- Abandono do sinistrado dá entre dois a oito anos de prisão
- Viatura sinistrada custa 5 a 9 anos (mais de um mandato) de salário do Presidente
- Organizações preparam-se para submeter queixa-crime contra o filho do Presidente
- Mais uma vez, Florindo Nyusi provocou aparatoso acidente e abandonou sinistrados
- As vítimas eram duas crianças, uma das quais continua hospitalizada
Organizações da sociedade civil encontram-se neste momento a encetar diligências visando submeter uma queixa-crime contra o filho mais badalado do Presidente da República, Florindo Nyusi, pela prática do crime de abandono de sinistrados, após ter provocado um aparatoso acidente de viação na Avenida Julius Nyerere, que resultou em danos humanos e materiais. As vítimas humanas foram duas crianças uniformizadas que iam à escola e que foram abandonadas à sua sorte pelos agentes de segurança da Presidência da República, que tão somente preocuparam-se em retirar o filho do Presidente do local do crime. Para além de abandono de sinistrados, Florindo Nyusi pode ainda responder por condução sob efeitos de álcool. E mais, pode ainda ser obrigado a explicar a proveniência do valor para compra de uma viatura que custa 25 milhões de meticais, o que equivale a pelo menos cinco anos (um mandato) de salários do Presidente da República.
Se o Presidente da República, Filipe Nyusi, deixar a justiça funcionar, o seu filho, Florindo Nyusi, poderá, num futuro breve, fazer companhia a Armando Ndambi Guebuza na cadeia, depois de ter cometido pelo menos três crimes puníveis e previstos no Código de Estrada no seu último acidente ocorrido na passada sexta-feira.
Trata-se dos crimes de abandono de sinistrado, excesso de velocidade e condução sob efeitos de álcool. O crime de abandono de sinistrado está previsto no artigo 154 do Código de Estrada e é punível com pena de prisão e multa até dois anos, graduada em função do perigo sofrido pela vítima, perante a gravidade das lesões e a dificuldade de obter socorros, quando da omissão não resultar agravamento do mal ou resultar agravamento que não tenha como efeito a morte do sinistrado.
No caso, Florindo pode ainda incorrer a pena do correspondente crime doloso de comissão por omissão pelo facto do abandono ter ocorrido depois de saber da situação das vítimas. Mais ainda, o mesmo artigo abre espaço para a responsabilização dos agentes de segurança de Florindo Nyusi como encobridores, por não se oporem ao abandono.
Além da omissão de socorro, Florindo pode ser punido com multa e até inibição pelo crime de excesso de velocidade nos termos do artigo 33. Igualmente, pode responder por condução sob efeito de álcool, nos termos do artigo 81, também com multa e/ou inibição.
Evidências apurou que algumas organizações da sociedade civil, entre as quais o Centro para Democracia e Direitos Humanos (CDD) e a Ordem dos Advogados de Moçambique (OAM), uma das primeiras organizações a reagir e entrar no terreno para investigar, estão a envidar esforços visando a submissão de uma queixa-crime na Procuradoria-Geral da República, para a responsabilização do filho do Presidente.
A Comissão dos Direitos Humanos (CDH) exigiu, esta segunda-feira, que a justiça seja feita, adiantando que este processo irá testar a seriedade das instituições de administração da justiça.
“Mantemos total confiança no Direito e nas instituições de administração da justiça, todavia, entendemos ser, de facto, um caso que testará a seriedade e isonomia do nosso sistema da administração de justiça”, lê-se no comunicado.
Recorde-se que o acidente ocorreu quando o filho do Presidente Nyusi seguia a alta velocidade (acima de 60 quilómetros dentro de uma localidade), por volta das 10 horas, pela Avenida Julius Nyerere, no sentido Museu – Praça dos Combatentes, tendo embatido numa outra viatura da marca Toyota Fortuner, que seguia no mesmo sentido. A via estava abarrotada de transeuntes e vendedores.
E porque o embate foi violento, a viatura SUV da Marca Mercedes Benz, série G Wagon, preta, sem chapa de matrícula – como de resto são todos os carros de Florindo Nyusi – acabou galgando o passeio, danificando um Txopela e algumas bancas que ali se encontravam. Durante o despiste, duas crianças que se dirigiam à escola foram colhidas, resultando em ferimentos ligeiros e graves.
Abandono de crianças sem prestar nenhum socorro
Logo após o acidente, os homens da segurança saíram de um outro carro que seguia na coluna, de cor branca, da marca Hyundai, com postura agressiva gritavam contra curiosos “afasta, afasta, ninguém filma aqui”, enquanto outros retiravam Florindo Nyusi do carro sinistrado, seguindo depois em direcção à Ponta Vermelha.
Tanto a segurança de Florindo Nyusi, assim como o próprio filho do Presidente da República, que embora visivelmente alterado, supostamente por estar embriagado, estava consciente, não se preocuparam com os primeiros socorros dos ocupantes do outro veículo sinistrado e muito menos das duas crianças.
As duas vítimas daquele sinistro, ou seja, as crianças só foram levadas ao hospital de Mavalane graças a pronta intervenção de terceiros. Já no hospital de Mavalane, uma criança teve alta, enquanto que a outra foi levada de emergência para o Hospital Central de Maputo, onde encontrava-se dada a gravidade dos ferimentos até ter alta na tarde desta segunda-feira.
Agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM) que estavam a trabalhar nas proximidades acompanharam de longe o acidente e não se aproximaram do local do sinistro durante o curto tempo em que a segurança presidencial, alocada a um dos filhos mais badalados filhos do Presidente da República, resgatou o seu “patrão” e abandonaram crianças sinistradas à sua sorte, sem prestar nenhum socorro.
A PRM, através do seu porta-voz na cidade de Maputo, Leonel Muchina, disse estar a investigar o crime para depois elaborar o auto que irá levar à responsabilização dos implicados, sem em nenhum momento referenciar o nome de Florindo Nyusi.
Florindo Nyusi, causador do sinistro, desapareceu dos radares. A família Nyusi só viria a se pronunciar sobre o acidente por via de uma mensagem de texto do Presidente Nyusi.
“A minha primeira acção foi deslocar-me ao Hospital para manifestar a minha solidariedade e apoio a esta criança que se mantém internada (já teve alta) para acompanhamento médico, vítima do acidente que se sucedeu com o nosso filho. Falei pessoalmente com a menina e a sua mãe, e visitei todos os pacientes da enfermaria. Às crianças desejamos rápidas melhoras e para a menina Nelsa Francisco auguramos o regresso da mesma o mais breve possível ao convívio familiar e a sua comunidade escolar”, disse Filipe Nyusi.
Uma repórter do CDD visitou a enfermaria em que estava internada a pequena Nelsa, tendo constatado que a única assistência dada pela família presidencial no dia anterior tinha sido apenas uma caixa de tangerinas.
Um cidadão especial chamado Florindo
Refira-se que esta não é a primeira vez que o mesmo filho do Presidente da República, Filipe Nyusi, se envolve num aparatoso acidente de viação seguido de abandono de sinistrado. Em Fevereiro de 2022, Florindo Nyusi por pouco tirava a vida de um funcionário sénior do grupo MediaCoop, a contar pelo estado em que ficou a viatura em que seguia. O acidente terá sido causado por um corte de prioridade por parte do filho do Presidente, que, como é de praxe, circulava a alta velocidade num dos seus “brinquedos”.
Dessa vez também circulava num carro sem chapa de matrícula. A pergunta que não quer calar é: se a Constituição da República estabelece que todos os moçambicanos são iguais perante a Lei, por que razão há uma excepção à regra para que Florindo Nyusi – conhecido pelo seu gosto por viaturas de luxo e de alta cilindrada – circule em carros sem matrícula? Aliás, até o seu pai, Presidente da República, e todos membros do Governo andam em carros com matrícula.
Nyusi precisaria trabalhar por mais de um mandato para comprar aquele carro
Fora o acidente em si, o que chamou mais atenção foi o carro novinho em folha e sem matrícula em que Florindo Nyusi seguia. Trata-se de um Mercedes Benz Brabus, série G Wagon, que custa em torno de 400 a 600 mil dólares norte-americanos, equivalente a 25 a 38 milhões de meticais.
Trata-se de um valor astronómico, que não condiz com o nível de grande parte dos moçambicanos. Aliás, só para se ter uma ideia, o Presidente da República, que recebe o salário mais alto da função pública, precisaria trabalhar por mais de um mandato sem mexer no seu salário para acumular o suficiente para comprar o carro que seu filho conduzia.
Filipe Nyusi recebe um salário mensal de 263.516 Meticais, acrescido de um subsídio de representação de 79.054,80, totalizando 342.570,80 Meticais. Por ano, recebe em salário e subsídio de representação cerca de 4.110, 840 Meticais.
Tendo em conta o custo do carro, avaliado em cerca de 25 a 38 milhões, o Presidente Nyusi, pai de Florindo, precisaria de acumular entre 70 a 110 salários para poder comprar o carro. Isso corresponde a pelo menos cinco a nove anos de salário acumulado do Presidente da República, sem mexer nem sequer um centavo.
Agora, a pergunta que não quer calar é: De onde Florindo Nyusi tira tanto dinheiro assim? É que não é conhecido nenhum emprego formal de Florindo Nyusi. Em Moçambique e pelo mundo afora apresenta-se como um “Mozambican Business Man”, ou seja, empresário.
Com efeitos, está associado a tráfico de influências e a interesses em vários ramos de negócios, incluindo o de mineração e pesca. É dono da Imográfica, Limitada, que tem como objecto social serviços gráficos. Por seu turno, a Motil Moçambique, limitada, registada no BR no 78, III Série de 19 de Maio de 2017 – pág. 2710 com um capital de Cem mil meticais, tendo como objectivo social desenvolver a actividade de pesca industrial no território moçambicano e serviços de segurança privada.
Está ainda associado a empresas de mineração e restauração, registadas em nome de familiares e terceiros, entre outras. Aqui destaca-se a Flomining SA, que obteve concessões numa área de cerca de 4000 ha para a exploração de ouro nos distritos de Manica e Machipanda.
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