Alexandre Chiure
Está mais do que evidente, com relação às manifestações, que o Estado moçambicano perdeu, por completo, o controlo da situação. Hoje, quer queiramos, quer não, o país está nas mãos de Venâncio Mondlane.
Aproveitando-se do vazio de poder que se verifica um pouco por todo o país, ele dita ordens, através das suas lives, que são cumpridas integralmente. Para dizer que somos obrigados a dançar a música que os manifestantes querem. Há que reconhecer isso.
Enquanto o Governo, por razões desconhecidas, não cria condições para que haja um diálogo com Venâncio Mondlane, ele que é o rosto das manifestações, preferindo trabalhar, na periferia, com diferentes sectores da sociedade não determinantes para o fim da crise política no país, a economia está a afundar-se a cada dia que passa.
O opositor já mostrou disponibilidade para o diálogo com, o Chefe de Estado. Apresentou uma proposta de agenda contendo 20 pontos. Exigiu que fosse garantida a segurança e de que não será preso quando regressar a Moçambique e até hoje não foi respondido.
Não sei de que é que o governo está à espera para falar com o VM7 e juntos encontrarem uma forma de acomodar as suas exigências e parar com as manifestações. Não sei por que razão o Chefe de Estado prefere perder tempo a dialogar com os outros e não com o Venâncio Mondlane que é a peça-chave da crise política pós-eleitoral.
Será que é preciso que haja mais actos de violência, mortes e destruições de infra-estruturas públicas e privadas pelos manifestantes do que aquilo que já aconteceu (já morreram mais de 100 cidadãos) para o executivo entender que é urgente travar a crise?
Enquanto o governo não toma decisão em relação ao assunto, a situação no terreno está a atingir proporções alarmantes, com a economia quase paralisada. A maior parte das empresas e instituições públicas funciona a meio-gás. Algumas, encerraram as portas e estão a despedir trabalhadores. Ninguém está a pagar o imposto. O custo de vida está a aumentar. Alguns produtos começam a escassear no mercado e os preços, a subirem.
Dezenas de cidadãos estão a ser mortos pela polícia ao usar balas verdadeiras em confrontos com manifestantes. Corporação que revela fragilidades em termos de instrução e de disponibilidade de meios para lidar com manifestações.
A corporação não dispõe de instrumentos para a autodefesa em caso de arremesso de pedras e de outros objectos contundentes, como escuto e capacetes apropriados. Não tem viaturas para disparar jatos de água. É vergonhoso ver agentes da polícia a recorrerem a pedras para dispersar manifestantes. Onde é que nós estamos?
Hoje, por ordens de Venâncio Mondlane, não se paga portagem. As portagens oficiais foram substituídas por outras, ilegais, que se resumem em pedras, contentores de lixo, troncos de árvores e outras barricadas onde é obrigatório pagar para transitar, sob risco de ver sua viatura a ser vandalizada.
As autoridades têm conhecimento disso, mas nada fazem em defesa do cidadão e para acabar coma anarquia. A insegurança, nas ruas, é total. Infelizmente chegamos ao ponto em que as pessoas já não têm medo de nada, mesmo de armas ou da morte. A presença de carros blindados e de tropas na via pública não assusta a ninguém, o que, no mínimo, é muito perigoso.
A polícia já não tem poder sobre o cidadão. Ninguém lhe respeita. Há quem, quando entende, arreia as calças perante agentes da PRM e mostra-lhes as nádegas, num atentado ao pudor. Alguns polícias passam por outro tipo de humilhações. Às vezes são obrigados, por exemplo, a pôr flores e água em supostas campas, atribuídas a figuras de nomenclatura política do país nos bairros.
Como se isso não bastasse, a PRM é forçada a transportar resíduos sólidos para a lixeira, usando as suas próprias viaturas de patrulha, num autêntico abuso à autoridade, o que é inadmissível.
Na prática, o próprio governo não manda em quase nada. As ordens são dadas por vários comandos autónomos nos bairros e cumpridas pelas populações. Às vezes fica a impressão de que não temos governo dado à anarquia ou desordem que reina no país.
O mais grave de tudo é que o governo, que devia tomar decisões, comporta-se como um mero espectador. Lamenta como o povo e multiplica apelos à sociedade para suster a onde de violência no lugar de partir para acções concretas de modo a restabelecer a ordem.
É inconcebível, por exemplo, que a estrada nacional número 1, que liga as regiões sul, centro e norte do país, tenha ficado três dias seguidos bloqueada por populares, em Bobole, Marracuene, causando um caos, sem que nada fosse feito para repor o trânsito.
A polícia e as forças armadas estiveram no local a assistirem tudo a acontecer ao bel-prazer dos manifestantes. A reabertura da estrada ao tráfego, no terceiro dia, não foi por mérito da polícia, mas por livre e espontânea vontade de populares.
É, igualmente, inadmissível, que o Estado a quem cabe a responsabilidade de salvaguardar os direitos e as liberdades dos cidadãos, permita que a Constituição da República seja pontapeada por qualquer que seja a motivação.
É grave que os direitos e as liberdades constitucionais dos cidadãos estejam a ser postas em causa sem que o Estado moçambicano ponha a sua mão dura para desencorajar essa prática. Refiro-me aos direitos à livre circulação de pessoas e bens, à reunião, educação e à profecia de uma religião com a exigência de encerramento de sedes partidárias e de portagens, com o bloqueio de estradas.
Seja qual for o motivo, a Constituição da República deve ser respeitada por todos os moçambicanos. A responsabilidade é acrescida quando se trata de uma pessoa como Venâncio Mondlane que sonha em governar o país. Em nenhum momento a sua estratégia de manifestação deve promover a desobediência à lei.
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