresa que nasceu em Portugal, os trabalhadores trabalham até depois do expediente normal, mas não têm direito a horas extras e quem reclama recebe processo disciplinar com ameaça de demissão. Contactada para contar a sua versão dos factos, a Medihealth preferiu se fechar em copas, limitando-se a referir que podem escrever o que vocês quiserem.
Duarte Sitoe
Os colaboradores da Medihealth estão de costas voltadas com a direcção da mesma devido a supostos maus tratos. Para além de se eximir de pagar horas extras para os trabalhos feitos fora do expediente normal, a direcção da empresa de origem lusa é acusada de intimidações aos trabalhadores que protestam o seu modus operandi.
Os queixosos, que preferiram não se identificar por temerem represálias do patronato, denunciam que o intervalo para o almoço atropela o que está plasmado na Lei do Trabalho, uma vez que por vezes só têm uma interrupção de 30 minutos.
“Em Moçambique não há emprego, por isso estamos a ser maltratados porque estamos à procura de pão para alimentar as nossas famílias. Estamos a ser escravizados na nossa própria terra. Um trabalhador tem direito a intervalo para almoçar e recarregar as energias, mas não é o que acontece na Medihealth. Só temos 30 minutos para almoçar e descansar. Aqui ninguém reclama por medo de despedimento. Os que tentaram reivindicar os seus direitos foram despedidos sem direito a indemnização. Nós que ficamos temos que dançar a música da direcção por medo de perder o emprego. Infelizmente, temos que nos contentar com esta triste realidade”, contou um colaborador da Medihealth que preferiu se identificar pelo nome de Samuel, para posteriormente referir que o patronato não quer ver garrafas de água nas mesas.
“Pode parecer mentira, mas é a pura verdade. No decorrer das atividades ninguém deve beber água, por isso a direcção não quer ver garrafas de água nas mesas. Quem discordar com essa norma corre o risco de perder o emprego. Tivemos colegas que tiveram processos disciplinares por terem saído para beber água. A Medihealth veste-se na pele de empregador para hostilizar os mais fracos. Até hoje não entendo como é uma empresa que cuida de apólices de saúde é contra os direitos humanos. Ninguém está feliz dentro daquela empresa, mas todos fomos engolidos pelo silêncio porque queremos manter o emprego”.
Júlio Langa (novo fictício), por seu turno, foi mais longe, referindo que ao invés do tão esperado aumento salarial, o patronato só distribui processos disciplinares. Aliás, a fonte contou que só há reajustes constantes para os trabalhadores mais antigos.
“O salário não é perto e muito menos de longe proporcional ao trabalho que fizemos. Ninguém deve reclamar do salário porque a direcção acha que está entre as empresas que recebem os melhores salários em Moçambique. Os nossos superiores não nos respeitam, tanto os moçambicanos assim como os portugueses. Os nossos irmãos que estão em cargo de chefia estão massageados, eles não se importam com sofrimento alheio. Quando reclamamos com eles levam o assunto para os chefes e depois disso somos alvos de processos disciplinares. Aqui só aumentam os salários dos chefes, aqueles lambe-botas que assobiam para o lado perante nosso sofrimento”.
Trabalhar fora do expediente normal sem direito a horas extras
Para além dos processos disciplinares para os que ainda estão contratualmente ligados a Medihealth, há relatos de despedimentos sem justa causa para os que se opuseram ao modus operandi da empresa portuguesa a operar em Moçambique vocacionada em gerir carteira de clientes distribuída por diversas Seguradoras e Empresas.
“Os processos disciplinares são a imagem da empresa. Quase todos trabalhadores já tiveram processos disciplinares. Tivemos colegas que foram despedidos sem justa causa, porém não levaram a empresa para a justiça. Em algum momento as pessoas não avançam com queixas no Tribunal porque são frequentemente intimidados pelo patronato”, referiu Júlio.
De acordo com o artigo 85 da Lei do Trabalho, as horas normais de trabalho são oito por dia e 48 por semana, sendo que as horas diárias podem ser estendidas para nove (por dia), desde que o trabalhador receba um meio dia extra de descanso ou remuneração.
No entanto, a Medihealth tem pontapeado a lei vigente no país, uma vez que obriga os seus colaboradores a trabalharem fora do expediente normal e sem direito a horas extras. Aliás, naquela empresa só tem direito a horas extras os funcionários que granjeiam a simpatia da direcção.
“A Lei do Trabalho definiu que cada funcionário seja ele público ou privado deve trabalhar oito horas por dia e depois disso a empresa é obrigada a pagar horas extras. Pois é, mas não é o que está a acontecer na Medihealth. Trabalhos além do expediente normal, mas não há horas extras. Os mais antigos são os que têm direito a horas extras. Não podemos reclamar porque quem reclama recebe ameaça de despedimento. É deveras triste o que está a acontecer nesta empresa. Pedimos a quem de direito para nos libertar desta escravatura. No passado fomos colonizados por portugueses e hoje voltaram na pele de empregadores para nos escravizar”, contou um colaborador.
“Contratam sempre novos para substituir os que desistiram”
Prosseguindo, a fonte referiu que o patronato faz e desfaz porque sabe que tem muitos jovens que reforçam a cada dia o exército dos desempregados, daí que pode contratar novos colaboradores a qualquer momento.
“Aqui sempre contratam novos trabalhadores para substituírem os que desistiram ou aqueles que foram despedidos. A direcção aproveita-se da falta de emprego no país para atentar contra os direitos humanos. A empresa tem muitos clientes, não se justifica a razão de ter filhos e enteados quando se trata de horas extras”.
Questionado se já submeteram uma queixa na Inspecção Geral do Trabalho a relatar o modus operandi da Medihealth, a fonte que temos vindo a citar referiu que já houve algumas tentativas, mas o medo de represálias falou mais alto.
“Conhecemos os nossos direitos, mas continuamos a sofrer no silêncio. No ano passado, tivemos um encontro no qual foi combinado que tínhamos que denunciar o comportamento do patronato nas entidades competentes, porém nunca saímos da teoria para a prática. Quando chegou a vez de ir ao Ministério do Trabalho e Segurança Social ninguém deu corpo às balas, por isso continuamos a ser escravizados na nossa própria terra”, rematou.
Medihealth se fecha em copas
Por sua vez, um outro colaborador que preferiu se identificar pelo nome de John contou que está há mais de seis meses sem receber horas extras enquanto tem trabalhado fora do expediente normal.
“Estou há mais de seis meses sem horas extras. O que mais me espanta é que outros colegas estão a receber normalmente. Tentei reclamar, mas até hoje nada aconteceu. O meu chefe disse que o meu processo já estava nas mãos da direcção. Infelizmente, recebi a informação de que se não estava feliz com o que aufiro estava livre de abraçar novas oportunidades. Aquilo é uma chantagem emocional. Preferi ficar no silêncio enquanto aguardo pela boa vontade dos mais poderosos”.
Contactada pelo Evidências para contar a sua versão dos factos, a Medihealth preferiu se fechar em copas. Aliás, inicialmente, a empresa disse que ia delegar alguém para falar do assunto, mas depois de muita insistência recebemos a informação de que a empresa de origem portuguesa não se ia pronunciar sobre o assunto, referindo que o Evidências podia escrever o que quisesse.
Facebook Comments