Ibrahim Traoré, Bassirou Faye e a 3ª Revolução Africana _ Parte 5

OPINIÃO

Felisberto S. Botão

Encontro entre Ibrahim Traoré e Bassirou Faye e a força do Jacob Zuma – Cont. 1

África foi à guerra para lutar pela terra, e não pela democracia. É impressionante como de repente a democracia passou a fazer tanto barrulho nas nossas vidas, que esquecemos a terra, e com ela a riqueza. Porque será que não me admira que o nosso povo está cada dia mais pobre?

O poder que o branco tem de colocar-nos na situação confortável para eles, que é o gradualismo e a coabitação, os direitos humanos, a democracia, enfim, vai um pouco além do natural, e alcança o espiritual, onde forças obscuras induzem os líderes do ANC, e de África no geral, a se confundirem com relação ao sentido do seu caminho e da sua revolução. Na próxima semana vamos voltar um pouco a este debate espiritual, quando formos a concluir sobre a cultura da religião.

Os acordos da CODESA na África do Sul, dos anos 1991 e 1992, levaram a inclusão na constituição daquilo que chamaram de “The Sunset Clause”, que propunha a eliminação gradual do regime do Apartheid, em vez de uma transferência dramática do poder. Lembram-se do grupo de Monróvia, de 1963? Mesmo padrão.

Khalid Muhammad defendeu em 1994, que era um erro a coabitação com os brancos na África do Sul, e o ideal seria dar 24h para saírem do país, e ele justificou que “…você não pode rejeitar os factos e história de derramamento de sangue na RSA contra os negros… Não concordo com o governo vergonhoso do Nelson Mandela, pois nenhum homem sai da cadeia depois de 27 anos e se torna presidente, a não ser que haja um roteiro e um plano por trás da cena, para remoção de sanções económicas contra os brancos, mas sem um plano real de redistribuição da riqueza. Os Oppenheimer e outros capitalistas sugam o sangue do nosso povo, e não deixarão que hajam mudanças económicas que favoreçam os negros. A presença de brancos na África do Sul resulta de um acto de invasão e agressão de uma nação contra a outra”.

Os brancos são invasores na África do Sul, entretanto detêm mais de 70% da terra, e quase 100% dos negócios estruturais, em finanças, seguros, mineração, e bolsa de valores, apesar de representarem cerca de 10% da população, e ainda assim, lutam para a preservação destes direitos adquiridos.

Para ter paz devemos travar a guerraIbrahim Traoré. ANC não aprende com a história, não consegue identificar o seu inimigo até hoje. ANC não pode ofender os brancos, devido aos acordos democráticos assinados, o que o impede de fazer “guerra” ao capital branco. O ANC tem dificuldades em perceber que o foco deve centrar-se no povo negro, e depois discutir mecanismos de inclusão de outros grupos raciais. Esta coisa de “arco iris” não existe. A moderação política, que satisfaz os brancos, mantém o povo negro no mesmo lugar onde estava em 1994. Não faz sentido esta confusão que assistimos na África do Sul, parece que as pessoas pensam que fazem parte da sociedade europeia.

Como alertei no início desta séria da 3ª revolução africana, deve apelar-se a todos os jovens revolucionários, os que já tomaram o poder, assim como os potencias, que se não construírem os seus alicerces fora do sistema vigente, não têm como escapar a manipulação, e depois de 10 anos, vamos perceber que são os colonos de novo a mandar. Entretanto deve haver uma vigilância dobrada, pois é prática do colono capturar os nossos agentes e as nossas instituições, para que a revolução fracasse.

Em Moçambique, tudo indica que o Venâncio Mondlane entendeu esta mensagem. Que os deuses o guardem e protejam, e principalmente, que iluminem a sua sabedoria para o bem do povo e da nação.

O que dizer do Jacob Zuma?

Jacob Zuma disse aos jornalistas que o ANC e o atual presidente, Cyril Ramaphosa, são “representantes do capital monopolista branco”, o que é uma grande verdade. MK era o braço armado do ANC, que este abandonou em 1994, para se comprometer com os brancos. Zuma decidiu resgatar o MK, e criou um caos no cenário político sul africano.

O Jacob Zuma está muito zangado com o Cyril Ramaphosa e o ANC no geral. O capital branco sul africano não suporta o Jacob Zuma, pelo facto deste defender os interesses do povo negro, e querem destrui-lo a todo custo. É uma questão de ódio, como o é toda a relação do branco para com o negro, embora nós os negros não acreditamos. O capital branco na África do Sul quer ver o Zuma de joelhos, assim como a raça branca quer ver os negros. Infelizmente o Cyril Ramaphosa deixou-se usar para combater e desacreditar o Zuma, seu irmão. Mas o Zuma ressurgiu, e está muito zangado, e não quer uma coligação com o Cyril.

A constituição da SA está a proteger o capital branco, e este incentiva a narrativa que esta é a melhor constituição do mundo. Cyril Ramaphosa fez parte do desenho desta constituição, que hoje é um desafio para a libertação do seu próprio povo, pelos impedimentos subtis que ela traz. Ramaphosa e alguns dos seus membros, consta que estão a ter reuniões secretas com o DA. O facto é que são pessoas com fraco background técnico, que correm o risco de assinar novos acordos apenas com ganhos políticos, em troca de assuntos estruturais a nível de banca e moeda, orçamento, terra e liberdade, a favor do capital branco.

Ramaphosa está obcecado pela sua manutenção no poder, mas ele já destruiu muito da África do Sul e do ANC. O que é que os membros do ANC não estão a perceber? Ele recebeu o ANC com suporte de 62%, baixou para 57% em 1999, e agora 40%, tornando-se no elo mais fraco do partido, e no objecto de contestação dos principais aliados negros, MK e EFF. Poderá o ANC sacrificar um homem pela nação?

O ANC acreditou na coabitação com o capital branco, e caiu no conforto da vida fácil provida pelo capital, e deixou de trabalhar, e pior, se desligou das massas. O ANC deixou-se infiltrar pelo capital branco, e não percebeu que este só fluía para o partido e para os indivíduos, mas não para a nação, e tornou-se o defensor do gradualismo, e manteve o capital e a terra nas mãos do branco. Hoje o ANC deixa o país sem nenhum legado, e assim vai continuar, se não perceber que nação arco-íris é uma propaganda fantasia, não existe.

Espero sinceramente, que o desespero e o orgulho não levem o ANC a coligar-se com o partido do capital branco, o DA, pois seria o prego final para o seu caixão. O DA já declarou que não quer uma aliança onde MK e EFF são participantes, e quer preservar a constituição do “The Sunset Clause”, que perpectua os seus direitos sobre a terra e a riqueza sul africana. Uma coligação ANC, MK e EFF seria o mais sensato neste momento, e a melhor chance que a África do Sul teria para se libertar do capital branco, e entrar na onda da 3ª revolução africana. ANC, KM e EFF são o mesmo grupo de pessoas, que se separaram pela interferência dos brancos entre eles, e a história está a dar-lhes a oportunidade de corrigirem o erro comum que cometeram em 1994, pois, juntos fazem a maioria negra necessária para implementar mudanças, na constituição e na sociedade. Espero muito sinceramente que eles escutem a voz do universo e dos ancestrais, esqueçam as diferenças fictícias, e juntem-se para lutar pela sua terra.

O multipartidarismo é um problema para a nossa união, e está a enfraquecer a África do Sul e a África no geral. Para defender a democracia multipartidária, e merecer o reconhecimento dos brancos sobre a nossa capacidade de fazer parte do mundo civilizado, estamos a acumular tensão entre grupos de irmãos, a ponto de relegarmos a posse da terra para o segundo plano.

Os brancos é que estão a rir-se e a festejar, a sua estratégia está a funcionar. Através de cláusulas armadilhadas na constituição e no sistema legal, impediram o ANC de fazer mudanças sociais, e através da ancoragem do sistema financeiro às leis ocidentais, impediram o ANC de financiar a economia. Com base nestes mesmos instrumentos, manipulam o mercado e a moeda, e já falam de perda de confiança de investidores e da instabilidade da moeda rand, sob a possibilidade de coligação entre ANC, MK e EFF. Não querem a possibilidade de união entre africanos, ou seja, entre os negros.

O DA está numa posição de dar o golpe final ao ANC, pois este está fragilizado, fragmentado, assustado e com medo de seus próprios irmãos, que nutre uma falsa sensação de segurança e protecção pelo DA. O DA, em nome de resgatar a África do Sul da incompetência do ANC e dos negros, vai usar o “histórico corrupto” dos líderes do ANC, coloca-los fora de jogo com suporte da constituição, e voltar ao sistema do Apartheid, mesmo que seja com uma roupagem diferente. Isso será possível se o ANC cair nesta aliança com o DA.

O partido DA está a praticar fundamentalismo de mercado, quando traz sempre assuntos de “como vai reagir o mercado“, “como vão reagir os investidores“, mostrando claramente que os interesses das massas não têm peso para eles.

As eleições sul africanas estão a mostrar o quanto ainda estamos divididos. ANC, MK, EFF, e mais alguns, são o mesmo grupo, divididos pelas intrigas dos brancos. Entretanto, os brancos estão mais juntos que nunca, unidos numa estratégia, e ainda estão a puxar para eles uma parte considerável da nossa gente desapontada com a nossa liderança.

Não vamos subsistir como povo, se esquecermos a história tão fácil assim, ou se nos tornamos excessivamente viciados e apegados ao conforto do mundo material ocidental. Se os sul africanos não se cuidarem, a África do Sul vai virar novo Brasil, nova Austrália, nova EUA, nova Argentina, onde os nativos serão conduzidos para as reservas, como uma espécie a preservar, assim como Kruger, Gorongosa, etc.

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