“Governo conhece os canais para a solução do conflito em Cabo Delgado” – defende Samuel Simango

DESTAQUE POLÍTICA
  • Possível diálogo para acabar com o terrorismo em Cabo Delgado
  • Simango olha para a libertação de pescadores em Mocímboa da Praia como ensaio
  • “Não seria bom que o conflito em Cabo Delgado durasse 16 anos…”
  • Raul Mendes diz que não há condições para negociar com os terroristas

Nos meados do mês de Agosto do corrente ano, os terroristas sequestraram mais de 60 pescadores em Mocímboa da Praia, sendo que depois de três dias foram libertados, segundo o administrador daquele distrito da província de Cabo Delgado, Sérgio Cipriano, depois de uma longa negociação com os insurgentes. Na opinião do académico Samuel Simango, o Governo conhece os canais próprios que podem ser usados para a solução do conflito em Cabo Delgado e, por isso, considera o episódio de Mocímboa da Praia um ensaio para que o Executivo encontre linhas de contacto para iniciar o diálogo com vista a colocar um ponto final na onda de instabilidade que se vive na província de Cabo Delgado. No entanto, Raul Mendes, olhando para os avanços no Teatro Operacional Norte, considera que não há condições para negociar com os terroristas.

Duarte Sitoe

Apesar de o Governo garantir que a situação do terrorismo está controlada na província de Cabo Delgado, embora em menor escala, os insurgentes continuam a semear terror em alguns distritos. A título de exemplo, em meados de Agosto sequestraram mais de 60 pescadores em plena actividade em Mocímboa da Praia.

Os pescadores, segundo o administrador de Mocímboa da Praia, só foram restituídos à liberdade três dias depois, na sequência de uma maratona negocial com os insurgentes, o que de certa forma, para alguns moçambicanos, abre espaço um futuro diálogo com os terroristas, com vista a colocar um ponto final na instabilidade que se vive na província de Cabo Delgado.

Olhando para este episódio e no histórico do combate ao terrorismo no país, o académico Samuel Simango, por sinal docente da Universidade Católica de Moçambique, considera que o Executivo reconhece que há rostos por detrás deste fenómeno e, por isso, é possível negociar.

“O terrorismo parece não apresentar rostos, segundo as autoridades governamentais, que logo no início procuraram fazer crer que não se tratava de malfeitores e que não tinham rosto nenhum. Contudo, com o andar do tempo quando as tropas governamentais e as tropas estrangeiras que apoiam Moçambique começaram a ter algum resultado no terreno, quando as fragilidades militares de resposta por parte do Governo foram expostas vimos o Chefe de Estado a anunciar que afinal de contas havia moçambicanos nas fileiras dos insurgentes e por conta disso alguns tinham morrido em combate isto significava que há rostos e onde há rostos é possível encontrar rostos e conversar”, declarou

No entanto, Simango observa que há uma resistência do Governo em dar este passo, o que, na sua opinião, é compreensível em contextos de guerra, uma vez que quem está em guerra só aceita negociar em posição de força.

“Ninguém acreditaria que um administrador, sem conhecimento do Governador e do Secretário de Estado, tomasse a iniciativa autônoma e deliberada de negociar com os terroristas. Vejo nesta atitude do administrador uma janela que se abriu ao nível do próprio do Governo para abrir espaço com que se deve lidar neste assunto, não estamos a falar de negociações, mas este episódio nos pode garantir que o governo conhece os canais que podem ser usados para a solução dos conflitos, neste caso foi ensaiado ao nível local uma negociação com os insurgentes e deu resultado. Espero que este ensaio possa ser hierarquizado”, disse Samuel Simango, para depois referir que o Executivo não desmentiu o episódio de Mocímboa para não criar alaridos.

Raul Mendes reitera que não há condições para negociações com terroristas

Por seu turno, Raul Mendes considera a soltura dos pescadores como um caso isolado, uma vez que não acredita que o Governo central esteja neste momento disponível para sentar na mesma mesa com os insurgentes.

“Se tivesse possibilidade para negociar e acabar com o terrorismo, o Governo teria feito há muito tempo para minimizar o sofrimento das populações. É de louvar a postura dos terroristas que soltaram os pescadores, contudo não podemos nos enganar, o terrorismo ainda é uma realidade na província de Cabo Delgado. É certo que o Governo garante que a situação está controlada, mas é preciso continuar em alerta porque estamos diante de um inimigo astuto e sem escrúpulos”, declarou Mendes, para depois apontar os exemplos da Nigéria e República Democrática de Congo, países mergulhados em conflitos armados.

“A insurgência armada iniciou em 2017 e já estamos em 2024. Não podemos normalizar esta situação. O Executivo está a envidar esforços junto dos seus parceiros para recuperar Cabo Delgado e atrair investimentos. A ideia de negociar não é tão má, porém não acredito que Filipe Nyusi e companhia queiram seguir por esse caminho. Em África, temos países como Nigéria e República Democrática do Congo, que há anos estão a lutar com os grupos radicais. Não quero ser pessimista, mas se tudo correr assim Moçambique vai continuar independente, mas com a guerra na província de Cabo Delgado”, sublinha.

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