A menos de 45 dias do fim do mandato, eis o saldo…

EDITORIAL

Uma ausência de poder e um país em chamas que vão se alastrando a cada dia, com cada grupo  reivindicando o que bem entende, desde o direito de estabelecer suas próprias portagens até os que buscam justificar saques de empreendimentos privados, passando pelo coagir de empresas para assinarem compromissos de responsabilidade social. Em todo esse roteiro, nada consta sobre a causa do problema, a fraude eleitoral que, afinal, foi o protesto formal para mostrar em que estivemos assentes nos últimos dez anos, mesmo que alguém ouse nos forçar a olhar acima dos 32 anos do multipartidarismo.

Não há aqui inocentes. O Governo actual nunca esteve à altura dos desafios do país. E, com isto já assumido, a ele cabia a responsabilidade de manter o país funcional, estável e governável. Mas quis mais que isso, tentou forçar o legado e foi daí que criou mais problemas para si, aliás, sempre foi bom em criar problemas. A Tabela Salarial Única foi apenas um exemplo de criação de um problema. A crise pós-eleitoral é outro exemplo claro.

E a consequência é esta: Maputo isolado desde sábado. E nesta segunda-feira (09), o isolamento evoluiu para os bairros. Enquanto isso, os mercados estão a ficar sem stock. A EN1 (Bobole) bloqueada e centenas de transeuntes dormindo desde sábado à segunda-feira no relento, submetidos a condições desumanas de não ter para onde ir para satisfação de necessidades básicas. E a consequência é o retrocesso que só tende a aumentar.

Em Gaza, o bastião da Frelimo, as chamas se alastraram e ficou difícil de distinguir os manifestantes dos oportunistas. Mais do que isso, ficou difícil reconhecer os agentes do Estado, porque a reacção se mostrou distante de uma Polícia a serviço do povo, pelo contrário, as mortes ocorridas na tentativa de conter ou dispersar os manifestantes foram consequência dos tiros da polícia. Porque estamos a retratar questões que transcendem disputas partidárias, podemos ignorar o facto de a chefe da Brigada Central da Província da Zambézia, Margarida Talapa, ter sido enxovalhada em Quelimane na manifestação dos 70%, e nos concentrar em Nampula, onde o povo bem organizado foi reivindicar a promessa de anos à empresa Kenmare e descobriu que afinal foi enganado pelo Governo, que foi buscar dinheiro, mas não canalizou às comunidades. Um roubo comum por aqui.

Mesmo cenário viria a repetir-se em Ressano Garcia, expondo a rejeição de um Governo que vai timidamente atirando a toalha, uma postura que reflecte a aceitação da falta de legitimidade e se encolhendo num problema que constitui a urgência do momento.

Este é o retrato do país, com circulação condicionada, ocorrência de mortes e com a inflação cada vez mais descontrolada, enquanto diminuem os stocks. Um problema em que todo o moçambicano se revê e, em corro, assumem a necessidade urgente de lutar pela  salvação da integridade do país e da paz. No entanto, curiosamente, esta não é a agenda do Chefe do Estado, que chegou a comprometer-se em terminar o seu mandato com este problema resolvido. Hoje, lhe falta apenas 45 dias, sim, 45 dias depois dos longos nove anos e 10 meses a tomar medidas atabalhoadas que nos conduziram a este fracasso, que transcende as eleições de 09 de Outubro de 2024, mas expõe a degradação dos pilares de um país: as instituições fortes e credíveis. São as consequências de um regime que tinha em cada reforma pública uma bolada, foi assim com os livros (educação), fármacos (saúde), combustíveis e por aí. É mesmo saldo de uma governação.

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