- “Justiça moçambicana não o poderá julgar pelos mesmos factos (do julgamento nos EUA)
O antigo ministro das Finanças, Manuel Chang, condenado em Janeiro passado a uma pena de prisão de oito anos e multa milionária nos Estados Unidos, tendo já cumprido mais de seis anos em prisão preventiva, poderá voltar a Moçambique, em princípio no próximo ano, como um homem livre e sem nenhum processo criminal, pelo menos sobre as dívidas ocultas, a correr contra ele. A revelação consta do informe anual do Procurador-Geral da República (PGR) que destaca que, afinal, “uma vez julgado pelos Estados Unidos da América, a justiça moçambicana não o poderá julgar pelos mesmos factos”.
Após uma longa disputa pela sua extradição entre Moçambique e Estados Unidos de América, o antigo Ministro das Finanças, Manuel Chang foi “levado” à terra do Tio Sam, onde foi julgado e condenado a uma pena de oito anos e meio de prisão, bem como ao pagamento de sete milhões de dólares, em conexão com o escândalo das dívidas ocultas.
Enquanto decorria a disputa por Chang, que esteve detido por cerca de cinco anos na África do Sul, com vista a convencer os vários fóruns daquele país vizinho, a Procuradoria-Geral da República, que gastou mais de 100 milhões de meticais com honorários de advogados só nos primeiros dois anos, ou seja, de 2018 a 2020, abriu um processo-crime autónomo contra o antigo Ministro das Finanças.
Antes da sua detenção, não corria contra ele em Moçambique nenhum processo-crime e o mesmo só foi aberto quando a bateria de organizações que, por procuração, defendia a sua extradição para os Estados Unidos, ter confrontado a PGR com o facto de até aquele momento não haver nenhuma acusação contra ele.
Feito às pressas para convencer a justiça sul-africana, o processo sob a forma autónoma, incluía três ex-gestores do Banco de Moçambique, no caso o antigo governador e dois administradores, todos acusados de abuso de cargo ou função por terem autorizado a viabilização das dívidas sem a observância dos procedimentos legais. Este processo anda em banho-maria e não aparenta estar a seguir os trâmites normais.
Manuel Chang era indiciado de prática de crimes de violação da legalidade orçamental, corrupção passiva para cato ilícto, abuso de cargo ou de função, associação para delinquir, peculato e branqueamento de capitais.
No entanto, este processo contra Manuel Chang deverá ser arquivado, em respeito ao princípio que diz que uma pessoa não pode ser julgada duas vezes sobre os mesmos factos. Quer isto dizer que só poderia ser julgado, caso aparecesse um facto novo.
“Após a longa disputa judicial entre Moçambique e os Estados Unidos da América (EUA), os tribunais sul-africanos decidiram extraditá-lo para os Estados Unidos da América. Importa, por ora, referir que Manuel Chang foi condenado, no dia 17 de Janeiro de 2025, pelo Tribunal Federal de Brooklyn, a uma pena de oito anos e meio de prisão e no pagamento de US$ 7 milhões, pelos crimes de conspiração para cometer fraude electrónica e lavagem de
dinheiro. Uma vez julgado pelos Estados Unidos da América, a justiça moçambicana não o poderá julgar pelos mesmos factos”, lê-se no Informe do procurador que deu entrada na Assembleia da República a 28 de Março e deverá ser apresentado em plenária dentro das próximas semanas.
Ministério Público vinca que Chang deveria ser ouvido em Moçambique
Segundo o Procurador-Geral da República, Américo Letela, a condenação de Manuel Chang veio confirmar o que o Ministério Público vinha defendendo, em diversas ocasiões: que o julgamento nos Estados Unidos da América em nada beneficiaria os interesses do Estado moçambicano, tanto em relação à pena que poderia ser aplicada, quanto ao ressarcimento pelos prejuízos causados.
“Como se pode constatar, a pena que lhe foi aplicada é muito inferior a que lhe caberia se tivesse sido julgado em Moçambique, cujas penas aplicáveis aos crimes de que é acusado variam de 8 a 12 anos de prisão. Por outro lado, apesar de a conduta daquele cidadão moçambicano, ter, financeiramente, prejudicado gravemente o Estado moçambicano, (em dois mil milhões de dólares), bem assim na sua reputação internacional, este não poderá ver-se ressarcido pelos prejuízos causados pela conduta daquele cidadão”, destacou.
Letela termina o capítulo sobre Manuel Chang no seu informe, lembrando que os demais arguidos envolvidos nos mesmos crimes e julgados em Moçambique foram condenados a penas que variam de 10 a 12 anos de prisão e a ressarcir o Estado pelos prejuízos sofridos.
No entanto, em nenhuma linha, o informe do procurador faz referência aos três co-arguidos que respondiam ao mesmo processo autónomo com Manuel Chang.
Refira-se que Manuel Chang, condenado a oito anos e oito meses, poderá voltar a Moçambique em finais do próximo ano, uma vez que foi detido preventivamente em Dezembro de 2018.

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